Na década de 1960, quem se deslocava pela Avenida Paraguassu, sentido Norte/Sul, ao chegar no balneário de Atlântida, logo depois de cruzar a Avenida Central, olhando em direção à Serra, via uma estranha construção de concreto armado. Lá estava ela. Mais parecia uma nave espacial pousada no meio do areal. Na verdade, era apenas a caixa d’água que abastecia o recente loteamento, com água tratada e encanada. Mais que isso: uma referência e um ponto turístico. No alto do reservatório, que tem acesso por uma escada de alvenaria, coberto por uma cúpula de cimento, apoiada formosamente em alguns pontos que formam arcos, há um grande terraço. Um mirante, de onde se descortina um panorama de 360 graus da paisagem do entorno.
Veranistas de Capão da Canoa, ali ao lado, eu e um grupo de inquietos adolescentes, apanhávamos nossas bicicletas e empreendíamos o passeio. Era gostoso ver tudo do alto e tirar fotografias. Com o passar do tempo e com o surgimento de muitos prédios, a construção foi sendo eclipsada até desaparecer da vista dos passantes distantes — e quase desapareceu da nossa memória. Até que, outro dia, lembrei dela. Julguei que tivesse sido demolida. Tentei um contato telefônico com a Secretaria Municipal de Turismo, com a da Cultura e finalmente com o gabinete do prefeito de Xangri-lá. Ninguém sabia me informar e o prefeito devia estar muito ocupado para atender jornalistas curiosos atrás de irrelevâncias. Não recebi retorno da ligação.
Foi, então, que me falaram do Jacaré, o vereador e presidente da Câmara. Adalcir Novo, de 54 anos, é o nome dele; é funcionário da Corsan desde 1986 e, em 2006, como gerente da Unidade de Saneamento, promoveu a restauração da histórica caixa d’água. Para minha surpresa, informou:
— Ela continua lá!
De fato, desde 1952, quando Antônio Casaccia liderou um grupo de empresários e fundou a Atlântida S.A. Balneários para lançar a nova praia, o planejamento incluiu uma estação de tratamento e o reservatório que abasteceria as residências e o comércio com água potável. O projeto urbanístico foi confiado ao grande Luíz Ubatuba de Farias, famoso engenheiro e urbanista. Segundo o empresário Solon Soares, histórico morador de Atlântida e, talvez, o principal responsável pela emancipação de Xangri-lá (município ao qual Atlântida pertence), o engenheiro hidráulico João Carlos Rolim Morganti foi o idealizador do sistema de abastecimento que contou, até 1984, com uma estação própria de tratamento — a qual foi instalada ao lado da RS 407 (Morro Alto/Capão) —, que captava água da lagoa e era de responsabilidade da Atlântida S.A.. Assim, o balneário de Atlântida foi o primeiro do Estado a ter uma rede hidráulica.
Então, fica o convite. Vindo pela Avenida Paraguassu, entre à direita na Rua Guará, ande três quadras e dobre à esquerda na Rua Emboá. Logo em seguida você encontrará a "nave espacial" da Corsan, solidamente plantada no atual Parque Zero Hora Norte. Só é lamentável que o acesso ao mirante no topo do reservatório esteja interditado. Mesmo pertencendo a Corsan, a "Tacinha" — como é carinhosamente chamada pelos funcionários, devido a sua pequena capacidade de 135 metros cúbicos —, poderia se tornar um ponto turístico se a prefeitura a promovesse, ajardinando o parque em volta e cuidando desse raro monumento arquitetônico ainda na ativa. Para isso, antes de qualquer coisa, é preciso que se reconheça que ele existe. E que se dê importância. Afinal, ele está lá.