Há cerca de 30 anos, durante um processo terapêutico, o mineiro José Alberto Nemer resolveu fazer algumas reflexões com aquarela. A partir dali, o artista se fixou na técnica. E, de acordo com o próprio, isso aconteceu não por ela ser mais fácil ou a mais atraente, mas pelo seu poder de ensinar.
— Eu aprendo junto com a técnica lições para a vida. Como deixar acontecer. Quando você joga uma água com pigmento sobre uma superfície de papel, você tem que estar preparado para o aleatório, para aquilo que você não controla. A vida também é assim, a gente tem que estar preparado para coisas que a gente não espera, sobre as quais a gente não tem controle — conta.
Para ele, a aquarela é mais do que uma técnica: é um estudo sobre assumir posturas relacionadas à vida. E para quem quiser experimentar essas sensações que fazem parte da vida do artista há três décadas, chega neste sábado (18), na Fundação Iberê (Avenida Padre Cacique, 2000), em Porto Alegre, a exposição Nemer – Aquarelas Recentes. Nela, constam 20 obras suas produzidas sobre papel francês.
Continuação
A estreia da mostra com as novas aquarelas de Nemer foi no Instituto Tomie Ohtake, em São Paulo. Porto Alegre, então, está sendo a segunda parada da exposição que tem curadoria do professor e crítico de arte Agnaldo Farias. As obras ficarão abertas a visitação até 19 de dezembro.
Nemer – Aquarelas Recentes é a continuação de uma série que vem sendo apresentada desde os anos 1990, década em que o artista mergulhou de vez no mundo colorido da aquarela. Nela, os visitantes encontrarão quadrados, retângulos, grelhas, hachuras, círculos, trapézios, elipses, cruzes e arcos que povoam peças de diferentes formatos, de 100 cm x 100 cm a 150 cm x 200 cm.
Segundo o artista, que pertence à geração dos chamados Desenhistas Mineiros, que se fixou no cenário da arte brasileira a partir da década de 1970, o seu trabalho envolve geometria, gestual, manchas e as "formas mais rigorosas":
— Às vezes, eu começo construindo uma geometria, que acaba se desconstruindo. É aí que você percebe que a aquarela é indomável, escorre até onde ela quer escorrer, e o pigmento se concentra onde sequer imaginávamos. Todos os deslizes e os erros são incorporados na obra e fazem parte do processo não só da aquarela, mas da arte como um todo.
Reclusão e silêncio
Nemer tem, em suas aquarelas, um elemento que chama atenção: a cor preta, pouco usada na técnica e terminantemente proibida na época em que o artista estudou na Escola de Belas Artes. Após passar um período focado em desenhos, decidiu que as aquarelas poderiam fazer parte de sua vida e começou a pintá-las justamente pelo preto. E nunca mais parou.
A exposição Nemer – Aquarelas Recentes é um trabalho realizado durante a pandemia, em "absoluta reclusão". De acordo com o artista, as obras que compõem a mostra representam um "tempo condensado de um ano e meio".
— É a continuação de um trabalho que eu já faço há 30 anos. Essa é uma oportunidade de se ter uma atualização do meu trabalho e, para quem não o conhece, conhecer. Eu acho que as obras não representam o período atual objetivamente, mas talvez de forma subjetiva. Porque elas têm entre elas uma unidade de um mesmo processo criativo. De um mesmo fôlego — destaca o artista.
Segundo Nemer, Porto Alegre é um polo muito interessante para a cultura, por ser a casa da Bienal do Mercosul, por contar com exposições importantes e, sobretudo, pelo trabalho que vem sendo feito pela Fundação Iberê, com conexão de vários artistas de fora. Estar neste espaço, para o mineiro, é motivo de orgulho. Ele, por sinal, está na Capital deste terça-feira (14), fazendo uma imersão no ateliê da instituição e participará da abertura da exposição no sábado (18). E a expectativa do artista, que é doutor em Artes Plásticas pela Université de Paris VIII, é que os gaúchos se envolvam com a sua arte.
— Espero que as pessoas se sensibilizem, porque uma exposição de aquarela é muito mais como uma orquestra de câmara do que propriamente uma banda ou uma orquestra grandiloquente. Ela é intimista, ela é silenciosa e acho que as pessoas acabam sentindo esse silêncio — reflete.
Nemer – Aquarelas Recentes
Abertura: neste sábado (18/9). Até 19 de dezembro.
Horários e preços: visitação das 14h às 18h (último acesso), mediante agendamento. Deste sábado (18) a segunda-feira (20), os ingressos custam R$ 5. A partir do dia 21/9, o preço é R$ 20. Às quintas, a entrada é grátis, por ordem de chegada.
Agendamento e compra de ingressos: Sympla