O comentário entre consumidores é frequente: viajar parece estar mais caro. Mas não se trata somente de uma impressão. Passagens aéreas, diárias em hotéis e, consequentemente, pacotes turísticos realmente apresentaram aumento nos preços nos últimos meses. Segundo especialistas, os motivos envolvem, sobretudo, a alta no valor do combustível e a demanda reprimida em decorrência da pandemia de covid-19.
Dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 10 de novembro, mostram que as passagens aéreas tiveram aumento de 50,11% no acumulado de 12 meses. Já os pacotes turísticos e as hospedagens sofreram uma alta de 16,76% e 4,44%, respectivamente. O índice geral da inflação acumulada no período está em 10,67%.
Um relatório publicado em setembro pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) reafirma a elevação nos valores dos voos. No segundo semestre deste ano, houve aumento de 21,7% na tarifa aérea doméstica média em relação ao mesmo período de 2020. De acordo com a entidade, o reajuste ocorre em paralelo à alta de 91,7% no preço do combustível de aviação, na comparação com o mesmo período do ano passado.
Além do aumento do valor dos combustíveis, Pedro Kislanov, gerente do IPCA, cita a depreciação cambial como um dos fatores que têm colaborado para a alta nas passagens. Ele ainda complementa que a mudança no cenário da pandemia, com o avanço da vacinação, elevou o fluxo de pessoas nos aeroportos: “como a oferta ainda não se ajustou à demanda, isso também pode estar contribuindo com a alta dos preços”.
O professor de Ciências Econômicas da Fadergs Jorge Maia Ussan lembra que os setores aéreo e hoteleiro tiveram um impacto muito grande em 2020, com uma diminuição no movimento a nível mundial. Agora, as pessoas que não puderam viajar por mais de um ano e estão vacinadas contra a covid-19, querem aproveitar a flexibilização das medidas de prevenção para retomar seus planos de viagem.
— Depois desse período de muita contração por causa da pandemia, é normal que tenha uma explosão de demanda. E esse aumento [de pessoas viajando] faz com que os setores aumentem seus preços, especialmente o setor aéreo, que tem pouca oferta — diz o professor.
Maria Helena Costa Lima, professora de marketing aplicado ao transporte aéreo do curso de Ciências Aeronáuticas da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), salienta que, com a queda no número de passageiros durante a pandemia, as empresas aéreas tiveram prejuízos bilionários. Essa queda na receita, junto às despesas das companhias — muitas delas relacionadas ao dólar —, refletiram no valor final das passagens.
— As companhias têm despesas operacionais, como manutenção, seguro e salário de funcionários. Essas empresas tiveram muito prejuízo e não é que elas queiram recuperar o que perderam, mas elas precisam sobreviver — afirma.
Para Ussan, no caso da rede hoteleira, o aumento dos preços também está relacionado à elevação dos custos fixos desses estabelecimentos, principalmente quando se trata da energia elétrica, que vem sofrendo reajustes expressivos:
— A questão da energia aumenta os preços de tudo. É um efeito cascata, que atinge todos os setores.
Impacto no bolso dos consumidores
A blogueira Alexandra Aranovich, que administra os perfis @cafeviagem e @amoserragaucha no Instagram, não viajou de avião desde o início da pandemia, mas fez viagens locais — sobretudo para Santa Catarina e serra gaúcha. Ela relata que, toda vez que tentou ir para algum hotel, ou não tinham datas disponíveis ou o valor da diária havia aumentado muito.
— Não usei passagens, mas uso gasolina e sei que aumentou. E várias outras coisas também tiveram que aumentar por conta da gasolina, então ficou mais caro, inclusive, para viajar de carro — afirma. — Eu tenho casa em Santa Catarina, mas o preço para eu ir e voltar de carro e pagar a faxina ficou o preço de um hotel de luxo — compara.
Ao voltar a procurar por passagens aéreas recentemente, ela percebeu o aumento dos preços. Antes do início da pandemia, Alexandra estava com viagem marcada, mas precisou adiar para 2022. Agora, ela quer comprar uma passagem para o marido, mas reclama que o valor está muito alto.
Em relação às diárias de hotéis e à alimentação, a blogueira diz ter reparado um aumento mais significativo na metade deste ano, quando a situação da pandemia começou a melhorar. Na visão de Alexandra, tanto a serra gaúcha quanto a catarinense se tornaram destinos muito desejados neste período, e essa demanda tem gerado impacto constante nos preços.
Ricardo Freire, fundador do site ViajeNaViagem.com, tem a mesma percepção. Ele foi para Alagoas e Pernambuco em outubro deste ano e, no decorrer da pandemia, também fez ponte aérea Rio-São Paulo, além de ter viajado para Trancoso, na Bahia, em novembro de 2020.
— As passagens, sem dúvidas, estão mais caras. Há menos voos, e as pessoas querem viajar. Tem uma demanda reprimida e isso pressiona os preços. Não tem para onde fugir, viajar realmente está um luxo muito caro — opina.
Mas, segundo o professor de Ciências Econômicas da Fadergs Jorge Maia Ussan, esse aumento dos preços permeia todos os grandes destinos turísticos do Brasil, mesmo que alguns apresentem um impacto maior do que outros. A má notícia é que não existe previsão de uma breve mudança nesse cenário.
— Não há nenhuma perspectiva de diminuição de preços — afirma Ussan.