Mesmo depois de o prefeito Nelson Marchezan garantir que a Feira do Livro não corre risco e que a emissão de um boleto de quase R$ 180 mil "foi um equívoco", persiste a polêmica em torno da cobrança de uma taxa da Câmara Riograndense do Livro para a realização de um dos mais tradicionais eventos culturais de Porto Alegre. O historiador Sérgio da Costa Franco escreveu um artigo especial para GaúchaZH questionando a atitude da prefeitura.
Eis a íntegra:
Aluguel ou imposto?
"De todas as extravagâncias que os jornais noticiam todos os dias, verdadeiras ou falsas (fake news, como agora estão dizendo os devotos do Inglês), nenhuma nos pareceu tão esdrúxula quanto essa da Prefeitura de Porto Alegre pretender cobrar dos livreiros, aluguel da Praça da Alfândega, para ali estabelecerem a Feira do Livro. Visto que locações são um contrato que pressupõe ajuste prévio entre locador e locatário, segundo imemorial princípio do Direito das Obrigações, e não tendo havido esse acordo entre a Câmara do Livro e a Prefeitura, não é de aluguel que se trata, e sim de um tributo, sem lei nenhuma que o autorize. E mesmo que houvesse lei ordinária que o criasse, seria ela inconstitucional, à vista da claríssima proibição , constante da Constituição Federal, em seu artigo 150, inciso III letra d), quando veda, tanto à União, quanto aos Estados e Municípios, cobrar tributo sobre 'livros, jornais, periódicos e o papel destinado à sua impressão'.
O assunto nos parece tão pacífico, que o Judiciário não tardaria em atalhar essa imposição arbitrária do Município, e a questão sairia de pauta a curto prazo, com o aplauso geral dos porto-alegrenses, dado que a nossa Feira, nascida em 1955, já é um evento popular, sendo referida até em outras capitais como uma atração turística local.
É evidente que o momento não é o mais indicado para pretender exigir sacrifícios a editores e livreiros. E menos ainda aos compradores de livros. O avanço da comunicação digitalizada, em todos os níveis, tem levado a crise ao comércio do livro impresso. Ao nosso ver (perdão se nos chamarem de antiquado e retrógrado!), não há uma eficaz transmissão do pensamento sem a fixação definitiva no papel. Só o livro impresso nos permite releituras, exame atento da linguagem e do estilo, pausas para a meditação, cotejo simultâneo com o texto de outros pensadores. Isto sem falar no prazer físico de um romance dobrado em dois e lido sobre os travesseiros...
Sérgio da Costa Franco."