Um lugar onde é comum voltarmos caminhando tranquilamente para casa no meio da madrugada, depois de um encontro com os amigos, mas quase impossível comprar uma garrafa de vinho depois das 18h. Terra dos cabelos loiros e escorridos, das peles sensíveis ao sol e dos meninos que desde o início da vida são ensinados a dividir as tarefas de casa, a separar o lixo e a entender que homens e mulheres têm direitos iguais. “O que importa é o sentido de comunidade e não o interesse individual de cada pessoa”, eles dizem, sem solenidade, olhando para o presente próspero. Uma região onde a água do oceano corre entre as montanhas e o número de lagoas é de uma para cada 11 habitantes, onde o salário mínimo é de R$ 12 mil por mês e ninguém conversa dentro do transporte público. Bem-vindo à Noruega.
Com uma área um pouco maior do que hoje é o Rio Grande do Sul, a Noruega é tudo o que a Venezuela, a Arábia Saudita ou o Iraque poderiam ter sido caso tivessem sabido aproveitar bem o petróleo que tem. Localizado no norte da Europa, o país, com grande parte do território coberto de gelo, encontrou no óleo negro o recurso necessário para a vida prosperar mesmo em temperaturas bem abaixo de zero. Não por acaso, os noruegueses costumam aparecer no topo nos rankings mundiais de qualidade de vida.
Quase um terço dos 5 milhões de habitantes vive na capital, Oslo. Uma cidade limpa e organizada, marcada por prédios de formato arrojado, típicos da arquitetura escandinava. Bastante receptiva a estrangeiros, costuma ser a primeira parada dos turistas.
Como não faz parte da União Europeia, a Noruega não adota o euro. A moeda é a coroa norueguesa, que, grosso modo, levando em conta oscilações cambiais, tem uma relação de 2 por 1 com o real, ou seja: cada real vale duas coroas. Mas não seja traído pela ilusão monetária. O país é um dos mais caros do planeta. É fácil gastar 1,1 mil coroas (R$ 550) em um jantar a dois.
A modernidade de Olso, com seus arranha-céus de concreto e vidro, contrasta bastante com a paisagem bucólica do interior da Noruega, onde as principais atrações são, ao Norte, a aurora boreal e, ao Sul, os fiordes.
O mapa do país lembra bastante o formato de um bandolim. Como o braço do instrumento, o norte se estende por uma estreita faixa de terra – tomada de gelo a maior parte do ano. É lá, no extremo do país, próximo ao Círculo Polar Ártico, que, no auge do verão, o sol nunca se põe; no inverno, a noite nunca acaba; e as auroras boreais dançam pelos céus, revelando faixas e ondas de luz vermelha, violeta, azul e verde.
Mais ao sul, o território se expande e ganha uma forma de tampo. É nessa região, um pouco menos castigada pelo frio (o que não significa “calor”: as temperaturas podem chegar a 20 graus negativos entre dezembro e fevereiro) que estão localizadas outras conhecidas cidades norueguesas: Ålesund, Bergen e Stavanger.
De Gaustattopen, vê-se um sexto do território
Meu roteiro previa percorrer mais de 2 mil quilômetros de carro pelo Sul do país, partindo de Oslo até Ålesund, a capital nacional do bacalhau. A primeira parada: Gaustattopen. Uma das montanhas mais altas da região, com 1,8 mil metros de altitude, recompensa os aventureiros com uma visão ampla da geografia do país. Em um dia de céu claro, um sexto do território da Noruega – e parte da Suécia – pode ser visto a partir do ponto mais alto. Tomado pela neve no inverno e por famílias no verão, é o típico programa norueguês: caminhada em silêncio para aproveitar a natureza.
São cerca de oito quilômetros (ida e volta) de subidas e descidas sobre as pedras, mas está longe de ser um passeio exclusivo aos mais experientes. O lugar é cheio de idosos, crianças e até bebês, carregados pelos pais nas costas, em mochilas-canguru. Atividade física ao ar livre é esporte considerado nacional. No topo do Gaustattopen, um café serve os típicos waffles e permitem um descanso depois das fotos e antes da íngreme descida.
Com a maior parte da população vivendo nos grandes centros, é fácil dirigir por horas sem encontrar gente pelo caminho, mesmo no verão. As regiões montanhosas são intercaladas por campos verdes, onde se veem ovelhas por todos os lados e casas e celeiros de madeira, pintadas, grande parte delas, de vermelho e branco.
No interior do país, também se encontra o oceano. A água invade a Noruega em imensas fendas terra adentro, dando origem aos famosos fiordes. O resultado é água do mar a mais de 200 quilômetros da costa. Estreitas faixas de oceano ladeadas por paredões rochosos de mais de mil metros de altura.
São centenas deles. O mais famoso, o Geiranger, integra a seleta lista de patrimônios culturais da Unesco. A maior parte dos visitantes chega ao pequeno vilarejo no interior do imenso fiorde de navio, mas para quem gosta de dirigir por paisagens cênicas, também é possível ir de carro até lá.
Situado na Comuna de Stranda, a cem quilômetros da costa oeste, a cidadela conta com uma população de não mais de 300 habitantes, mas a infraestrutura é de metrópole. Tem o segundo maior porto de cruzeiros da Noruega e recebe cerca de 1 milhão de turistas por ano.
Chegando ao vilarejo, cheia de casas brancas de madeira, é possível seguir para o mirante da montanha Dalsnibba, 1,5 mil metros acima do nível do mar. A subida – e o preço do pedágio – compensam. Enquanto entre maio e junho a região é coberta de neve e do alto as pessoas veem as montanhas brancas, entre agosto e setembro é possível ver um imenso vale verde que encanta os olhos.
A partir de lá, o trajeto segue pelas montanhas. No alto de algumas, é possível encontrar geleiras, blocos de gelo que mesmo após o fim da era glacial nunca derreteram completamente. Alimentados de neve durante o inverno gelado, sobrevivem ao aquecimento global. Durante o verão, com o aumento dos termômetros, parte do gelo derrete formando dezenas de lagos, corredeiras e cachoeiras de água cristalina. O terreno rochoso dá à água tons verdes e azuis encontrados em poucos lugares no planeta.
Ålesund, a cidade mais bonita do país
Antes de chegar ao destino, a cidade portuária de Ålesund, no extremo oeste, vale a pena desviar um pouco da rota em direção a Trollstigen. O roteiro de 106 quilômetros de curvas sinuosas dá ao visitante a perfeita dimensão da convivência harmoniosa que os noruegueses mantêm com a natureza.
A estrada, um habilidoso trabalho feito por engenheiros e construtores, contorna montanhas escarpadas e vales verdejantes. Ao todo são 11 curvas acentuadas que serpenteiam as encostas, lembrando, em uma escala muito maior, a rodovia da Serra do Rio do Rastro, no sul catarinense.
Chegando a Ålesund, o destino final, o momento foi de relaxar as pernas. O município portuário, construído em uma fileira de ilhas, é cheio de casas com cores vibrantes e bons restaurantes. Não à toa, a capital nacional do bacalhau é considerada por muitos, também, a cidade mais bonita da Noruega. Nada melhor do que planejar o retorno ao país provando um saboroso peixe, sentindo a brisa marinha e tendo uma bela paisagem como pano de fundo.