Um casarão histórico, localizado no coração de Farroupilha, na serra gaúcha, é alvo de disputa judicial que resultará na realização de um leilão para venda do imóvel no mês que vem. Erguido por volta de 1920 na esquina da Rua Marechal Floriano com a Independência — área central do município situado a 110 quilômetros da Capital —, abrigou o antigo Moinho Covolan, que impulsionou a economia da região com a produção de farinha no século passado.
Como os 16 herdeiros de Antônio Covolan (fundador do moinho) não chegaram a um acordo, o leilão foi agendado para o próximo dia 18 de fevereiro, como resultado de processo de execução em curso na 1ª Vara Cível da Comarca de Farroupilha. O prédio está avaliado em R$ 4,3 milhões, mas, caso o negócio não se concretize na primeira tentativa, já está marcado um segundo leilão, para 25 de fevereiro, com redução de 50% do valor do patrimônio.
Da parte dos herdeiros favoráveis à preservação da construção, há receio de que, consumada a venda, ela seja demolida para dar lugar a um empreendimento imobiliário. Por isso, desde 2011, tramita processo de tombamento do imóvel no Conselho Municipal do Patrimônio Histórico, Artístico e Cultural (Comphac) de Farroupilha, que se fundamenta no valor arquitetônico, histórico, cultural e paisagístico do antigo moinho.
O casarão de três andares, com subsolo e sótão, reflete o pioneirismo de Antônio Covolan, filho de imigrantes italianos. No começo dos anos 1920, como não havia fornecimento de eletricidade no município, o moinho (ainda de madeira) operava com energia elétrica gerada por uma máquina a vapor. Em meados da década, para aumentar a capacidade produtiva, Covolan adquiriu um motor de 100kW movido a gasogênio da Companhia Força e Luz, de Montenegro. Só que o motor pesava 10 toneladas, e ainda não havia infraestrutura adequada de estradas para transportar carga de tal monta.
Foi quando seu filho mais velho, Quinídio, teve a ideia de desmontar o equipamento para viabilizar o transporte. Graças à inovação, o moinho chegou a fornecer energia elétrica para hospitais da cidade. Na época, foi adquirido também um maquinário de Dresden, na Alemanha, para implantação de um sistema de moagem a cilindro — em vez do uso de roda de pedra —, outro pioneirismo do Moinho Covolan, que iniciou a construção do prédio de alvenaria em 1926 para concluí-la 16 anos depois.
Desativado em 1986, o moinho deu lugar a uma loja de vidros até 1992. Abandonado, virou abrigo de moradores de rua e usuários de drogas até que, a partir de 1999, o artista plástico Gustavo Covolan, um dos netos do fundador, assumiu a responsabilidade por sua conservação. Depois de restaurá-lo, em 27 de setembro de 2008, inaugurou o Muinho Farroupilha, espaço de lazer e cultura com café, museu (sobre a história do moinho) e palco por onde passaram bandas como Yellow Cap (Alemanha), La Abuela Cumbiambera (Argentina) e Loulou Players (Bélgica), além da gaúcha Cachorro Grande. Até o escritor Luis Fernando Verissimo deu canja com o grupo Jazz 6.
No local, também são realizados saraus literários, sessões de cinema e outros eventos culturais em parceria com o Sesc, além de feiras de artesanato de pacientes do Caps (Centro de Atenção Psicossocial) do SUS. Para evitar a demolição do prédio, foi criada a Associação Cultural Moinho Covolan, que organizou um abaixo-assinado com a adesão de mais de 7 mil pessoas (6,9 mil assinaturas online e 500 físicas).
— A gente quer o tombamento para impedir a destruição de um espaço de memória e identidade coletiva. Se conseguirmos isso, a associação poderá ir atrás de recursos para indenizar os demais herdeiros — projeta Gustavo Covolan.