Laura Vinci já deixou 7 mil maçãs apodrecerem em uma galeria, congelou uma sala inteira e fez uma montanha de areia passar entre dois andares de um prédio. Para a sua primeira exposição individual em Porto Alegre, a artista paulista, conhecida por grandes instalações, assumiu um tom mais intimista. Mas Todas as Graças traz uma de suas marcas: o diálogo das obras com o espaço em que estão expostas.
O lugar em questão é a galeria do Instituto Ling, onde Laura pontuou o espaço branco com peças douradas e prateadas (feitas em vidro e latão banhado a ouro e prata). Os trabalhos, muito delicados, respondem à luz gerando sombras e reflexos, ativando o seu entorno. São peças de três séries diferentes: Graças, Pins e Mundos – produzidas entre 2015 e 2018 e reunidas pela primeira vez.
Em Pins, a parede é perfurada por 180 alfinetes de vários tamanhos e, assim, passa a fazer parte do trabalho, evocando uma pele ferida.
– Os alfinetes têm uma conotação de violência velada – comenta Laura, que compara o espaço a um corpo. – A distribuição (dos pins na parede) é aleatória, pensei no fluxo dos pássaros e em como as folhas se dispersam no vento. Mas também dá para relacionar com marcações em um mapa.
Laura refere-se a outro trabalho, Morro Mundo Mundo, como "brincos de parede". São pequenas esferas de vidro que contêm continentes recortados em metal. O fato de estarem embaralhados e dentro de um frágil globo de vidro é significativo:
– É um trabalho singelo que propõe que a gente pense a nossa relação com o mundo, o que estamos fazendo dele, tanto politicamente quanto ecologicamente. O "morro" é mais verbo do que substantivo: traz um sentimento de que estamos no limite. Esse mundo morre em mim e eu morro nele – explica.
– A Laura é política, mas num sentido estético e poético. Os continentes estão separados, como se o mundo agora tivesse uma geografia imprevisível – observa a curadora da exposição, Virginia Aita.
O chão da galeria está ocupado por um conjunto de peças douradas chamado Todas as Graças, que dá nome à exposição e remete às três Graças, divindades da mitologia grega muito representadas ao longo da história da arte. A instalação de Laura evoca essas reedições, por isso tem dezenas de objetos em tamanhos diversos, e não apenas três. Enquanto o visitante caminha entre eles, vê sua figura refletida na superfície arredondada.
– É uma citação das três Graças, dos períodos grego e romano até Botticelli, Canova, Rubens, Rodin. Aqui elas propõem um jogo no espaço: a ondulação delas tem a ver com as nossas ondulações, quando passamos por elas é como se estivessem comentando os nossos próprios corpos – afirma Laura, assumidamente influenciada pelo minimalismo.
Artista cria obras em constante mudança
Destaque da arte contemporânea do Brasil desde os anos 1980, Laura vive em São Paulo, onde também atua no teatro, fazendo cenografia e direção de arte. Em Porto Alegre, é lembrada pela participação em três Bienais do Mercosul (1999, 2005 e 2009) – é de sua autoria um dos trabalhos mais marcantes da quinta edição, em 2005: Máquina do Mundo, na qual um monte de areia era transportado por uma esteira formando outro monte (uma versão da obra, com pó de mármore em vez de areia, está no Instituto de Arte Contemporânea Inhotim). Muitos trabalhos da artista investigam materiais como esses – e também vidro, granito, água, gelo e vapor, entre outros – que transformam-se diante do espectador, tematizando questões ligadas ao tempo e a passagens de estado.
Todas as Graças
- De Laura Vinci
- Abertura nesta terça-feira (17/4), às 19h, com palestra da artista Laura Vinci e da curadora da mostra, Virginia Aita.
- Galeria do Instituto Ling (Rua João Caetano, 440), no bairro Três Figueiras, em Porto Alegre. Mais informações pelo telefone (51) 3533-5700 ou pelo e-mail instituto.ling@institutoling.org.br.
- Visitação de segunda a sexta, das 10h30min às 22h e sábados, das 10h30min às 20h, até 21 de julho de 2018.
- Entrada Franca.
- A exposição: a primeira individual da paulista Laura Vinci em Porto Alegre é concebida como uma instalação a partir de peças das séries Graças, Pins e Mundos, produzidas entre 2015 e 2018. Curadoria de Virginia Aita.