De uma coletânea de contos que falam dos dilemas do amor à miséria e a guerra que forçam muitos a imigrarem, lançamentos de diferentes editoras chegaram nas últimas semanas para aquecer os dias frios e turbinar as prateleiras de casa.
Eu Chamo de Amor
Seis autores reúnem-se em Eu Chamo de Amor para tentar explicar o sentimento mais falado do mundo. Na antologia, Fernanda de Castro Lima, Giulia Paim, Laura Conrado, Marina Carvalho e Vinicius Grossos revelam, por meio de situações e personagens, sua concepção de amor. O grande destaque fica para um conto inédito de Fernanda Young, que chega às mãos do público dois anos após sua morte.
— Vejo essa coletânea como importante para nos lembrar de nossas possibilidades de amar, mesmo nas situações mais adversas, como a da pandemia. Amar pessoas que, a princípio, acharíamos impossível. Seja pelo sexo, pelo distanciamento... vários são os argumentos para se desistir - afirma a curadora Eugenia Ribas-Vieira.
Afetos em situações improváveis, indecisão entre duas pessoas e até preconceito são alguns dos temas abordados na obra que não teme em também trazer com naturalidade vivências LGBT+. A narrativa leve, contudo, pode enganar: leitores desavisados correm o risco de, ao final das páginas, começarem a refletir sobre o que é, afinal, o amor. (Editora Melhoramentos, 144 páginas, R$30)
Fernanda Young
Atriz, escritora, roteirista e apresentadora de TV. A artista multitalentosa morreu em agosto de 2019 aos 49 anos, deixando um legado de mais de duas décadas de carreira. Em Eu Chamo de Amor, fãs podem matar brevemente a saudade de seus escritos por meio do texto Zorra. A história protagonizada por Helena, que coloca enormes e pontiagudas unhas postiças para ir a um encontro com o homem pelo qual se apaixonou, carrega algumas marcas da personalidade de Fernanda. Além de curadora, Eugênia também foi amiga pessoal dela, e tem propriedade para destacar a revolta política, a preocupação com a juventude e a frustração pessoal com as próprias unhas curtas como traços da autora.
- Fernanda, acima de tudo, era essa pessoa engraçada. E, com esse conto, não poderia ser diferente. Rimos do "trágico", e esse é o principal legado de Fernanda Young: aprendermos a, sobretudo, rir - finaliza ela.
Conversas Desconfortáveis Com um Homem Negro
Best-seller por 11 semanas consecutivas no New York Times e destaque na imprensa internacional, a obra busca responder questões de pessoas brancas sobre racismo. Ex-jogador da NFL, comentarista esportivo e homem negro, o autor Emmanuel Acho aponta a empatia como solução para o preconceito, mas defende que esta só pode ser alcançada por meio da informação. Sendo assim, criou um "espaço seguro" para sanar dúvidas - sejam elas simples, insensíveis ou vistas como tabu. De cara, pede para o leitor considerar o livro um convite para conversar, aponta que ser antirracista é mais do que não ser racista, agradece pela atenção e, ainda, chama para mudar o mundo em conjunto. (LeYa, 240 páginas, R$39,00).
Nossa Parte de Noite
Canções de Bowie, cartas de tarô e fetiche por pálpebras. Estes são apenas alguns dos elementos que ajudam a dar o tom perturbador à trama vencedora do 37º prêmio Herralde, de Mariana Enriquez. A obra acompanha a saga de um pai tentando isolar seu filho Gaspar do restante da família, ao mesmo tempo em que torce para o garoto não herdar a mediunidade. O motivo é a sobrevivência: mesmo em tempos de repressão militar, a sociedade secreta chamada Ordem se relaciona com a Escuridão em busca da vida eterna por meio de rituais atrozes envolvendo sacrifícios humanos. Aqueles com dons são recrutados e seus destinos são cruéis: o desgaste físico e mental é rápido e implacável (Intrínseca, 544 páginas, R$ 79,90).
Degeneração
Ambientado em uma São Paulo pré-eleições de 2018, o romance do roteirista, dramaturgo e escritor Fernando Bonassi busca entender por meio da ficção os reflexos da ditadura militar na ascensão de Jair Bolsonaro no Brasil. Para contar essa história, o narrador-protagonista do livro é um filho precisando liberar o corpo do pai que acaba de morrer. A partir desse pano de fundo, passa a relembrar a infância com o progenitor, remontando desde um episódio traumático a que foi submetido até a descoberta de que seu pai agiu durante a época da repressão militar como delator e assistente de torturadores (Editora Record, 175 páginas, R$49,90).
Reino Transcendente
A nova obra de Yaa Gyasi, que estreou em 2016 com O Caminho de Casa, é descrita como uma ficção que mistura assuntos sérios e pitadas de esperança. Assim como a autora, a personagem Gifty é ganesa. Jovem superdotada, ela prepara-se para o doutorado em Neurociência na Universidade de Stanford — entretanto, mesmo diante do aparente sucesso, a vida promissora da protagonista é repleta de desafios. A trama aborda a experiência da imigração involuntária dos refugiados provocada pela miséria, a seca e os conflitos armados, além do racismo, da depressão e do vício. Apesar disso, relembra também sobre fé, ciência e amor em um retrato de uma família, suas emoções e a sobrevivência de traumas (Rocco, 320 páginas, R$ 64,90).
Mãe
Perto de fazer quarenta anos, o jornalista e escritor português Hugo Gonçalves recebeu o testamento do avô materno dentro de um saco plástico. Iniciava-se ali uma viagem, geográfica e pela memória, adiada há anos. A primeira parada foi a tarde em que recebeu a notícia da morte da mãe, em 1985, quando regressava da escola primária. Na obra, o autor analisa os impactos da perda, ao mesmo tempo em que mostra o caminho trilhado para recolher os estilhaços do luto, indo dos corredores do hospital ao colégio de padres, até uma cicatriz na perna, o escape do amor romântico, do sexo e das drogas ou uma road trip com o pai e o irmão (Companhia das Letras, 184 páginas, R$ 59,90).
Anjo Mau
Estreia de Milton Tiutiunic, a obra chega às livrarias em nova edição. Ambientada no período pós- Segunda Guerra Mundial, a trama acompanha o surgimento de um líder ocultista que tenta a todo custo impor seus ideais à sociedade. Apesar da aparente derrota em sua missão, o personagem ainda consegue encontrar vias para disseminar seus conceitos no mundo (Autografia, 48 páginas, R$31,90).