Por Pedro Haase Filho, interino
A mais emblemática entre as centenas de milhares de mortes que a temida Influenza Hespanhola causou no Brasil ocorreu na madrugada do dia 16 de janeiro de 1919. O então eleito presidente da República para seu segundo mandato, sem ainda ter assumido o cargo, morreu naquela data, há cem anos, vitimado pela gripe que se espalhou pelo mundo ao final da I Guerra Mundial. Estima-se que 50 milhões de pessoas morreram em todo o mundo e mais de 500 milhões foram contaminadas pelo poderoso vírus. O paulista Francisco de Paula Rodrigues Alves, aos 70 anos, deveria ter chegado pela segunda vez à Presidência − eleito em março de 1918 −, mas não resistiu à gripe espanhola.
No Brasil, a doença apareceu no segundo semestre de 1918 e espalhou-se 1919 adentro. Ao vitimar aquele que foi o quinto presidente da República, já se contabilizava cerca de 300 mil mortos no país. No Rio Grande do Sul, pelo levantamento dos óbitos ocorridos em 1918, aproximadamente 4 mil pessoas morreram devido à gripe.
Em Porto Alegre, com pouco mais de 70 mil habitantes, foram atribuídas 1.316 mortes por causa da espanhola, conforme registra o trabalho acadêmico História de uma Epidemia – A Hespanhola em Porto Alegre, 1918, da professora e doutora em História Janete Abrão. Como diz o artigo, “é provável que a mortalidade tenha sido maior, pois muitos óbitos provavelmente não foram notificados às autoridades, para evitar o pânico”. Relatos indicam que a Capital exibia, na época, um cenário similar ao da Idade Média, sem as mínimas condições de higiene pública.
O emblemático na morte de Rodrigues Alves pela influenza é que o político, em seu primeiro mandato na Presidência da República (1902-1906), foi o responsável pelo maior programa de saúde pública implementado no país. Em 1903, nomeou o médico sanitarista Oswaldo Cruz para o Departamento de Serviço Sanitário do Rio de Janeiro, então capital federal. Alves acreditava na promessa do cientista de erradicar a febre amarela e de ampliar as garantias de saúde no Brasil. Durante o governo, desenvolveu-se, liderado por Cruz, um ambicioso projeto de vacinação obrigatória contra a varíola em todo o Rio, que tinha, na época, 720 mil habitantes. Anos depois, ironicamente, o político não resistiu ao devastador ataque da espanhola, um caso exemplar de saúde pública, e morreu em sua casa no bairro do Flamengo, no Rio.