Nas últimas semanas, pelo menos três surtos de covid-19 em asilos no Rio Grande do Sul chamaram atenção por terem ocorrido em instituições onde os idosos haviam recebido a primeira dose da vacina contra o coronavírus. Segundo especialistas e autoridades de saúde, não há motivo para suspeitar do processo ou da eficácia da imunização.
Nesses três casos recentes em que houve múltiplas contaminações — em Pelotas, Canela e Porto Alegre —, a doença se manifestou durante o período em que os vacinados ainda não haviam desenvolvido o nível esperado de anticorpos. Também se descarta qualquer possibilidade de que os sintomas tenham sido uma reação aos imunizantes.
Até o começo da tarde desta quarta-feira (17), 35.613 idosos em asilos haviam recebido a aplicação inicial no Estado, dos quais 1.727 também já foram contemplados com o reforço. Fora de instituições, os beneficiados acima de 60 anos somam 75,7 mil (apenas com a primeira injeção).
Conforme o presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), Juarez Cunha, são necessárias pelo menos duas semanas após a aplicação da segunda dose da CoronaVac ou da vacina de Oxford para a imunização estar completa. Em nenhum dos casos relatados, essa janela havia sido superada. Cunha também descarta qualquer risco de as vacinas terem estimulado o desenvolvimento da covid-19:
— O vírus é inativado. Não existe possibilidade de as vacinas causarem a doença.
No caso mais dramático, registrado no lar Quinta Urbana, em Pelotas, 40 idosos se infectaram e oito morreram em razão do coronavírus até esta quarta. Eles receberam a primeira aplicação em 27 de janeiro e teriam começado a apresentar sintomas 48 horas depois, conforme relatos iniciais. Mas uma investigação da Secretaria de Saúde local apurou que os primeiros sintomas, não informados imediatamente à vigilância do município, teriam aparecido ainda antes do início da vacinação.
— Mesmo se os primeiros sintomas tivessem surgido dois dias depois (da imunização), eles ocorrem, em média, de três a cinco dias depois da contaminação, prazo que pode chegar até a duas semanas. Ou seja, a contaminação já havia ocorrido — esclarece Cunha.
A secretária de Saúde de Pelotas, Roberta Paganini, descartou qualquer relação entre o surto e as injeções:
— Temos dados que confirmam ser um surto de covid, confirmações por exame de PCR (tipo de teste), pelos quais não há como ter dúvida de que se trata de contaminação, e não de alguma reação adversa à vacina.
Em Canela, os residentes e funcionários do lar Oásis Santa Ângela receberam a dose inicial dia 20 de janeiro, e o surto que resultaria em três mortes foi confirmado oficialmente pela prefeitura dia 5 de fevereiro — ou seja, 16 dias depois e ainda antes do processo de imunização estar completo.
A CoronaVac, conforme Cunha, não tem eficácia determinada cientificamente para apenas uma dose. A vacina de Oxford tem 76% de eficácia após a aplicação inicial, mas são necessárias três semanas para alcançar esse patamar.
Lar da Capital registrou três casos
Em Porto Alegre, os 47 residentes da Cuidando em Casa Hotelaria Assistida, localizada no bairro Três Figueiras, receberam a primeira dose de imunização em 20 de janeiro. Conforme a Secretaria Municipal da Saúde (SMS), três idosas adoeceram posteriormente.
A primeira teve sintomas dia 6 de fevereiro, 17 dias após a primeira dose. A segunda foi internada dia 10 (três semanas depois) e diagnosticada no dia seguinte. A terceira recebeu a segunda dose no mesmo dia em que relatou ausência de paladar, fez exame e confirmou a contaminação — em 12 de fevereiro, 22 dias após a dose inicial. Ou seja, já estava infectada quando recebeu a segunda aplicação. Depois disso, ainda seriam necessárias pelo menos duas semanas para os anticorpos atingirem o nível máximo.
A direção do estabelecimento afirma que a vacina aplicada foi a CoronaVac, que não dispõe de dados de eficácia para dose única.
— Acionamos a prefeitura imediatamente. Testamos todos os pacientes e funcionários, e ninguém mais ficou positivado até agora — afirma o geriatra e responsável técnico do estabelecimento, César Diogo.
Em nota, a SMS da Capital ressalta: “A primeira dose da vacina não imuniza. Para (a pessoa) ser considerada imunizada, é preciso que decorram pelo menos 14 dias após a aplicação da segunda dose”. A orientação é, independentemente do processo de imunização, manter cuidados como uso de máscara, higienização das mãos e distanciamento social.
— Mesmo já tendo recebido a vacina, é importante manter todas as medidas de prevenção — reforça a secretária de Saúde de Pelotas, Roberta Paganini.
As vacinas não têm 100% de eficácia, ou seja, mesmo após a segunda dose, ainda é possível desenvolver a covid-19. Os ensaios clínicos realizados em diversos países indicam, porém, que nesse caso a gravidade da doença é reduzida.
Confira os prazos necessários para imunização
Coronavac
- Intervalo entre as doses: duas a quatro semanas. Preferência para quatro semanas
- Eficácia após uma dose: indeterminada
- Eficácia após duas doses: 50,4% (geral), podendo chegar próximo de 70% com intervalo de pelo menos três semanas
Oxford
- Intervalo entre as doses: 12 semanas
- Eficácia após uma dose: 76% (depois do 21º dia)
- Eficácia após duas doses: 82%