Na hora marcada para a entrevista, Luciano Alabarse pediu para atrasar dois minutinhos para finalizar um compromisso inadiável: mandar um Pix para a livraria da qual estava comprando novas obras, as quais já estava ansioso para devorar. É um leitor voraz. Isso explica o surgimento do seu mais novo espetáculo, Sangue e Pudins, que faz a sua estreia no Porto Verão Alegre, em curta temporada, desta terça-feira (16) até quinta (18).
A peça, que será encenada sempre às 20h30min, no Teatro Renascença (Avenida Erico VerIssimo, 307), em Porto Alegre, é fruto das leituras incessantes. A apresentação é uma adaptação de dois textos distintos: Shopping and Fucking, do inglês Mark Ravenhill, e Johnny, Você me Amaria se o meu Fosse Maior?, do norte-americano Brontez Purnell. Sob o olhar bibliófilo de Alabarse, foi feita uma conexão entre as duas obras que, para ele, se complementam.
— Leio livros como se estivesse condenado à morte e precisasse aproveitar o tempo. Estou sempre lendo, independentemente da quantidade de trabalho que tenha de fazer. Deus me abençoou com insônia e aproveito muitas horas da minha noite para ler, não fico desesperado, não fico contando carneirinhos, fico lendo. Então, esse contato com a literatura é muito importante na minha vida de diretor teatral — conta Alabarse.
Desta forma, entre insônia, livros e criatividade, os dois textos-bases originaram um terceiro, que é o de Sangue e Pudins, o qual foi feito por Alabarse, costurando as obras do Reino Unidos e dos Estados Unidos, transformando-as em algo único, brasileiro. E o título da peça não deixa dúvidas, uma vez que a batizou com o mesmo nome da canção escrita por Fagner e Abel Silva, que estava sendo interpretada por Simone em seu rádio durante a concepção da peça:
— "Não quero saber quem sou / Morro de medo". É assim que começa a música e é isso que a gente vê ao longo do espetáculo: personagens se debatendo entre querer se dar bem na vida, se inserir no sistema, estar na fronteira desse sistema, mas eles não querem sair dele. Esses personagens, machucados, em luta com a dura vida de cada dia, fazem o que for preciso, eles não têm uma moral, digamos, convencional — detalha Alabarse.
De acordo com o diretor, apresentar este espetáculo, o qual ele adjetiva como sendo muito contemporâneo em questão de temática, no começo de 2024, ano em que completa cinco décadas de palco, é digno do início da celebração das bodas de ouro sua com a arte teatral.
— É o começo de um ano muito especial para mim e iniciar, logo em janeiro, dentro de um evento do porte do Porto Verão Alegre, que sempre dá muito espaço para peças locais, me motiva muito. E o Sangue e Pudins é um espetáculo muito interessante, contrastante nele mesmo, além de ser ágil, forte — afirma o diretor teatral.
Violência e sexo
Mas, afinal, do que se trata Sangue e Pudins? Bom, segundo Alabarse, se ele tivesse que definir o tema que permeia a peça, seria a violência, mas não apenas um tipo. São as várias violências do dia a dia, seja no sentido institucional, psicológico, na repressão, na prisão, nas mortes e, até mesmo, ao sair na rua. A sociedade contemporânea, de acordo com o diretor, tem a violência como sua marca:
— O mundo não está para brincadeiras. A gente é assaltado, entre aspas, de muitas maneiras hoje em dia: quando faltam as políticas públicas, quando se matam travestis, quando se espancam mulheres. De algum jeito, tudo isso está na peça, de uma forma teatral, claro, porque o que estamos entregando não é uma aula, uma palestra, um discurso.
A trama de Sangue e Pudins começa com os personagens Mark (Li Pereira), Lulu (Angela Spiazzi) e Robbie (Jaques Machado) vivendo os últimos momentos de uma problemática vida de excessos, com o seu triângulo amoroso ruindo, bem como tudo ao redor deles. Então, entre angústias e necessidades, duas pessoas cruzam a vida do trio central: Brian (Pingo Alabarce), um empresário inescrupuloso, e Gary (Elison Couto), seu enteado – que é abusado sexualmente pelo padrasto. Assim, a insegurança, o medo, o transtorno, as doenças e as drogas marcam o cotidiano dos personagens.
Já o universo apresentado em Sangue e Pudins é punk, mercadológico, estiloso, quente e frio. Os relacionamentos são efêmeros, calculados e por conveniência. O espetáculo, assim, é dividido em 14 cenas e oito subcenas, com a trajetória de todos os cinco personagens embaralhando os planos do grupo e as jornadas se cruzando em momentos curtos, sob uma linguagem que busca ser crua. É uma estreia que pretende ir direto ao ponto, de forma sucinta, e firmar o pé dentro do cenário teatral gaúcho.
Sangue e Pudins
- Nesta terça (16), quarta (17) e quinta-feira (18), sempre às 20h30min, no Teatro Renascença (Av. Erico Verissimo, 307 - Menino Deus), em Porto Alegre.
- Ingressos a R$ 60 (inteira) e podem ser adquiridos no site do Porto Verão Alegre.
- Desconto de 20% para sócios do Clube do Assinante e acompanhante.
- Classificação: 18 anos.
- Duração: 100 minutos.