Um país em crise, de futuro incerto, com uma pulsante produção cultural mantida sob vigilância da sociedade e do Estado. Assim era o Brasil de 1977, quando o grupo paulista Teatro do Ornitorrinco estreou o espetáculo Ornitorrinco Canta Brecht e Weill. Com canções de diferentes fases da célebre parceria entre o dramaturgo Bertolt Brecht (1898 – 1956) e o compositor Kurt Weill (1900 – 1950), o grupo se inspirava em aspectos políticos, satíricos e sensuais do cabaré alemão para falar de temas presentes na realidade brasileira da época. Mas a história do país encarregou-se de tornar o espetáculo ainda atual 40 anos depois. O diretor e intérprete Cacá Rosset, um dos fundadores do grupo ao lado de Luiz Roberto Galizia e Maria Alice Vergueiro, explica:
– Essa estrutura de cabaré tem uma ligação muito direta com a plateia, que passa a ser quase um personagem do jogo dramático. Quer dizer, continua sendo um espetáculo vivíssimo, como se tivéssemos estreado na semana passada.
É o que o público porto-alegrense poderá confirmar nesta sexta-feira (6), às 20h, e no sábado (7), às 17h e às 20h, quando a companhia paulista apresentará uma nova montagem da produção no Teatro de Arena de Porto Alegre (Av. Borges de Medeiros, 835), com ingressos a R$ 60. O local das sessões não poderia ser mais apropriado: símbolo da resistência cultural durante a ditadura militar, o Arena está comemorando 50 anos de existência com uma programação especial que vai até dia 17.
Além de Rosset, o Ornitorrinco volta a Porto Alegre com Cida Moreira, também integrante da primeira versão, e Antônio Carlos Brunet, que já havia trabalhado com a companhia nos anos 1980. É uma oportunidade imperdível de rever – ou conhecer – um dos mais importantes grupos do teatro brasileiro moderno. Em sua prestigiada trajetória, o Ornitorrinco chegou a realizar turnês por Estados Unidos, Europa e América Latina. Foi o caso de Sonho de uma Noite de Verão, levado em 1992 ao Delacorte Theater do Central Park, em Nova York.
Rosset recorda que, nos anos 1970, a cena brasileira estava dividida entre o chamado teatrão, com peças comerciais protagonizadas por atores televisivos, e o teatro alternativo, voltado à experimentação e restrito a nichos de público.
– Quando o Ornitorrinco se formou, a proposta era sair um pouco desse maniqueísmo. Queríamos fazer um teatro com nossa cara, humor, ideias e idiossincrasias, mas que ao mesmo tempo pudesse se comunicar com um espectro diversificado da sociedade.
Para a companhia, em resumo, o teatro deveria ser popular no sentido shakespeariano: sofisticado, mas dirigido a um público que vai da nobreza às camadas mais populares. Assim é Ornitorrinco Canta Brecht e Weill, uma espécie de recital irreverente com pequenas esquetes entre as canções. Há uma contundente crítica política nos clássicos interpretados, mas qualquer espectador poderá fruir as melodias e as intervenções cômicas.
Depois de ter se tornado "bissexto" nos últimos anos, na definição de Rosset, o Teatro do Ornitorrinco tem planos para o futuro. Rosset prepara o solo A Agonia e o Êxtase de Steve Jobs, tradução da peça do americano Mike Daisey que denuncia as condições de trabalho na produção dos equipamentos da Apple. Junto com Cida, Rosset está criando também um trabalho baseado na obra do escritor, dramaturgo e poeta francês Boris Vian (1920 – 1959).
ORNITORRINCO CANTA BRECHT E WEILL – 40 ANOS
Nesta sexta (6/10), às 20h, e sábado (7/10), às 17h e às 20h.
Teatro de Arena (Av. Borges de Medeiros, 835), fone (51) 3226-0242, em Porto Alegre.
Ingressos: R$ 60. À venda na bilheteria do teatro, na Livraria Bamboletras (Rua Lima e Silva, 776, loja 3) e pelo site sympla.com.br.