Por Iara Tonidandel, especial
Eu tinha nove anos quando assisti ao filme Ana e o Rei do Sião, ambientado no Ceilão, agora chamado de Sri Lanka. À época, olhando para o teto do meu quarto, pensei: “Um dia, ainda vou conhecer aquele lugar”, uma ilha que era pura magia e encantamento. Em outubro de 2017, realizei esse sonho.
Em uma viagem fotográfica ao Vietnã, com destino final na Austrália, busquei um programa de trabalho voluntário para aproveitar melhor minha ida para este lado do mundo. E assim fui parar em Colombo, a maior cidade do Sri Lanka. Trabalhei duas semanas como voluntária nos projetos da Idex, a Escola para Monges e o do Empoderamento da Mulher. Findo o trabalho, viajei para conhecer alguns recantos da ilha.
Deparei com belíssimas paisagens, tanto na praia quanto nas montanhas. Em Mirissa, fui em busca das baleias azuis. Não as encontrei, mas fotografei grupos de golfinhos maravilhosos e um pôr do sol cheio de tons rosas, violáceos e amarelos. Em Ella, todos os dias, dezenas de pessoas se deslocavam para ver e fotografar a passagem do trem por uma ponte. Acreditem: ela é maravilhosa, dramática! Vale a pena ir até lá pelo caminho da montanha, pois observa-se o local de vários níveis e perspectivas. Rende fotos belíssimas.
Em Kandy, a segunda cidade do país, entre vários locais bonitos e interessantes, conheci o Jardim Botânico, deslumbrante. Quando passamos por seu portão, parece que entramos em outro espaço, tamanhas a beleza e a grandiosidade. Uma diversidade de árvores seculares se espalham pela sua área. Na cidade, também fica o Templo da Relíquia do Dente Sagrado, muito procurado por turistas e moradores. Já em Dambulla, prepare-se para subir alguns degraus para entrar no Templo Dourado e ver as imagens nas cavernas. São lindas!
E os elefantes? São considerados símbolos de Buda, sagrados e cuidados. Esses animais exercem várias funções na sociedade da ilha. São vestidos para participar das cerimônias budistas, usados como transporte e destacam-se como a principal atração nos parques que, embora denominem-se orfanatos, ainda são zoológicos.
De trem ou tuk tuk
Andar de trem pelo Sri Lanka é uma delícia. Uma das melhores coisas, senão a melhor, que vivenciei por lá. A estrada de ferro passa por lugares e florestas tropicais fantásticos. Muitos túneis, pontes, pequenas plantações de chás e especiarias demarcam os caminhos percorridos. Os grandes coqueiros com folhas verdes, amarelas e marrons proporcionam uma paisagem linda, mesmo que, no entorno, só existam casas de barro ou de zinco. Às vezes, casebres com paredes de sacos pretos de plástico. A pobreza está por todo o país.
A primeira classe nos trens é ótima, com ar-condicionado e poltronas reclináveis espaçosas. Quer se divertir mesmo? Vá de segunda ou terceira classe, nas quais janelas e portas ficam abertas – dá para observar, fotografar e curtir muito mais a viagem.
Na cidade, o tráfego é maluco. Carros, motos, bicicletas, tuk tuks, ônibus e trens estão sob o mesmo asfalto. Uma buzinação terrível! Para cada carro ou cada moto, há 10 tuk tuks fazendo malabarismos no trânsito. Prepare-se para viver emoções fortes ao andar nesses veículos.
Pimenta, muita pimenta
Onde você escolher comer, seja na barraquinha da rua ou no restaurante arrumadinho, a comida é sempre a mesma. E esteja preparado para comer pimenta em tudo – mesmo que peça sem chilli, ele estará presente no seu prato. A comida é boa, normalmente, arroz, abóbora com leite de coco, lentilha, quiabo, vagem, massa de arroz, galinha com molho vermelho ou peixe, tomate e pepino.
Carne bovina é luxo. Pode pedir, mas se paga mais caro. Se quiser saborear o café, saiba que, na maioria das cafeterias, é feito tipo café turco – você vai beber a borra. Os chás são maravilhosos. Alguns, inclusive, com pimenta e gengibre. Não há como fugir desse calor!
O som da fé
Todos os dias, eu acordava às 5h. Insônia? Problema com o fuso? Nada disso. Despertava com as orações dos mulçumanos que ecoam pelas cidades, pelas praias, pelas montanhas, enfim, por toda a ilha. Eles entoam suas preces cinco vezes ao dia. Quando os muçulmanos fazem um intervalo, começam os budistas. Oram e oram. Terminam os budistas, os católicos não deixam por menos. Invadem os ares com as badaladas de seus sinos. Quando tudo silencia, começa a tocar a caixinha de música do vendedor de pão. Sim! Vários tuk tuks andam pela cidade vendendo pão. E assim o dia acontece.
Adorei cada minuto que estive no Sri Lanka. Quanto ao meu desejo de infância, realizei. Entretanto, ficou distante a imagem romântica daquela ilha paradisíaca, em que o rei, um aborígene, encanta a linda inglesa, branca. Não há rei nem inglesa. Não há romance. Há muita gente necessitada, que precisa receber auxilio para ter uma vida melhor.
*A porto-alegrense Iara Tonidandel é fotógrafa na empresa ClickIara