Pela segunda vez em um intervalo de menos de cinco anos, dificuldades financeiras mudaram os planos para a Jornada Nacional de Literatura. Depois de haver sido cancelado em 2015 e só realizado em 2017, o evento, um dos mais tradicionais da literatura do Estado e um dos mais importantes do país fora do eixo Rio-São Paulo, teve sua 17ª edição, marcada para este ano, adiada para março de 2020.
A Jornada de Passo Fundo e sua irmã menor Jornadinha, estavam previstas para o período entre 30 de setembro e 4 de outubro deste ano. Agora, a Universidade de Passo Fundo (UPF), organizadora do evento, trabalha com novas datas, ainda por confirmar: 23 a 27 de março.
O motivo do adiamento foi a dificuldade para a captação de recursos para a atividade.
– Estamos vivendo em um país em crise financeira. A maioria dos recursos para a realização vem da iniciativa privada via leis de incentivo. E estamos agora em um quadro recessivo grave e não temos recursos suficientes para realizar a jornada no período programado – diz o coordenador Miguel Rettenmaier.
Em 2017, o orçamento da Jornada foi de R$ 2,3 milhões. Para este ano, UPF e prefeitura ainda readequam o orçamento, que deve ser pouco mais da metade disso. De acordo com Rettenmaier, o adiamento atinge a etapa final do evento, a vinda dos autores a Passo Fundo, mas as atividades da Pré-Jornada em escolas continuarão sendo realizadas:
– A Jornada implica um cronograma de trabalho em grandes etapas. Com a passagem da etapa final para março, temos mais tempo de captação. E alguns patrocinadores podem nos apoiar devido ao ingresso em novo ano fiscal.
A mudança, contudo, vai implicar em renegociar as agendas de muitos dos convidados confirmados, como Silviano Santiago, Carola Saavedra e Nelson de Oliveira. O anúncio do adiamento provocou manifestações preocupadas da comunidade cultural do Estado.
– Sei que a prefeitura e a universidade estão fazendo o possível, mas não podemos deixar de ver dentro dessa crise um reflexo de uma situação difícil em que a educação e a cultura não ocupam espaço prioritário – diz Alexandre Brito, presidente da Associação gaúcha dos Escritores (AGEs).
A jornada da Jornada
1981: é realizada a 1ª Jornada Sul-Rio-Grandense de Literatura, com a participação de aproximadamente 800 pessoas. Um dos convidados, Josué Guimarães (1921-1986), sugere à organizadora, a professora Tânia Rösing, que aumente a aposta e torne o evento nacional, com uma edição a cada dois anos.
1983: a Jornada Nacional de Literatura abre sua primeira edição com a presença de nomes consagrados da literatura brasileira, convencidos pelo ativo apoio de Josué a prestigiar o ainda nascente evento. Entre os primeiros convidados estavam Antônio Callado, Millôr Fernandes, Otto Lara Resende, Fernando Sabino e Orígenes Lessa. Já no início se estabelece o diferencial da Jornada: as obras são trabalhadas em aula e em seminários antes da visita dos autores.
1989: a jornada passa a entregar, a cada edição, o Concurso Nacional de Contos Josué Guimarães, que premia obras inéditas e homenageia o papel de Josué, morto em 1986, na difusão do evento.
1999: a Jornada realiza, a partir da sua 8ª edição, a entrega do Prêmio Passo Fundo Zaffari & Bourbon de literatura, que logo se torna um dos mais concorridos prêmios literários do país, devido ao alto valor pago pelo certame ao vencedor: R$ 100 mil. Já na primeira edição foram inscritos 210 livros, e o vencedor foi o escritor Sinval Medina com a obra Tratado da Altura das Estrelas.
2001: é criada a 1ª Jornadinha Nacional de Literatura, com uma programação específica voltada para estudantes e crianças.
2005: passa a fazer parte da programação o Encontro Nacional da Academia Brasileira de Letras, que leva integrantes da entidade para seminários em Passo Fundo.
2007: a Jornada começa a realizar como parte de sua programação um encontro de escritores gaúchos.
2015: coordenadora das jornadas literárias por 34 anos, Tania Rösing anuncia à imprensa que o evento seria cancelado por falta de recursos. A informação provoca grande repercussão no meio literário, com críticas e a sugestão de um crowdfunding para realizar o evento. Duas semanas depois do anúncio, Tânia Rösing deixa a coordenação. Ela afirma em entrevistas que a saída foi provocada pela insatisfação da universidade com o anúncio público do cancelamento.
2017: a 16ª Jornada é realizada, com dois anos de atraso, uma programação mais modesta, sem tantos eventos paralelos e um orçamento bem mais enxuto.
2019: prevista para ser realizada de 30 de setembro a 4 de outubro deste ano, a Jornada é adiada para 2020, provavelmente entre os dias 23 e 27 de março.