A prática de atividades físicas durante a pandemia e o uso de máscaras durante o exercício são duas das principais dúvidas que têm circulado entre as pessoas que gostam de praticar esportes. Para os especialistas com quem GaúchaZH conversou a respeito, o ideal é se exercitar em casa. Mas, para quem é atleta ou costuma treinar na rua, existem recomendações e precauções para evitar uma possível contaminação pelo coronavírus.
Éder dos Santos Gomes, 39 anos, é lutador e competidor pela Scorpyon jiu-jitsu – e se enquadra no perfil de quem não pode parar. Adepto do esporte há nove anos, costumava lutar até sete campeonatos anualmente. Antes da pandemia, para manter o ritmo e ter uma boa preparação, em alguns dias da semana ele chegava a fazer três treinos só da luta, além do treinamento funcional e das corridas na rua intercalados durante a semana. Atleta amador, o fluxo dependia da disponibilidade de horários, já que ele é representante comercial e costuma viajar a trabalho.
Ainda que as competições tenham sido adiadas este ano, Éder considera que não pode parar. Do contrário, vai perder o trabalho de condicionamento físico e força que já conquistou. Mas, para seguir se preparando, ele precisou se adaptar ao uso de máscara e aos cuidados de higiene.
- Durante o treino, percebi que era difícil não colocar a mão na máscara para ajustar, já que, com o suor, ela acaba escorregando do rosto. Por isso, me higienizo o tempo todo. Na rua, durante as corridas, evito tocar em qualquer coisa. Dentro da WKT, centro de treinamento que frequento, a cada repetição de exercício, passo álcool. A respiração também ficou diferente. Fico mais ofegante. A dica que eu dou é usar a máscara por mais tempo durante o dia, mesmo dentro de casa, para ir acostumando, pois, durante o treino, dificulta um pouco a respiração. Mas é só uma questão de hábito, explica Gomes.
A preparadora física Raysa Ribeiro, 30 anos, que acompanha Éder nos treinos, também costumava sair para correr na rua. Agora, porém, diz que se sente mais segura treinando dentro da academia, que atende apenas uma pessoa por hora, do que na rua.
– No centro de treinamento eu tenho controle de quantas pessoas passam por aqui e consigo ter cuidado em limpar os aparelhos com álcool e fiscalizar o uso da máscara. Na rua, tenho receio de tocar num banco de praça, por exemplo, ou de cruzar com mais pessoas se exercitando em um mesmo local. Me sinto mais segura assim, conta Raysa.
Sobre o uso de máscara, ela observa que, quanto mais próximo do rosto, menor a possibilidade de o equipamento cair e de precisar colocar as mãos para arrumar. Na hora de treinar, as máscaras de tecido mais leve atrapalham menos a respiração.
Conforme a médica do serviço de infectologia do Hospital Moinhos de Vento Taina Fagundes Behle, quando se fala especificamente de exercícios físicos há muita discussão e pouca evidência. Segundo ela, muitos dos estudos publicados têm qualidade ruim, o que torna difícil definir o que é correto neste momento.
Entretanto, a médica orienta que quem quiser praticar exercícios físicos na rua deve ir sozinho e, além de respeitar o distanciamento social, deve ficar atento, pois a distância entre pessoas que se exercitam têm de ser maior que os dois metros recomendados usualmente.
- Sabe-se que a distância segura entre pessoas em movimento é maior. Embora não se saiba exatamente qual, sugere-se pelo menos quatro metros entre pessoas que correm, por exemplo. Deve-se evitar a prática em parques e locais pequenos que propiciem aglomeração, bem como horários de maior fluxo. O uso de máscaras está sim recomendado, embora seja realmente difícil para o esportista fazer uso, pois muitas pessoas sentem uma sensação de sufocamento – indica Taina.
A médica ressalta também que corrida e outros esportes que provocam mais suor e maior frequência respiratória podem deixar a máscara úmida ou molhada. Com isso, ela perde a eficácia e o propósito do uso. Assim, o melhor é optar por máscaras mais anatômicas, de tecidos mais maleáveis.
- Pode haver algum benefício em usar máscaras de tecidos mais firmes e menos absorventes, como poliéster (embora o algodão seja superior, molha e encharca mais com suor, perdendo qualquer superioridade). As tradicionais bandanas usadas por atletas em dias de frio são melhores do que o não uso de materiais de barreira.
Taina recomenda ainda que, se possível, a pessoa leve mais de uma máscara e troque quando ficar molhada ou se ultrapassar as duas horas recomendadas para a máscara de pano. Mas é enfática ao dizer que, na dúvida, o melhor mesmo é treinar dentro de casa.
O professor de infectologia da UFRGS e infectologista do Hospital de Clínicas, Luciano Goldani, acredita que, se a atividade física for realizada em locais realmente isolados ou de baixa circulação de pessoas, não é necessário o uso de máscara, pois, até o momento, não há evidências de que o vírus fique muito tempo suspenso no ar. Nesse caso, a prática de exercício sem o equipamento pode ser adotada.
- A transmissão se dá pelo ar, mas não podemos afirmar quanto tempo o vírus permanece suspenso. Normalmente, os vírus são jogados no ar e caem no chão e nas superfícies em questão de minutos. Por isso é tão comum o contágio pelo toque nos locais em que ele se deposita. Isso acontece quando as pessoas tocam nas maçanetas, por exemplo, e depois colocam as mãos no rosto.
O infectologista, porém, também cita que a distância entre pessoas que estão se exercitando tem de ser maior.
- A pessoa respira com mais vigor durante a atividade física e, sem nenhuma proteção, poderia espalhar o vírus numa distância maior do que quando está em repouso. O que temos visto em Porto Alegre, por exemplo, são situações em que várias pessoas têm frequentado os parques da cidade para passear e se exercitar ao mesmo tempo. O ideal é sempre evitar aglomerações e manter o distanciamento social, mas, já que isso está acontecendo, elas devem, sim, usar máscara e manter uma distância maior do que dois metros.
Goldani também alerta para o uso da máscara durante o percurso entre a residência e o local do exercício:
– Se a pessoa mora em apartamento, por exemplo, e vai para uma praça vazia correr, ela ainda terá de usar a máscara durante o caminho até o local da corrida. Afinal, vai sair no corredor do prédio, pegar elevador ou escada e cruzar pelas áreas comuns. Nesse caminho tem maçanetas, corrimão e a própria chave. É preciso higienizar as mãos e não colocá-las no rosto em hipótese alguma. Ainda que se tenha todo o cuidado, a melhor forma de evitar a contaminação é fazer exercício em casa.