O Rio Grande do Sul possui uma das taxas mais baixas de letalidade por coronavírus do país até o momento. Dos casos confirmados, 1,6% levam à morte do paciente — terceiro menor índice em comparação com outros Estados. No Brasil, a taxa é de 4,9%. O comparativo, em site da Secretaria Estadual da Saúde, utiliza dados até 18h01min desta terça-feira (7), quando eram 555 confirmações da doença no RS, que resultaram em nove óbitos. O número de casos e mortes foi atualizado nesta quarta-feira (8).
A taxa mais baixa em comparação com outros Estados pode ser afetada, por exemplo, pelo fato de que a epidemia no RS está em fase diferente de outras unidades da federação. O primeiro caso de coronavírus no Brasil foi confirmado em 26 de fevereiro, em São Paulo — em território gaúcho isso aconteceu quase duas semanas depois, em 10 de março. Outro fator que impacta no índice é o número de casos. O RS tem cerca de 10% dos registrados em São Paulo.
A taxa de letalidade é calculada quando se compara o número de mortos com o de casos confirmados. No entanto, não é um retrato fiel da realidade. Os pacientes testados representam parcela daqueles que foram infectados com a doença. Isso porque parte sequer apresenta sintomas e outros não são submetidos ao teste porque não chegam a quadro grave, que demande auxílio no sistema de saúde.
— Estamos olhando só para um pedaço da população. Por isso, nossas taxas estão um pouco acima. A medida que tivermos acesso a mais testes, essa taxa vai diminuir — explica o professor em epidemiologia da UFRGS e gerente de risco do Hospital de Clínicas, Ricardo Kuchenbecker.
Na prática, isso significa que, caso o número de pessoas submetidas ao teste fosse maior, a taxa de letalidade deveria cair. A Universidade de Oxford vem monitorando a letalidade em diversos países. Em cada local, a taxa tem se apresentado diferente. A universidade aponta a Islândia como o país que conseguiu testar o maior número de pessoas, em proporção ao de habitantes, até 28 de março. Lá, a mortalidade causada pela doença é de 0,2% e a probabilidade de os casos confirmados estarem mais próximos da realidade é maior pela parcela da população que foi testada. Ou seja, a taxa nesse caso é mais confiável.
— Há países que conseguiram ter uma base populacional de pessoas testadas maior, como a Alemanha, que apresenta taxa de letalidade bem menor. Podemos pensar que os Estados da mesma forma que os países. No RS a variabilidade desse intervalo de confiança, que poderia ser comparada à margem de erro numa pesquisa eleitoral por exemplo, ainda é grande —afirma Kuchenbecker.
Ainda que não represente com exatidão a realidade, a taxa de letalidade é importante porque permite comparar locais que estejam enfrentando as mesmas situações e detectar possíveis falhas no sistema. Isso porque, além da doença em si, é preciso levar em conta que essa taxa também é impactada pela resposta que os países conseguem dar por meio do sistema de saúde. Se ele estiver sobrecarregado, a mortalidade pode aumentar, por falta de atendimento. Um dos fatores que ocasionou, por exemplo, as altas taxas apresentadas na Itália.
Se o sistema de saúde dá conta da demanda, a taxa de letalidade cai. Isso porque quem precisa de leito espera menos tempo e recebe o atendimento que precisa
RICARDO KUCHENBECKER
Epidemiologista
— Se o sistema de saúde dá conta da demanda, a taxa de letalidade cai. Isso porque quem precisa de leito espera menos tempo e recebe o atendimento que precisa — explica o especialista.
Nesse cenário, as medidas para garantir o chamado achatamento da curva, como forma de não superlotar o sistema de saúde, são importantes. Em transmissão ao vivo pelo Facebook nesta quarta-feira (8), o governador Eduardo Leite destacou as políticas de isolamento social como medida para conter o avanço da doença, enquanto a rede de saúde é preparada para que possa atender os casos graves da doença.
— O papel do governo do Estado é evitar que a curva se acentue, manter dentro da capacidade, e aumentar a capacidade (hospitalar), dentro do possível. Estamos adquirindo equipamentos, adquirindo leitos, EPIs. Tudo para o enfrentamento dos casos que podem, segundo está se observando na tendência mundial, acontecer aqui no Estado do Rio Grande do Sul. E, claro, torcendo, viabilizando-se um tratamento mais eficaz a gente possa reduzir essa demanda — disse.
O comparativo com outros Estados
Somente o Tocantins, com 19 casos e nenhuma morte até o momento, e o Mato Grosso, 78 casos e um óbito, possuem índices inferiores ao do RS em taxa de letalidade. São Paulo, que concentra o maior número de confirmações de coronavírus até o momento, apresenta taxa de 6,5% de letalidade – 5682 confirmados e 371 mortos. O Rio de Janeiro, com 1682 casos e 89 óbitos, também possui taxa superior: 5,3%.
Por outro lado, os Estados com índices de letalidade mais altos registraram menos mortes que o RS até o momento. Sergipe e Paraíba apresentaram o mesmo número de confirmações e de mortes: são 36 casos para quatro óbitos, portanto com 11%. No Piauí, que tem a taxa mais elevada, 14,3%, foram confirmados 28 casos da covid-19, o que resultou em quatro mortos.
O comportamento da taxa no RS nas próximas semanas poderá ser impactado por alguns fatores, como o clima com temperaturas mais frias. Se o número de pessoas testadas for ampliado, o índice pode, inclusive, reduzir.
— Nós ainda não perdemos a guerra e certamente temos muito trabalho pela frente — reconheceu a secretária de saúde do RS, Arita Bergmann, na mesma transmissão realizada pelo governador.