O distanciamento cansa. Segundo uma pesquisa recente do Datafolha, mesmo com o número de mortes por coronavírus chegando perto dos 60 mil no Brasil, cada vez menos pessoas saem de casa apenas quando é inevitável: o número caiu de 21%, em abril, para apenas 12% em junho.
Muitas das “furadas de quarentena” são motivadas pela saudade de amigos e familiares. Sem pensar nas consequências, há quem tenha aberto precedentes para ver pessoalmente alguns entes queridos e aplacar a solidão imposta pelo distanciamento.
O problema é que, assim como qualquer interação social em meio à pandemia de coronavírus, encontros familiares e reuniões entre amigos são propícios à disseminação da doença. Basta uma pesquisa rápida em sites de notícias para constatar que, ao longo dos últimos meses, ingênuos churrascos em família tornaram-se potencialmente letais.
A má notícia é que não há, pelo menos até o momento, um protocolo seguro para matar a saudade de amigos e parentes de forma presencial. Pode soar repetitivo, mas a melhor forma de preservar a si mesmo e às pessoas mais próximas ainda é a paciência.
– A gente carece de definições científicas sobre como fazer isso de forma segura. Sair para encontrar alguém agrega riscos, individuais e coletivos. Não é o momento de relaxar as medidas de distanciamento – destaca o infectologista e membro da Câmara Técnica de Infectologia do Conselho Regional de Medicina (Cremers), Paulo Ernesto Gewehr.
Segundo especialistas, países que optaram por liberar para atividades em pequenos grupos, como Portugal e Canadá, o fizeram de forma empírica, por sua conta e risco. O resultado, em Lisboa, foi aumento no número de casos, e exigiu recuo: nas últimas semanas, o governo restringiu a liberação de encontros presenciais de 20 para até 10 pessoas. Os grupos devem seguir as regras de distanciamento.
Virtualmente, pessoas em completo isolamento por 14 dias poderiam se encontrar sem oferecer maiores riscos umas às outras. Mas isso implicaria não sair para nada, nem mesmo às compras, nem interagir com qualquer pessoa fora de casa nesse período. A dificuldade em colocar em prática esse tipo de conduta leva pesquisadores a defenderem que, enquanto não há vacina, o isolamento ainda é a única forma eficaz de conter a disseminação do vírus.
– A transmissão se dá no contato de pessoas por pessoas, e às vezes mesmo um encontro rápido pode ter consequências catastróficas. Se a gente realmente gosta dos nossos familiares, os encontros devem ser evitados neste momento – diz Luciano Goldani, infectologista do Hospital de Clínicas de Porto Alegre e professor da UFRGS.
Mas, como fazer quando apertar a saudade dos seus? Os meios digitais seguem sendo a forma mais segura de se relacionar até que surjam orientações mais precisas sobre como proceder. Caso ainda pareça insuficiente, listamos algumas reflexões a serem feitas antes de cogitar romper com o distanciamento social.
Quais são as regras do lugar onde moro?
Cada cidade ou Estado tem determinados protocolos a serem seguidos de acordo com a evolução da pandemia. No Rio Grande do Sul, por exemplo, regiões com bandeira vermelha não podem abrir o comércio, entre outros motivos, para desestimular as pessoas a circularem. Ou seja, ainda que não seja proibido sair à rua, as regras indicam que não se deve fazer isso a menos que seja inevitável. Antes de planejar um encontro, pergunte-se se sua conduta está de acordo com as recomendações das autoridades.
Meus amigos estão seguindo as recomendações?
O distanciamento social prevê uma série de precauções a serem tomadas para minimizar o risco de contágio, como higienizar frequentemente as mãos, usar máscaras de proteção, manter o distanciamento de outras pessoas e evitar deslocamentos desnecessários. Ainda que você siga as orientações à risca, tem como garantir que seus amigos e familiares estão fazendo a mesma coisa?
Quero expor alguém de um grupo de risco?
Por maior que seja a saudade, aproximar-se de pessoas que pertencem a grupos de risco, neste momento, é uma atitude irresponsável. Lembre-se que o vírus também é transmitido por quem não apresenta sintomas, e a permanência no mesmo ambiente por alguns minutos pode ser suficiente para a contaminação. Preste auxílio a quem está mais vulnerável, mas prefira a interação por meios digitais.
Posso levar as crianças?
Vamos supor que você encontre com a sua família em um lugar arejado, e todos estejam de máscaras. As cadeiras são posicionadas com o devido distanciamento e ninguém irá compartilhar de nenhum objeto. Até que chegam as crianças. Quais as chances de controlar os pequenos em um contexto tão restritivo?
É possível fazer refeições atendendo ao distanciamento?
Estamos cansados de saber que o vírus se dissemina através de partículas expelidas ao falar, tossir ou espirrar. Dito isso, pense bem: você acha seguro fazer uma refeição coletiva durante a pandemia? Ainda que haja cuidados, interagir sem máscara, e por tempo prolongado, é um prato cheio para o coronavírus.
E se todos forem para o parque?
Encontros em locais abertos, com uma distância mínima de um metro e meio, uso de máscaras e pelo tempo mais curto possível são, de fato, menos arriscados do que reuniões em lugares fechados. Mas, e se todo mundo resolver se encontrar no parque? Antes de sair à rua, considere que o distanciamento é um acordo coletivo, e depende da colaboração de todos para que a disseminação da doença seja controlada.