Fechado parcialmente em fevereiro deste ano para reformas na rede elétrica, o Teatro de Arena de Porto Alegre deve permanecer assim por pelo menos mais seis meses, conforme projeta a diretora do espaço cultural, Ana Cristina Froner.
Fundado em 1967, o Teatro de Arena é um símbolo da resistência cultural de Porto Alegre na ditadura militar. Administrado pela Secretaria da Cultura do Rio Grande do Sul (Sedac), o palco histórico vem recebendo seminários, ensaios e montagens de conclusão de cursos de graduação da área, mas está fechado para espetáculos profissionais.
A justificativa para o fechamento parcial é que o Teatro de Arena não tem condições de oferecer iluminação adequada à montagens mais elaboradas. O espaço não está às escuras, mas, segundo explica a diretora, a demanda de luz cênica dos espetáculos profissionais estaria acima da capacidade atual da rede elétrica, que opera com limitações desde 2023.
— Ali pelo meio do ano passado, começamos a ter problema de queda de energia no meio dos espetáculos. O sistema sobrecarregava, e o disjuntor caía — lembra Ana. — Contratamos uma empresa especializada para realizar vistoria, que constatou a necessidade de fazermos a troca de vários componentes da rede elétrica. Temos um laudo que especifica a carga máxima que podemos utilizar. É um limite baixo, insuficiente para o padrão dos espetáculos que o Arena costumava receber — explica a diretora.
O projeto de reforma da rede elétrica do Teatro de Arena corre junto à Secretaria de Obras Públicas (SOP) do Estado. Conforme Ana, a expectativa era de que o trâmite ocorresse de forma mais ágil, mas o avanço das tratativas foi impactado pela enchente de maio.
A reportagem contatou a Secretaria de Obras Públicas, que disse estar "analisando o projeto de reforma da rede elétrica do Teatro de Arena, elaborado por uma empresa terceirizada, para verificar se ele atende às diretrizes técnicas do Estado". O orçamento previsto é de R$ 98 mil e caberá à Sedac definir o modelo de contratação da empresa que realizará o serviço, segundo a SOP. A pasta não informou prazo para conclusão dos trâmites legais e início dos serviços.
Conforme a diretora do Teatro de Arena, reuniões entre a direção, a Sedac e a SOP vêm sendo realizadas de forma frequente, e a tendência é de que seja aberta licitação para contratação de empresa especializada. A expectativa da diretora é de que a finalização de todas as etapas, incluindo a realização da reforma, leve ainda um semestre:
— Não temos como cravar um prazo ao certo, mas acredito que vá demorar pelo menos seis meses. O trabalho em si não deve ser longo, algo em torno de 20 dias, mas para a conclusão de todo o processo eu projeto uns seis meses.
Ainda que parcial, fechamento é sentido pela classe artística
Fundado por artistas em 1967, em meio à repressão da ditadura militar, o Teatro de Arena virou símbolo da resistência cultural em Porto Alegre e consolidou-se como um dos palcos mais queridos pela classe artística local. Seu fechamento, ainda que parcial, vem sendo sentido pelos trabalhadores das artes cênicas, conforme salienta o Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Rio Grande do Sul (Sated-RS).
"Embora o Teatro de Arena seja utilizado para oficinas e ensaios, sua função essencial — proporcionar espetáculos e conectar público e artistas — segue comprometida", diz a nota enviada pela entidade à reportagem (leia na íntegra ao final do texto).
"O Arena é mais do que um palco físico: ele é um patrimônio vivo, que carrega histórias e conquistas fundamentais da classe artística gaúcha. Cada dia de portas fechadas representa não apenas uma interrupção cultural, mas também uma perda de oportunidades de trabalho e expressão artística para muitos profissionais", acrescenta o sindicato.
O espaço, localizado sobre o Viaduto Otávio Rocha, na Avenida Borges de Medeiros, tem capacidade para receber até 120 espectadores. Não é, portanto, um teatro projetado para grandes plateias, o que faz dele especialmente importante para artistas e coletivos independentes.
Nesse sentido, o Sated classifica a retomada completa das atividades do Teatro de Arena como "urgente". A reabertura aliviaria a demanda por espaços de apresentação na cidade, que aumentou após os danos causados pela enchente de maio a palcos importantes do município — a exemplo do Teatro Renascença, fechado desde a tragédia climática.
"Essa carência de espaços públicos para apresentações tem afetado significativamente a cadeia produtiva das artes cênicas na Região Metropolitana, prejudicando artistas, técnicos e a oferta cultural à população", detalha a nota do sindicato, que considera "urgente acelerar o processo de licitação e execução das obras para que o Teatro de Arena seja reaberto".
Ana Cristina Froner, diretora do espaço, diz entender o contexto delicado em que o fechamento parcial se insere e afirma que "é do interesse de todos que a reforma seja concluída o quanto antes".
