Para além do aumento de casos confirmados de coronavírus no Brasil, há uma novidade importante divulgada nesta quinta-feira (4) pelo Ministério da Saúde: não temos mais somente transmissão importada de outros países. O primeiro brasileiro infectado, de São Paulo, que trouxe o vírus da Itália, transmitiu a doença para uma pessoa – e esta passou para uma terceira. Agora, o país lida com transmissão local, uma realidade que, apesar de evidenciar uma evolução do coronavírus no país, já era esperada.
Enquanto a transmissão importada ocorre quando alguém traz a doença de outro país (situação até então), a transmissão local é uma segunda etapa de evolução do cenário, quando o vírus passa entre pessoas que não saíram de seu território (o que ocorreu nos três pacientes de São Paulo).
Essa mudança não surpreende o Ministério da Saúde nem profissionais da área, que destacam que os brasileiros não precisam ter medo. Com cuidados de higiene, ainda é possível conter a epidemia no país, destaca Alexandre Zavascki, chefe da Infectologia do Hospital Moinhos de Vento e professor de Infectologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).
— Claro que a transmissão local preocupa, porque são pacientes que adquiriram o vírus aqui dentro do país. Mas ainda não é o nível mais preocupante, que é quando não se conhece o link com o caso importado. Seria, por exemplo, se uma pessoa com o vírus vai ao mercado, tosse em uma prateleira e alguém acaba pegando. A gente se preocupará quando não se conseguir fechar um link epidemiológico — pontua.
O cenário citado por Zavascki é o próximo passo para o qual o Brasil se prepara: de transmissão sustentada, quando não é possível traçar uma ligação entre os indivíduos com coronavírus. Nessa conjuntura, o vírus se espalha como uma teia de aranha, e as autoridades não conseguem impedir que ele se espalhe. Não é a realidade atual.
— Isso (casos de transmissão local) não significa que haja uma transmissão sustentada no Brasil. Quem tem transmissão sustentada do vírus são China, Itália e Coreia (do Sul). A transmissão sustentada é quando eu não consigo mais identificar qual foi o caso que originou (a transmissão). O que nós temos é uma transmissão local, relacionada a contatos próximos — disse Wanderson de Oliveira, secretário de Vigilância em Saúde.
Ele acrescentou que, por enquanto, a estratégia do governo para enfrentar o coronavírus não muda:
— Reitero: não muda nada nas condutas que estamos adotando até o momento. O que dá pra eu fazer pra me proteger: lavar as mãos com frequência, cobrir o rosto ao tossir, não trabalhar ou viajar e evitar locais públicos se apresentar sintomas — afirmou Oliveira.
Quando houver transmissão sustentada, a impossibilidade de traçar uma relação entre os brasileiros com o vírus exigirá que o governo mude a resposta ao coronavírus (entenda como isso ocorre agora).
O Ministério da Saúde já antecipou o que fará: o acompanhamento estatístico de casos confirmados perderá importância para dar lugar à preocupação do governo em dar assistência aos brasileiros. É quando o governo deixará a fase de "contenção" para a estratégia de "mitigação", focada em prevenir internações e mortes pela doença.
— É na transmissão sustentada que há outro nível. A definição de caso hoje é para quem tem sintomas e é proveniente de viagem de uma lista de países. A estratégia aí pode mudar, porque não fará mais sentido testar só quem foi para o Exterior. Será como no H1N1: com um aumento da infecção, testaremos apenas os casos graves, porque não fará sentido testar só quem tiver alguns sintomas de gripe — observa Rodrigo Pires, chefe do Controle de Infecção do Hospital de Clínicas de Porto Alegre (HCPA).
Entenda:
Transmissão importada
Quando o vírus chega ao país após o indivíduo adquiri-lo no Exterior.
Transmissão local
Quando o vírus passa entre pessoas que não saíram de seu território, mas é possível estabelecer uma relação entre todos.
Transmissão sustentada
Quando o vírus é transmitido em um território sem que seja possível estabelecer uma relação entre o infectado e a pessoa que importou a doença de outro país.