Esmir Filho despontou como jovem promessa do cinema brasileiro em 2006, quando, aos 23 anos, enfileirou prêmios com seu curta-metragem Alguma Coisa Assim – entre outros, ganhou o troféu de melhor roteiro na Semana da Crítica do Festival de Cannes e três Kikitos no Festival de Gramado: melhor filme, direção e atriz, para Caroline Abras. Naquele mesmo ano, o diretor paulista apresentou um dos primeiros grandes sucessos nacionais do YouTube, o curta Tapa na Pantera – como nos trabalhos anteriores, realizado em parceria com a amiga Mariana Bastos.
O desafio do primeiro longa, Esmir venceu realizando o elogiado Os Famosos e os Duendes da Morte (2009), drama juvenil rodado no interior do Rio Grande do Sul que captou uma nova realidade: a abertura do mundo via internet a um adolescente de uma pequena comunidade que até então tinha como horizonte mais próximo a janela do quarto. E antes de apresentar seu terceiro projeto de maior fôlego, Verlust, drama intimista filmado no Uruguai, em processo de finalização, o diretor decidiu expandir o universo de Alguma Coisa Assim no longa homônimo que entra em cartaz nesta quinta-feira (26). Em Porto Alegre, no CineBancários e no Espaço Itaú. Mariana assina a direção com ele.
Caroline Abras e André Antunes foram apresentados em 2006 como Mari e Caio, jovens que percorriam a boêmia Rua Augusta, na capital paulista, falando sobre seus impasses na transição da adolescência para a vida adulta – em uma boate, Caio vivia sua primeira experiência homoafetiva. Em 2013, a turma promoveu o reencontro de Mari e Caio no curta Sete Anos Depois (2014). A reunião para o longa se deu 2016, em Berlim, onde Mari trabalha numa imobiliária e Caio chega para desenvolver sua pesquisa com embriões humanos. O relacionamento, digamos, fluido entre eles, aparentemente bem resolvido na juventude, nunca ficou bem delineado e exibe fissuras na maturidade, razão de certo desconforto, sobretudo para Carol.
Esses reencontros espelham, com frescor e naturalidade, o processo de amadurecimento de personagens, atores e realizadores.
— O primeiro curta nasceu da necessidade de questionarmos os dilemas geracionais daquela juventude que, como eu, Mariana, Carol e André, tinha na Rua Augusta um ponto de encontro — diz Esmir a ZH. — A partir disso, buscamos abordar nele temas universais como liberdade e diversidade sexual.
Esmir explica que os reencontros de 2013 e 2016 incorporaram novos contextos comportamentais que foram entrando na pauta de debates contemporâneos:
— Em 2013, as luzes de néon e toda aquela efervescência noturna tinham desaparecido. Colocamos um tema que entrava em discussão à época, o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Em 2016, trouxemos a questão do aborto para destacar que, mesmo em um país onde o procedimento é legalizado, como a Alemanha, essa é uma decisão que sempre desperta muito sofrimento.
Mariana complementa:
— Nosso processo de criação envolve troca de experiências. Tratamos de um universo que conhecemos bem, criamos personagens que poderiam ser nossos amigos. Quando fechamos o roteiro, começamos o processo de leitura com os atores. São eles que dão vida aos personagens colaborando com ajustes de diálogos e situações.
Caroline Abras, atriz que trilha carreira no cinema e na televisão, destaca sua ligação com essa produção coletiva:
— Em geral, ator não retoma um personagem que já fez. Para mim esse é um exercício delicioso. A gente nunca se separou, temos interesse pela mesmas coisas.
André, por sua vez , tem nessa projeto sua única experiência diante da câmera.
— Depois de curta de 2006, optei por seguir outro caminho. Sou psicanalista. Somos amigos, moramos relativamente perto um do outro. Se me chamarem outra vez, claro que vou.
Esmir, porém, diz que não está no horizonte mais um reencontro com os personagens, a exemplo do que já fizeram cineastas como François Truffaut (nos filmes com o ator Jean-Pierre Léaud) e Richard Linklater (na trilogia iniciada com Antes do Amanhecer e em Boyhood).
— Até entendo quem cite Boyhood (de Linklater) como referência, mas tem uma grande diferença. Nosso filme não foi pensado para seguir os personagens ao longo dos anos. Os reencontros ocorreram de forma espontânea, quando achamos que tínhamos algo mais a dizer.
Alguma coisa assim
De Esmir Filho e Mariana Bastos
Drama, Brasil, 2017, 80min,
16 anos.
Estreia quinta-feira (26) no CineBancários (15h e 19h) e Espaço Itaú (15h30 e 19h30).