Ao apresentar o filme Simonal, exibido na noite de segunda-feira (20) dentro da Mostra Competitiva do 46º Festival de Cinema de Gramado, o ator Fabricio Boliveira, que vive o cantor na cinebiografia, comentou:
— É muito lindo ver esses corações reunidos aqui para contar esse buraco que ficou dentro da nossa história brasileira. A história do Simonal virou uma lenda, ninguém sabe o que aconteceu, tem gente que só ouviu falar e já acusa...
O irônico na declaração entusiasmada do cantor é que, se dependesse do filme, um espectador aleatório continuaria tendo dificuldade de entender o que aconteceu com Simonal.
Estreia na direção de Leonardo Domingues, Simonal abarca 15 anos de vida e carreira de Simonal, do início como integrante do conjunto vocal The Dry Broys, em 1960, até o estrelato nacional e a queda em desgraça. Contratado como assistente de Carlos Imperial, interessado em fazer dele o “Harry Belafonte brasileiro", Simonal se lança como cantor de músicas inicialmente ingênuas tornadas sucesso pelo carisma e suingue do cantor.
Boliveira vive Simonal e aqui reedita o par romântico com Ísis Valverde, com quem já fez Faroeste Caboclo e que agora encarna Tereza, esposa do cantor. O elenco conta ainda com nomes como Leandro Hassum dando vida ao folclórico Imperial, Mariana Lima como Laura Figueiredo, socialite que organiza um fracassado show em desagravo do cantor, e Caco Ciocler como o agente do DOPS Mário Borges, que sequestrou e torturou o contador de Simonal para tentar convencê-lo a retirar uma ação trabalhista. No inquérito sobre o caso, foi Borges quem alegou que Simonal era informante da ditadura, algo que a abertura dos arquivos do regime, décadas depois, não comprovou.
Boliveira brilha em cena e mostra ter sido a escolha perfeita para o papel. Apesar de contar com o apoio e a aprovação de Tereza e dos filhos do cantor, a obra não ignora aspectos complicados da personalidade de Simonal, como suas constantes infidelidades, seu temperamento instável e episódios de abuso físico à esposa. Mas isso não é suficiente para mascaras os problemas do longa. Ao comprimir uma década e meia em um intervalo de duas horas, precisando dar conta da ascensão do cantor e do complicado processo de sua decadência, o filme se torna uma colagem de cenas episódicas embaladas pela música do artista.
O filme também usa o recurso discutível de misturar cenas de arquivo com o Simonal de verdade com as de Boliveira interpretando o personagem até mesmo no momento mais apoteótico da carreira do cantor, o triunfo em um show que deveria ser de Sergio Mendes no Maracanãzinho, em 1969.
Assim, quem não tiver um conhecimento prévio da vida de Simonal pelas páginas da boa biografia Nem Vem que Não Tem, de Ricardo Alexandre (2008) ou pelo ótimo documentário Ninguém Sabe o Duro que Dei, dirigido por Cláudio Manoela, Micael Langer e Calvito Leal em 2009, não terá um quadro total da vida do cantor ou dos fatos que o levaram a ganhar a pecha de delator e dedo-duro.