Se a tragédia grega pode soar hermética e distante para parte do público contemporâneo, a situação era bem diferente na Antiguidade, quando o teatro era uma atração tão popular quanto a telenovela de hoje, aliás, esta não existiria sem aquela. Para reaproximar a plateia de uma das fontes do cânone ocidental, a atriz Andrea Beltrão e o diretor Amir Haddad criaram uma montagem diferente e modernizada de Antígona, de Sófocles. Apresentada pela primeira vez na cidade em 2017, durante o Porto Alegre em Cena, a peça retorna para sessão única amanhã, às 20h, no Teatro da PUCRS, localizado no prédio 40 da universidade. Os ingressos estão esgotados.
Para começar, esta versão sintetiza os diferentes papéis da peça original em apenas um, vivido por Andrea, aqui em seu primeiro solo teatral. O registro também é diferente: a atriz alterna uma fala em tom direto sobre a tragédia grega e sobre Antígona com a interpretação de personagens do texto. Leia aqui a entrevista que a atriz concedeu a Zero Hora sobre a peça
A linguagem é, acima de tudo, acessível e descomplicada. Ao assistir a uma sessão para convidados no Rio, em 2016, antes da estreia, o ator Tonico Pereira definiu esta como "a primeira grande tragédia stand-up", como registrou na época o jornal O Globo.
Quem se perder no catálogo repleto de personagens da mitologia grega terá à disposição uma ajuda visual, outra sacada da produção que aproxima a história do público: a cenografia é composta por pequenos cartazes com os nomes ligados por sua relação de parentesco, como em uma genealogia.
Na tragédia de Sófocles, Antígona luta pelo direito de enterrar o corpo de um de seus irmãos, Polinice, considerado um traidor pelo rei Creonte por ter atacado Tebas. Entre as interpretações motivadas pelo texto clássico, uma recorrente é a que vê Antígona como uma cidadã que desafia o poder de um tira.
Quando começou a preparar o trabalho, Andrea não tinha como alvo qualquer líder populista do mundo. As coisas eram um pouco diferentes em 2016. Pensava, por exemplo, em parentes de pessoas mortas durante a ditadura militar. Mas a montagem ganhou, com o passar dos anos, outra ressonância, condizente com um mundo em ebulição. Afinal, é essa contínua atualidade que faz de um clássico um clássico.