O grande barato de ser repórter-fotográfico é poder ver as coisas de perto. Acompanhar a história a poucos metros de distância. Pode ser na política, nas artes ou no esporte. Foi assim que pude acompanhar parte da trajetória gloriosa de Diego Maradona, que morreu na última quarta-feira.
Eu estava no Maracanã, em setembro de 1981, e vi quando ele, com a camisa do Boca Juniors, apertou a mão do Zico, dois números 10 que somaram muito mais que 20. Nesse mesmo jogo, sempre histriônico, Dieguito colocou na cabeça um sombrero mexicano, quase uma profecia daquilo que El Pibe faria no país de Emiliano Zapata (1879-1919) em 1986, quando a Argentina, por iniciativa e determinação pessoal de Maradona, conquistou a Copa do Mundo daquele ano.
Eu também estava no México e vi. Antes disso, em 1982, fotografei para a revista Veja (e comemorei) a vitória da Seleção Brasileira, com Falcão, que desclassificou e mandou de volta para casa a Argentina de Maradona. Duelo de gigantes. Foi no mesmo Estádio Sarriá, em Barcelona, onde, poucos dias depois, fomos atropelados pela Itália. E, aí, foi a nossa vez de voltar.
Quatro anos depois, no Mundial do México, Maradona matou a pau. Na partida das quartas de final, contra a Inglaterra, além do célebre gol com “la mano de Dios”, fez um outro que foi considerado o gol do século e que valeu uma placa na parede do Estádio Azteca. Na final, contra a Alemanha Ocidental, Maradona foi fortemente marcado por Lothar Matthäus durante o jogo inteiro, mas isso não o impediu de dar um passe preciso para Burruchaga fazer “Argentina 3 x 2 Alemanha”.
Quando acabou a partida, com a Argentina campeã, a festa foi total. Depois de receber,na tribuna, a taça, os jogadores voltaram ao campo para a volta olímpica com o troféu. Com quase cem quilos, e nove anos mais velho do que Maradona, eu não tinha a menor condição de acompanhar o circuito todo. Tirei uma diagonal e atravessei o gramado para esperar do outro lado os jogadores que passariam com a copa nas mãos. Dei sorte: quando entrei no bolo a fim de garantir minha foto, os atletas pararam e ergueram Maradona nos ombros.
Pelo visor da câmara, eu via o craque contra o céu com a taça na mão. Fotão. Voltei ao centro de imprensa e coloquei meus filmes para revelação. Quando ficaram prontos, confirmei que as fotos eram, de fato, extraordinárias.
No dia seguinte, por cortesia da Varig, despachei o material fotográfico que orgulhosamente produzira para a redação da revista Isto É, para a qual trabalhava. As fotos nunca chegaram ao Brasil. Ou melhor: devem ter chegado, mas, não foram entregues. Uma semana antes, o funcionário da revista, atrasado para resgatar o despacho anterior, encontrou o serviço fechado e convenceu um segurança da empresa aérea a arrombar uma gaveta para ter acesso aos filmes enviados. Irritada com isso, a Varig decidiu sumir com minhas fotos da partida final, para punir a revista. Sem saber de nada, me restou agasalhar o trauma profissional tardiamente constatado.
A vida não é feita só de bons momentos. Maradona, mais do que ninguém, sempre soube disso.