Com apresentações em todo o Brasil e no Exterior, o músico e compositor Gilberto Gil, 76 anos, acredita que os brasileiros têm vivido com "medo do futuro". Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o artista falou sobre a turnê que divulga seu disco mais recente, Ok Ok Ok, e principalmente a respeito do contexto político que o país enfrenta.
Para fazer um diagnóstico do Brasil, Gil indica que o público faça uma audição da música Outros Viram, de sua autoria com Jorge Mautner.
— Numa civilização ainda não inteiramente voltada para as promessas do futuro, parcialmente entregue ao anacronismo sócio-político-econômico do passado colonial e neocolonial, tentada a embarcar num arcaico populismo sedutor sob as bênçãos de uma democracia vacilante, o Brasil teima em contrariar nossas expectativas de um novo salto civilizacional — disse, na entrevista ao jornal — Pela primeira vez em nossa história, o temor de que a redenção brasileira esteja lidando, não apenas com mais um adiamento, mas com o fantasma de uma terrível impossibilidade. Estamos com medo do futuro. Isso é inédito — prosseguiu.
Dentro do cenário político, e das mudanças ministeriais, o compositor acredita que não seja fundamental a existência do Ministério da Cultura (MinC). Para ele, o essencial é que existam políticas públicas para o setor, com "adequação, abrangência, eficácia e a correta localização na máquina estatal".
— Se não estiverem num MinC, essas políticas devem estar em algum lugar do governo à altura da sua importância — frisa.
Em relação a Jair Bolsonaro (PSL) e Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o artista tem opiniões divergentes. Sobre o atual presidente da República, Gilberto Gil conta que rezava "todo dia para que ele se fizesse suficientemente compreensível":
— Tudo que me coloca diante da incompreensão me inspira a oração. Quando eu não sei o que as coisas são eu oro, medito, peço para que elas se revelem com clareza e adequação. (...) Hoje, ele continua inspirando minhas orações no mesmo sentido.
No caso de Lula, a reflexão é diferente, por ser uma pessoa que lhe inspira compaixão.
— Sempre foi assim, desde que se tornou porta-voz do homem comum, em busca de uma solidariedade irrecusável, de uma irremediável comunhão com a trágica condição humana, de um entregar-se ao ímpeto de soldado destemido na luta pela quimera da emancipação. Lula é uma pedra bruta, não lapidável — finaliza.