Ela destaca que, paralelamente à questão elétrica, o Teatro de Arena passará por outras melhorias até a retomada completa das atividades. Serão feitos reparos em descasques presentes nas paredes, pintura nova, troca de estofados da plateia e modernização de alguns equipamentos, inclusive do aparato de iluminação, que deve ter o incremento de modelos que demandam menor carga de energia.
A diretora afirma que as melhorias já estão sendo executadas e não devem prolongar o período de fechamento parcial. A verba que vem sendo utilizada — cerca de R$ 50 mil, segundo Ana — é proveniente da própria Sedac. Diferentemente da reforma da rede elétrica, que é uma questão estrutural, reparos e melhorias pontuais não precisam passar pela Secretaria de Obras Públicas, explica a diretora.
Mudança na fachada
Entre as novidades que devem acompanhar a reabertura está uma mudança significativa na atual fachada do Teatro de Arena, hoje ornada por grafites que representam cenas de espetáculos marcantes da dramaturgia gaúcha. As criações foram feitas em 2018 por artistas do coletivo Núcleo Urbanóide.
O projeto prevê que a fachada volte ao padrão anterior à intervenção artística, sendo pintada com o tom de bege que acompanha o edifício em que o espaço cultural está inserido. A mudança vem gerando debate na classe artística.
— Não vejo nenhuma razão plausível para essa mudança — diz Marcelo Adams, professor de Teatro da Universidade Estadual do RS (UERGS) e ator com mais de três décadas de carreira. — Antes dos grafites, o Teatro de Arena passava despercebido por quem andava pelo viaduto. Eles não só embelezaram e destacaram a fachada como trouxeram visibilidade para os artistas de teatro gaúchos — opina Adams, que está retratado na fachada do Teatro de Arena ao lado de Margarida Peixoto em cena do espetáculo Goela Abaixo ou Por que tu não Bebes?, da Cia. Teatro ao Quadrado.
Conforme a diretora do Teatro de Arena, a nova pintura faz parte de um projeto que busca redimensionar o local como um "guardião da memória do teatro gaúcho":
— O grafite é uma arte que a gente respeita muito, mas que tem um tempo para acontecer. A fachada está riscada, com pontos de descasque, e nós entendemos que o tempo já foi cumprido. Voltaremos à fachada clássica do Teatro de Arena, como ele foi durante mais de 50 anos, justamente para resgatar esse viés da memória.
Ana esclarece que os grafites foram fotografados e devem integrar o acervo permanente do Teatro de Arena, que está sendo ampliado, reorganizado e digitalizado. A intenção da direção é fortalecer o Espaço Sônia Duro de Documentação e Pesquisa, que funciona junto ao local, e utilizá-lo também para a realização de exposições. A primeira deve ocorrer junto à reabertura.
Confira a nota do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Rio Grande do Sul (Sated-RS):
O Teatro de Arena, um dos principais patrimônios culturais do Rio Grande do Sul, está fechado para espetáculos desde fevereiro, em razão de reparos na rede elétrica. Esse fechamento ocorre em um cenário agravado pelas enchentes de maio, que deixou três salas públicas inativas. Uma delas, o Teatro Renascença, ainda não foi reaberta. Essa carência de espaços públicos para apresentações tem afetado significativamente a cadeia produtiva das Artes Cênicas na região metropolitana, prejudicando artistas, técnicos e a oferta cultural à população.
Essa situação se torna ainda mais preocupante ao considerarmos que o Teatro de Arena também não estará disponível para a temporada de verão de 2025, deixando técnicos e artistas sem um espaço fundamental para suas atividades neste período. Tradicionalmente, o verão é uma época de intensa ocupação da Arena por trabalhadores das Artes Cênicas, e sua ausência será mais um duro golpe para quem depende desse espaço público para promover e sustentar seus trabalhos.
Embora o Teatro de Arena seja utilizado para oficinas e ensaios, sua função essencial — proporcionar espetáculos e conectar público e artistas — segue comprometida. O Arena é mais do que um palco físico: ele é um patrimônio vivo, que carrega histórias e conquistas fundamentais da classe artística gaúcha. Cada dia de portas fechadas representa não apenas uma interrupção cultural, mas também uma perda de oportunidades de trabalho e expressão artística para muitos profissionais.
O Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Rio Grande do Sul (Sated-RS) entende a complexidade dos trânsitos e dos desafios administrativos, especialmente após a priorização de reformas em outros espaços afetados pelas enchentes. No entanto, reforçamos que é urgente acelerar o processo de licitação e execução das obras para que o Teatro de Arena seja reaberto. Sua reabertura é essencial para fortalecer a cadeia produtiva das Artes Cênicas e para devolver à população um dos mais importantes espaços de expressão cultural do estado.
O Sated-RS reafirma seu compromisso em acompanhar essa causa e lutar para que o Teatro de Arena retome sua função como palco da arte, da cultura e do encontro. Que ele volte a ser o farol inspirado na criação artística e em um espaço acessível e vibrante para artistas, técnicos e público.