A covid-19 surgiu e se espalhou no inverno rigoroso do hemisfério norte. Começou pela Ásia, alastrou-se em regiões da Europa e agora ganha força nos Estados Unidos, na América do Norte. Com base no cenário já registrado em outros países, infectologistas apostam que as baixas temperaturas previstas para os próximos meses serão um inimigo a mais na luta contra o coronavírus no Rio Grande do Sul.
As autoridades que lideram o enfrentamento da pandemia no Brasil reconhecem este risco. Desde a confirmação do primeiro caso de coronavírus no país, no final de fevereiro, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, demonstra preocupação extra com o panorama que aguarda os gaúchos: inverno mais intenso do que no resto do país e histórico de aumento de doenças respiratórias no período.
Em entrevista à rádio Jovem Pan nesta quinta-feira (4), o presidente Jair Bolsonaro também destacou que a situação do Rio Grande do Sul em meio à pandemia é diferente da dos demais Estados brasileiros:
— O Rio Grande do Sul é um caso à parte. Lá, o clima é mais frio. A minha preocupação é quando chegar o inverno, se a quantidade de pessoas que serão infectadas, em qualquer situação, não forem até lá, quando eles forem liberados dessa quarentena, vão contaminar muita gente numa velocidade enorme.
O chefe do Serviço de Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Eduardo Sprinz, afirma que é questão de tempo para aumentar a quantidade de pessoas que precisarão de atendimento hospitalar de alta complexidade:
Os países que tiveram picos até o momento estavam no inverno. Se trouxermos para cá estes dados, podemos esperar também dados ruins para o RS. Se o frio será um combustível a mais, só podemos inferir isso baseado nas informações de outros países. No melhor dos cenários, a coisa ainda será triste.
EDUARDO SPRINZ
Chefe do Serviço de Infectologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre
— Não sabemos se esse vírus conhece bem os limites de temperatura e quais os limites que ele tolera. Mas os países que tiveram picos até o momento estavam no inverno. Se trouxermos para cá estes dados, podemos esperar também dados ruins para o RS. Se o frio será um combustível a mais, só podemos inferir isso baseado nas informações de outros países. No melhor dos cenários, a coisa ainda será triste.
Quando os índices dos termômetros baixarem, a melhor forma de evitar o vírus será reforçando, ao máximo, as medidas que já são indicadas pelos técnicos de saúde e adotadas por muitos gaúchos: isolamento social e restrição de movimentação. Outra orientação, reforça Sprinz, é manter o ar renovado dentro de casa para evitar a circulação do vírus:
— Se começar a fechar a janela e evitar que o ar se renove no ambiente, mais concentrado o ar fica. Se tiver alguém que teve contato com o vírus na casa, a chance de contágio é maior.
A demanda por atendimento de pacientes com covid-19, que por si só já tem potencial para sobrecarregar o sistema de saúde, será somada à demanda habitual por atendimento ligado às doenças respiratórias, que naturalmente aumentam durante o inverno no Sul, pontua o diretor de Atenção Hospitalar e Urgência da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre, João Marcelo Lopes Fonseca. O médico explica que, no caso da Capital, a necessidade por internação nesta época cresce especialmente nos leitos pediátricos:
— O cenário dos leitos para crianças vai de oito a 80. Passo o ano inteiro com demanda bem tranquila e no inverno aumenta bastante. Idosos, adultos tabagistas ou com doenças pulmonares também internam com muito mais frequência no inverno.
As precauções da covid-19 funcionam para evitar outras doenças que se proliferam no inverno. A população está muito mais consciente
JOÃO MARCELO LOPES FONSECA
Diretor de Atenção Hospitalar e Urgência da Secretaria Municipal de Saúde de Porto Alegre
Na visão de Fonseca, porém, dois fatores poderão ser favoráveis ao enfrentamento do coronavírus no inverno gaúcho. O primeiro é a antecipação da vacinação contra H1N1, iniciada no final de março em idosos e profissionais de saúde. Com a covid-19 se espalhando, a procura pelas doses foi maior, e o número de imunizados já nesta época do ano cresceu em relação a períodos anteriores. O outro é a consciência da população com hábitos de etiqueta e higiene, como a necessidade de lavagem de mãos e o risco da transmissão por gotículas e espirros.
— As precauções da covid-19 funcionam para evitar outras doenças que se proliferam no inverno. A população está muito mais consciente — avalia.
Um dos grandes desafios que se tem pela frente com a chegada das temperaturas mais baixas, sinaliza Fonseca, é o de que os picos de contaminação de coronavírus e os das doenças respiratórias do inverno não se somem ao mesmo tempo:
— Todos os anos, nos preparamos para o inverno, com o aumento das internações. Este ano, também teremos a covid-19.
Dicas para enfrentar as baixas temperaturas
Membro da Câmara Técnica de Infectologia do Cremers, o infectologista Paulo Ernesto Gewehr Filho explica que no inverno é maior a circulação de vírus respiratórios, como o H1N1 e outros que causam resfriados comuns, pois há mais aglomerações em casa, nos meios de transporte, no trabalho e em festas — alguns deles fechados e pouco ventilados. Abaixo, algumas dicas para enfrentar o inverno gaúcho com a covid-19:
— Evite aglomeração de pessoas em qualquer circunstância, inclusive em casa, especialmente em ambientes fechados e mal ventilados.
— Se agasalhe de forma que tenha conforto térmico.
— Ao usar ar condicionado, a umidade do ar baixa, o que resseca as mucosas da narina e garganta, diminuindo a proteção contra vírus e bactérias. Para evitar, use umidificadores de ar ou bacias com água no ambiente climatizado.
— Limpe o filtro do ar condicionado com frequência.
— Deixe o ambiente doméstico arejado. A brisa do ar ajuda a levar as partículas do vírus embora. Em dias de sol, isso é ainda mais eficiente.
— É ruim abrir as janelas em dias de baixas temperaturas? Escolha ao menos um cômodo da casa em que o ar possa circular.