Médico e pesquisador em neurociências na Universidade Federal do Rio de Janeiro, o porto-alegrense Olavo Amaral, nascido em 1979, é um escritor que publica com parcimônia. Dicionário de Línguas Imaginárias (Alfaguara, 128 páginas, R$ 39,90 impresso e R$ 27 em e-book), que está sendo lançado agora, é apenas sua terceira coletânea de contos, na sequência de Estática (IEL-RS, 2006) e Correnteza e Escombros (7Letras, 2012).
O tempo entre um lançamento e outro, contudo, prova-se bem usado, dado que suas histórias apresentam uma tensão e uma qualidade que o colocam entre os principais nomes de sua geração de escritores.
Dicionário de Línguas Imaginárias tem por fio condutor a necessidade humana básica de comunicação e seu veículo por excelência, a língua e seus recursos.
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O livro abre com um pesquisador embrenhado na Amazônia em contato com uma tribo, a dos Yualapeng, cujo idioma não registra nenhum termo para “ir” – os deslocamentos são sempre retornos. E se encerra com outro pesquisador, acometido de uma fibrose rara em que cada palavra dita apressa a deterioração de sua saúde respiratória – condição que o condena ao silêncio progressivo. Estimulado por uma aluna, decide fazer uma última pesquisa de campo junto a uma tribo nômade das estepes asiáticas, o povo com o idioma mais enxuto do mundo, com um vocabulário restrito de "cerca de três mil palavras, quase oitenta por cento delas substantivos".
Entre uma história e outra, Amaral constrói contos que transitam maravilhosamente do acadêmico ao poético. Refugiados escondidos em um porão de navio, em conflito quase permanente devido ao fato de que cada um deles fala um idioma diverso. Um pesquisador que tenta extrair um sentido intelectual ou metafísico da pornografia de internet (um conto cujo resultado é irregular, mas que produz momentos legítimos de um humor ferino e certeiro, ao misturar citações de autores como Jorge Luis Borges, Roland Barthes e Michel Foucault, entre outros, com "diálogos" extraídos literalmente de filmes das Brasileirinhas).
Embora os personagens pesquisadores, recorrentes no livro, sirvam como uma apropriada moldura para dar forma aos contos e unidade ao conjunto, Dicionário de Línguas Imaginárias não é um livro acadêmico. Sua força está no uso rico e nuançado da linguagem – atenta à poesia sem se tornar um pastiche de prosa poética – e na descrição de uma fome metafísica em seus personagens que é, no fim das contas, uma busca interminável por um sentido ou pela possibilidade de um contato efetivo com o sempre inescapável outro.