Outro dia, assisti, na Livraria Erico Verissimo, à palestra do professor Luis Augusto Fischer e da jornalista Patrícia Lima sobre a vida e a obra do escritor pelotense João Simões Lopes Neto (1865-1916). O ambiente da loja de livros novos e usados é repleto de objetos antigos, fotos e quadros que resgatam memórias e criam uma atmosfera prenhe de cultura e história.
Denise Filippini, responsável por esse atraente espaço da nossa cidade, é casada com Ivo Almansa, que, desde 1980, é proprietário da Martins Livreiro, um tradicional sebo fundado em 1954 por Manoel dos Santos Martins. Além de escritor, Simões Lopes Neto, que nasceu de família muito rica, envolveu-se em uma série de negócios que incluíram uma fábrica de vidros e uma destilaria.
Ele fundou também uma mineradora, para explorar prata em Santa Catarina. Sua audácia empresarial levou-o, ainda, a montar uma firma para torrar e moer café e a desenvolver uma fórmula à base de tabaco para combater sarna e carrapatos. Porém, os negócios sempre fracassaram. Entre tantas coisas, num momento ele resolveu fabricar cigarros.
Em julho de 1901, lançou a João Simões & Cia. A marca dos produtos de tabaco recebeu o nome de Diabo, o que gerou protestos de religiosos. Nessa época, havia, em Pelotas, quatro fábricas similares em pleno funcionamento: a Santa Bárbara, desde 1879, a Santa Cruz, fundada em 1892, a São Rafael, desde 1894, e a Manufatura de Fumos Gentilini, fundada no início dos anos 1890. Um anúncio foi, então, publicado na imprensa: “Um novo e importante estabelecimento fabril de fumos acaba de abrir-se nesta cidade... Trata-se da fábrica de cigarros e beneficiação de fumos marca ‘diabo’...”.
Com irreverência, Simões contrapunha-se à evocação dos santos, presentes em três das quatro fábricas de cigarros da cidade, e brandia o nome do diabo. Não contente com a irreverência, ilustrou as carteiras de cigarros com a figura do demônio, de rabo em pé e soltando fumaça pelas ventas.
Quando o professor Fischer falava sobre isso, para surpresa geral da plateia que assistia à palestra, os anfitriões Ivo e Denise sacaram de seus guardados, expostos numa vitrine, a réplica fiel de um maço de cigarros da curiosa marca, que não deve ter durado mais de cinco ou seis anos no mercado.
O malogro da empresa foi atribuído à guerra subterrânea da Igreja Católica, inconformada com a invocação pública do demônio. É bem possível que a expressão “marca diabo”, aqui tão associada a produtos de má qualidade e que não devem ser consumidos, tenha aí a explicação de sua origem.