No dia 10 de abril de 1984, eu fotografei do alto, na Avenida Presidente Vargas, no Rio de Janeiro, uma multidão, estimada em quase um milhão de pessoas, que se reuniu no comício da Candelária para exigir eleições “Diretas Já!”. Para frustração de uma grande parcela dos brasileiros, a emenda constitucional proposta, em 1983, pelo deputado federal Dante de Oliveira, restabelecendo as eleições diretas para presidente da República, foi rejeitada pela Câmara dos Deputados em 25 de abril de 1984. Acompanhei, em Brasília, essa decisão, um verdadeiro balde de água fria no vigor cívico-democrático da população do nosso país.
Apesar disso, a esperança de ter um civil na Presidência (mesmo que este fosse eleito de maneira indireta, por um Colégio Eleitoral), depois de tantos generais ditadores, renasceria pouco menos de um ano depois, quando, no dia 15 de janeiro de 1985, Tancredo Neves foi o escolhido (por 480 votos contra os 180 dados a Paulo Maluf, que era o candidato dos militares) como o presidente que sucederia o general Figueiredo. Do mezanino da Câmara, ouvindo o estrépito da maioria vitoriosa dos parlamentares, pude fotografar a alegria do vencedor, de mãos dadas com a esposa, dona Risoleta, e Ulysses Guimarães, que liderava, no Congresso, os esforços pela redemocratização.
Marcada para 15 de março daquele ano, uma sexta-feira, a posse de Tancredo, uma vez mais, levou-me a Brasília para a cobertura fotográfica do evento. Na noite do dia anterior, quinta, na sucursal da revista para a qual eu trabalhava, combinávamos onde jantar. Foi quando surgiu o que seria um boato: Tancredo tinha sido hospitalizado. Logo veio a confirmação. O eleito, internado no Hospital de Base, não poderia tomar posse na manhã seguinte. Figueiredo, informado do que acontecia, afirmou que, para o vice de Tancredo, José Sarney (a quem julgava um vira-casaca), mesmo interinamente, não transmitiria o cargo. Impasse, reuniões madrugada adentro. Prevaleceu a norma constitucional: assumiria Sarney, temporariamente.
O ex-arenista Sarney tomou posse. Pior: Tancredo não voltaria a se recuperar. Depois de uma longa agonia, primeiro em Brasília e depois no Instituto do Coração, em São Paulo, no dia 21 de abril, às 22h20min, Tancredo morreu. Mais uma ducha fria na esperança da gente.
Lá fui eu, de novo, para Brasília, agora para registrar o funeral. Tancredo subiu morto a rampa do Planalto, deixando órfão quase um país inteiro, imerso em tristeza.
Menos de um mês depois, eu apanhava, em São Paulo, outro avião. Dessa vez, para acompanhar, em Porto Alegre, o funeral do meu pai, Hamilton, que morreu em 17 de maio. Mesmo depois de 36 anos, a orfandade continua doendo.