Um grupo de 18 patronos da Feira do Livro de Porto Alegre lançou na segunda-feira (2) à noite um manifesto em defesa de um dos eventos culturais mais importantes e tradicionais do país. Confira abaixo a íntegra do texto postado originalmente pelo professor da UFRGS e colunista de Zero Hora Luís Augusto Fischer em seu perfil pessoal no Facebook.
OS LIVROS E AS ÁRVORES NA PRAÇA
Manifesto dos 18 Patronos da Feira do Livro de Porto Alegre
Sobreveio um inverno rigorosíssimo naquele reino distante. Frio como havia muito não acontecia. A produção sofreu, muitos ficaram desabrigados, a fome começava a rondar os mais pobres.
Um jovem rei havia subido ao poder. Talvez pela idade, talvez por ter vivido muito tempo fora e longe, talvez devido a seu apreço por regras modernas de administração, ele deliberou atacar os problemas do inverno a seu modo. Como havia uma linda floresta no reino, ele não teve dúvidas: mandou cortar as árvores todas, para transformar em lenha e assim aquecer o pessoal.
A alguns poucos pareceu uma boa medida. Muitos tiveram dúvidas. Mas o velho sábio da aldeia ousou vir a público contradizer a medida. Do alto de sua experiência, lembrou: “O inverno vai passar, e a primavera vai retornar. E então vamos lamentar não ter mais nem árvores, nem seus frutos, nem as sementes. Não se deve cortar as árvores, nunca”.
Livros são como árvores, aliás nascem das entranhas das árvores. Livros, como árvores, demoram para ser escritos e produzidos, e toda uma vida para serem lidos e relidos.
Porto Alegre tem uma floresta de livros, há seis décadas, na Feira do Livro, cujo lugar é a praça da Alfândega. São três gerações de escritores, livreiros, editores e, muito especialmente, leitores – leitores experientes, leitores iniciantes, candidatos a leitor.
Na lentidão característica da vida e na profundidade que livros e leitura alcançam no silêncio de sua força, essas três gerações forjaram um evento único, que nos orgulha a todos, na capital e no interior. Um evento amado por todos os gaúchos e admirado por gente de fora, que sempre nos elogia pela beleza do que conseguimos costruir, silenciosa mas pertinazmente.
Não é nenhum exagero dizer que muito da força de Porto Alegre depende, sutil mas inegavelmente, do campo magnético cujo centro está na Feira do Livro da praça da Alfândega. Um evento que se aprimora ao longo do tempo, que aprende com seus erros, que sem dúvida tem ainda muito para se reinventar, de modo a continuar imantando a vibrante vida cultural sulina – mas que deve permanecer sendo como é, público, aberto, na praça que é de todos.
Sabendo disso e querendo que permaneça viva nossa Feira, como floresta para nos valer quando vier a primavera – que certamente vai suceder a atual crise brasileira –, é que o Conselho de Patronos da Feira do Livro de Porto Alegre relembra a conhecida alegoria acima reproduzida.
Se há problemas a enfrentar e melhoras a fazer, não será inviabilizando a Feira – arrancando a floresta – que vamos avançar.
Que todos os governantes saibam do valor da Feira do Livro na praça da Alfândega e trabalhem por ela!
Porto Alegre, julho de 2018
Luis Fernando Verissimo – 1991
Lya Luft – 1996
Luiz Antonio de Assis Brasil - 1997
Armindo Trevisan – 2001
Ruy Carlos Ostermann - 2002
Donaldo Schuler - 2004
Alcy Cheuiche - 2006
Antônio Hohlfeldt - 2007
Charles Kiefer - 2008
João Carlos Paixão Cortes - 2010
Jane Tutikian - 2011
Luiz Coronel – 2012
Luís Augusto Fischer – 2013
Airton Ortiz - 2014
Dilan Camargo - 2015
Cíntia Moscovich - 2016
Valesca de Assis - 2017