Por coincidência, a falência de uma das maiores empresas de viagens do mundo foi anunciada na mesma semana em que o Brasil realiza o principal evento do setor na América Latina.
Mas o encerramento das atividades da britânica Thomas Cook, que acarretou em uma gigantesca operação para o repatriamento de 150 mil turistas, não chegou a atravessar o Atlântico para virar assunto na abertura da 47ª ABAV Expo — promovida pela Associação Brasileira de Agências de Viagens (ABAV) desta quarta (25) a sexta-feira (27) nos pavilhões do Expo Center Norte, em São Paulo, reunindo mais de 2 mil marcas expositoras.
Entre as autoridades que falaram na abertura (entre elas, o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio), houve, no máximo, citações indiretas a um dos motivos atribuídos para a forte queda nos negócios da TC, uma pioneira com 176 anos de vida: a concorrência digital. As agências nacionais não estariam ameaçadas por sites como Airbnb (de hospedagem) e Booking (de passagens aéreas)?
— É uma grande bobagem — disse depois, a GaúchaZH, a presidente da ABAV, Magda Nassar. — Tanto é que, no ano passado, faturamos R$ 31 bilhões. Somos responsáveis por 85% de todas as vendas de serviços e produtos de lazer no país. De janeiro a julho, fomos o setor que mais cresceu no país, 3,2%, mais do que o comércio e do que várias indústrias.
Magda tem apenas uma queixa em relação a esses concorrentes: a falta de regulamentação tributária.
— Queremos que todos paguem os mesmos impostos — argumenta.
Para Roberto Haro Nedelciu, há quatro meses presidente da Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa), o caso da Thomas Cook foi muito específico:
— Não é verdade que ela faliu por causa da concorrência online. O que aconteceu foi que ela não se atualizou, além de se envolver em operações arriscadas. Quando você é um gigante de quase 200 anos, é difícil se movimentar.
Nedelciu reconhece o impacto da queda de um gigante, mas entende que as operadoras de turismo ainda são e serão necessárias:
— As pessoas podem prescindir delas para ir a Miami ou Paris, por exemplo. Mas tenta ir para o Uzbequistão ou o Vietnã sem alguém que te oriente?
Engenheiro de formação, ele diz que a tecnologia não veio para substituir, mas para se integrar à experiência humana. Mas as agências precisam, o quanto antes, se adequarem ao mundo digital.
— Somos nós que construímos máquinas, e máquina nenhuma já construiu um humano. As empresas devem abraçar com entusiasmo as mudanças que são irreversíveis — aponta Nedelciu.
O presidente da Braztoa, na cerimônia de abertura da 47ª ABAV Expo, comparou dois dados para mostrar o tamanho do mercado que pode ser conquistado. Há mais smartphones (230 milhões, segundo levantamento da Fundação Getúlio Vargas) do que pessoas no país (209 milhões). Mas apenas 17% dos brasileiros viajam regularmente.
— Cabe às agências procurar essa clientela, ficar mais próxima dela, e o caminho mais curto é via celular.
Uma inédita Black Friday
Uma das mais antigas operadoras do mundo — foi fundada em 1840, em Portugal — e com mais de 50 anos de atividade no Brasil, a Abreutur reagiu com "tristeza" à falência da empresa inglesa, disse o diretor Ronnie Correa, presente na Abav Expo. Ele reconhece que a concorrência digital "veio para ficar", mas também afirma a importância do contato humano:
— Segue sendo fundamental em viagens mais complexas. E somos nós, as pessoas, que lançamos destinos, somos nós que escolhemos parceiros, desde o transporte à hospedagem, com quem vamos trabalhar e que vão dar segurança e conforto ao turista. Precisamos unir expertise, qualidade e disponibilidade. O capital de cada agência deveria ser a confiança depositada pelo cliente na marca. Falando com humildade, dependemos que o cliente volte a viajar conosco. Vivemos da repetição dos clientes, em contraste com o mundo online, no qual não há tanta fidelidade. E, para isso, o lado humano é muito importante.
Um exemplo prático dessa interação será a inédita realização de uma Black Friday dentro da ABAV Expo. Pela primeira vez, a feira abrirá as portas para o público em geral, oferecendo 500 pacotes (para 300 destinos nacionais) com descontos de 5% a 50%.
*O jornalista viajou a convite da ABAV Nacional