Quem viu Deu Pra Ti Anos 70 (1981), Coisa na Roda (1982) e Verdes Anos (1984) pode ter a impressão de que o cinema gaúcho urbano da década de 80 só produzia filmes de turma, retratos de geração, histórias autobiográficas.
Primeiro longa-metragem dirigido por Carlos Gerbase, Inverno (1983) oferece um contraponto: a trama é intimista, atemporal e se concentra em um cara de 24 anos que não consegue se sentir parte de um grupo.
Joia daquelas primeiras safras da produção local que começou a pensar grande partindo do curta para o longa-metragem na bitola Super-8, Inverno é tema de uma live nesta sexta-feira (3) nas redes sociais da Associação Profissional de Técnicos Cinematográficos do Rio Grande do Sul (APTC-RS) – às 19h, com participação, entre outros profissionais, de Gerbase e da atriz Luciene Adami, protagonista do filme ao lado de Werner Schünemann. Trata-se de uma atividade cultural e gratuita sem fins lucrativos, que será transmitida em facebook.com/aptcabdrs e em youtube.com.com/aptcabdrs. O filme pode ser assistido no em gzh.rs/inverno (senha filmes_old.).
Inspirado no conto O Argonauta, escrito pelo próprio Gerbase, e rodado em Super-8 colorido, Inverno não se diferencia propositadamente de seus antecessores.
— Tudo foi meio por acaso. Não houve o planejamento de uma estética — lembrou Gerbase em entrevista a Zero Hora quando o filme foi lançado 10 anos depois no ancestral VHS, em 2003.
Homenagem
Estruturada como um diário, com muita narração em off, a história se passa em Porto Alegre. O protagonista é um jovem jornalista que trabalha em uma imobiliária e se identifica mais com seus discos, seus livros e os filmes aos quais assiste no Bristol e no Victoria — tradicionais cinemas de calçada que marcaram época na Capital — do que com a namorada, a superficial Mariana (Luciene Adami), os amigos e os pais.
Com a namorada, ele não tem prazer intelectual nem sexual (ela é virgem), mas não se afasta dela. A angústia do rapaz é acentuada pela saudade que sente de Isabel (Luciana Tomasi), que mora em Montevidéu (para onde o espectador é levado em um momento poético). Frio e solitário, o sujeito ocupa seu tempo jogando com o passado e a imaginação.
— A maior semelhança com o personagem é que eu também tinha saído da casa dos pais e ouvia os mesmos discos, como os dos Rolling Stones. Mas não era tão triste como ele, não tinha uma namorada como aquela e meus amigos eram mais interessantes — contou na entrevista Gerbase.
Inverno traz um simbólica homenagem. Na cena em que o personagem de Werner imagina como será seu enfadonho futuro na imobiliária, ele vê os críticos de cinema P.F. Gastal (1922–1996), Hélio Nascimento, Tuio Becker (1943-2008), Luiz Carlos Merten, Goida, Ivo Stigger, Luiz César Cozzatti (1951-2006) e Antonio Hohlfeldt — filmados em seus locais de trabalho.
— Foi uma homenagem aos críticos, que davam muita força para o Super-8 — explicou Gerbase.