Houve um tempo em que os porto-alegrenses não precisavam abandonar a Capital para desfrutar das delícias de um balneário durante os meses de verão. No início do século passado, o principal endereço de veraneio era a Praia da Tristeza, na zona sul de Porto Alegre. Mas “o que outrora se entendia por Tristeza era um arrabalde de maior extensão, pois incluía os bairros Vila Conceição e Vila Assunção”, como anotou Sérgio da Costa Franco no Guia Histórico de Porto Alegre.
Os limites atuais da Tristeza foram fixados, oficialmente, apenas em 1959. No século 19, aquelas eram terras rurais e pouco povoadas, que pertenciam ao português José da Silva Guimarães. Ele era casado com a neta de Dionísio Rodrigues Mendes, dono da sesmaria que abarcava grande parte da região sul da Capital (a sede se localizava em Belém Velho). Ao que consta, Guimarães era conhecido, popularmente, como “Juca Tristeza” e esse apelido acabou batizando também o lugar onde morava. “As características pessoais deste pioneiro, a quem atribuíam um semblante triste, acabaram por designar o nome do bairro”, registrou o estudo História dos Bairros de Porto Alegre, do Centro de Pesquisa Histórica da Secretaria Municipal de Cultura. Como se o destino justificasse o apelido, Guimarães foi vítima de uma fatalidade: faleceu ao ser atingido por um raio, em 1826. Cinquenta anos depois, a Tristeza foi ocupada por italianos, que não haviam sido contemplados com lotes de terra na Serra e ali criaram uma colônia agrícola.
Ao final do século 19, era já um local de veraneio, mas para poucos – apenas os que se atreviam a encarar a longa viagem da área central até o balneário de águas doces, feita exclusivamente por Azenha e Teresópolis, e não pela beira do Guaíba. Em 1900, essa distância pareceu encurtar com a extensão da Estrada de Ferro do Riacho até a Tristeza. Era uma Maria Fumaça, com dois ou três vagões a reboque, que fazia de duas a quatro viagens por dia, conforme as condições climáticas. Havia sido construída em 1894, com a finalidade de despejar os dejetos do Asseio Público no Guaíba, mas “a curiosidade da população, despertada pela presença dos trens, fez com que se desenvolvesse o uso para transporte de passageiros, o que estimulou, de maneira decisiva, o crescimento do bairro”, escreveu Janete da Rocha Machado, na revista Oficina do Historiador.
Com isso, famílias de maior poder aquisitivo passaram a ocupar propriedades na Orla, que ficou bordada de chalés. Uma delas era a do poeta, ensaísta e memorialista Augusto Meyer, que relembrou suas férias da infância no livro No Tempo da Flor, de 1966: “Alugamos a casa pelo verão daquele tempo, mas, entra janeiro e lá se vai março, íamos ficando e gostando, como à espera do veranico de maio”.
Afora as residências de verão, a Tristeza ficou tomada de hotéis e pensões, além de clubes náuticos e associações locais, que promoviam intensa atividade social. O bairro também abrigou o primeiro cinema da Zona Sul, o Gioconda, inaugurado em 1925. Com o tempo, outros balneários ganharam projeção, como Ipanema e Belém Novo, aproveitando a trilha aberta pela Tristeza. Esse período de glamour das praias do Guaíba durou até meados do século 20, quando, aos poucos, foram sendo aprimorados os acessos às praias marítimas do Estado. A gota d’água desse processo foi a inauguração da freeway, em setembro de 1973, quando os porto-alegrenses ganharam uma estrada asfaltada e de alta velocidade para chegar ao Litoral Norte. Àquela altura, com o avanço da poluição, as águas do Guaíba não eram mais atração nos dias tórridos de verão, como no passado.