A Cléo de Verberena, pseudônimo de Jacira Martins Silveira (1909 – 1972), é creditada a primeira direção de um longa-metragem por uma mulher no Brasil, o desaparecido O Mistério do Dominó Preto, lançado em 1931 – foi seu primeiro e único filme, por ela também roteirizado, produzido e protagonizado. O caminho das mulheres no cinema nacional desde então passa por nomes como Gilda de Breu, autora do sucesso de bilheteria O Ébrio (1946), e chega a realizadoras contemporâneas premiadas – entre elas Laís Bodanzky, uma das autoras destacadas na mostra Brasileiras na Direção, em cartaz a partir desta quarta no Cine Santander (Rua Sete de Setembro, 1.028).
Serão exibidos ao longo do mês de agosto, com ingresso a R$ 10 (meia-entrada para estudantes e idosos), 18 longas produzidos em seis Estados entre 2011 e 2017, metade deles inéditos em Porto Alegre. A lista abriga títulos que ganharam destaque no circuito, a exemplo de Como Nossos Pais, de Laís Bodanzky, e Sinfonia da Necrópole, de Juliana Rojas, que, aliás, no dia 25 de agosto, além de participar da sessão comentada do filme, às 19h, vai ministrar a oficina Processo de Criação de Narrativa Fantástica, com entrada franca.
Entre os inéditos na Capital, estão os documentários Aracati, de Aline Portugal e Julia De Simone, que ao longo de seis anos percorreram o interior do Ceará para mostrar a relação do homem com a paisagem, e Seca, com Maria Augusta Ramos (do recente O Processo) acompanhando a rota de um caminhão-pipa pelo sertão nordestino, e o drama fantástico A Mulher que Amou o Vento, com Thaís Dahas e Dellani Lima contando em tom de fábula a história de uma jovem que vive isolada nas montanhas.
Em janeiro passado, o primeiro levantamento da Agência Nacional de Cinema (Ancine) para analisar a representatividade de gênero e raça na produção audiovisual nacional, com base em 142 longas lançados em 2016, mostrou a presença na direção de 75,4% de homens brancos, de apenas 2,1% de homens negros e de 19,7% de mulheres, nenhuma delas negra.
Assim, tornou-se um marco o lançamento posterior à pesquisa, em março passado, do documentário O Caso do Homem Errado, de Camila de Moraes, um dos títulos gaúchos da mostra. Ao passar em revista o episódio do operário negro Júlio César de Melo Pinto, executado por policiais militares em 1987, ao ser confundido com assaltantes, Camila tornou-se a primeira diretora negra a assinar um longa sozinha – 34 anos depois de Adélia Sampaio apresentar Amor Maldito (1984). Tem sessão comentada com a diretora no dia 10, às 19h.
Também representam o Estado Notas De Amor, minissérie de Liliana Sulzbach com quatro episódios inspirados em canções do Musical Saracura – sessão comentada dia 9, às 19h, e os documentários: Quem é Primavera das Neves?, de Ana Luiza Azevedo e Jorge Furtado – Ana fala sobre a personagem, tradutora portuguesa de grandes clássicos literários, no dia 24, às 19h; Substantivo Feminino, de Daniela Sallet e Juan Zapata, sobre duas gaúchas pioneiras na luta pela preservação ambiental – presença dos diretores na sessão de amanhã, às 19h; Todos, de Marilaine Castro da Costa e Luiz Alberto Cassol, que discute a questão da acessibilidade para deficientes visuais – sessão comentada 16 de agosto, às 19h; e Walachai, de Rejane Zilles, sobre a localidade rural homônima que preserva cenários, usos e costumes da Alemanha ancestral de seus antepassados.
Programação até domingo
Hoje
15h – O Jabuti e a Anta, de Eliza Capai
17h – Desarquivando, de Alice Gonzaga e Betse de Paula
19h – Navios de Terra, de Simone Cortezão
Amanhã
15h – Aracati, de Aline Portugal e Julia De Simone
17h – Pulsações, de Manoela Ziggiatti
19h – Substantivo Feminino, de Daniela Sallet e Juan Zapata – sessão comentada com os diretores
Sexta-feira
15h – Tudo é Projeto, de Patricia Rubano e Joana Mendes da Rocha
17h – Travessias, de Salete Machado
19h – Quem é Primavera das Neves?, de Ana Luiza Azevedo e Jorge Furtado
Sábado
15h – O Caso do Homem Errado, de Camila de Moraes
17h – A Mulher que Amou o Vento, de Ana Moravi
19h – Walachai, de Rejane Zilles
Domingo
15h – Do Outro Lado do Atlântico, de Daniele Ellery, Márcio Câmara
17h – Como Nossos Pais, de Laís Bodanzky
19h – Substantivo Feminino, de Daniela Sallet e Juan Zapata
Outros olhares femininos
Além dos 18 filmes brasileiros dirigidos por mulheres exibidos no Cine Santander em agosto, estão em cartaz na Capital outros 11 longas-metragens assinados por realizadoras de diferentes nacionalidades.
Representam o Brasil Mariana Bastos, que dirige com Esmir Filho Alguma Coisa Assim, drama geracional derivado de um premiado curta que fizeram em 2006; As Boas Maneiras, fábula fantástica de Juliana Rojas e Marco Dutra; o docudrama Baronesa, no qual Juliana Farias aborda pelo olhar feminino a rotina de violência na periferia de Belo Horizonte; O Desmonte do Monte, de Sinai Sganzerla, filha de Rogério Sganzerla, com a história e as lendas em torno da Colina Sagrada (ou Morro do Castelo), marco geográfico seminal do Rio de Janeiro destruído no processo de urbanização da cidade; e Vinte Anos, incursão de Alice de Andrade por Cuba para mostrar duas décadas nas vidas de três famílias da ilha caribenha.
As diretoras japonesas Naoko Ogigami e Atsuko Hirayanagi dirigem, respectivamente, o drama Entre Laços e a comédia Oh Lucy!. Com humor ácido, a inglesa Sally Potter mostra em A Festa uma reunião de amigos que descamba em barraco. O tom político marca Cachorros, no qual a chilena Marcela Said destaca as feridas ainda abertas pela ditadura militar de Pinochet.
Da França vem a comédia romântica 50 São os Novos 30, de Valérie Lemercier. E no ano em que se celebra o centenário de nascimento de Ingmar Bergman, o grande diretor sueco ganha um belo tributo da conterrânea Jane Magnusson, no documentário Bergman: 100 Anos.