Cortado pelo arroio batizado de Não Sabia e rodeado por matas e cavernas até pouco tempo desconhecidas, o município de Fagundes Varela ainda mantém viva a tradição dos imigrantes italianos que chegaram à região por volta de 1888, com as festas de capela, a religiosidade e a gastronomia típica. Divulgar essas belezas que passam despercebidas no dia a dia, valorizar a história da cidade e revelar os encantos locais foi a intenção de um grupo de estudantes do 5º ano da Escola Municipal de Ensino Fundamental Caminhos do Aprender, que criaram o roteiro turístico Descubra as Belezas de Fagundes Varela.
O roteiro foi idealizado no ano passado, em sala de aula. Eles levaram a tarefa a sério, e o aprendizado deixou os bancos escolares: apresentaram o projeto para a prefeita Claudia Moreschi Tomé (PP) e passaram a ver a cidade onde nasceram e vivem com outros olhos. Pontos por onde passavam todos os dias ganharam novo significado e hoje são vistos como lembranças vivas da história e dos costumes e, principalmente, dos encantos ocultos de uma pequena cidade.
A ideia do projeto partiu das professoras Géssica Dondi e Eliane Pelegrini Zandoná, após sugestão da Secretaria da Educação, para que a escola participasse no ano passado do Prêmio Criativos da Escola, do Instituto Alana, organização sem fins lucrativos que aposta em programas que transformem a escola e a sociedade. O projeto não levou o prêmio, mas foi um dos finalistas, o que é comemorado pelos estudantes.
Até mesmo as leis estaduais e municipais foram analisadas pelos alunos para que pudessem propor uma emenda na lei orgânica do município, no artigo 197, que dispõe sobre o turismo em Fagundes Varela, para reativar o Conselho Municipal de Turismo. A intenção é incentivar melhorias nos setores alimentício, hoteleiro e de transporte e também estimular a formação de guias de turismo para receber os visitantes.
– Nossa cidade é pequena, mas é linda. Tem muitas belezas aqui que nós não percebíamos porque passamos todos os dias pelos lugares. Hoje olho para cada lugar de um jeito diferente – conta o estudante Cristiam de Moraes Massens, 11 anos.
Crescimento barra na falta de infraestrutura
A cidade não tem secretaria de Turismo. A pasta é vinculada à Administração. Para quem tem interesse em realizar o passeio, a prefeitura pode repassar informações e entregar materiais de apoio. O site da prefeitura, fagundesvarela.rs.gov.br, é outra fonte para os turistas.
Ilustrado com desenhos estilizados, o material reproduz os prédios públicos, os pontos turísticos, os principais eventos de esporte, cultura e lazer, as capelas e as belezas naturais da cidade e foi distribuído para moradores, escolas e turistas. Contudo, de acordo com a prefeita Claudia Moreschi Tomé, a implantação da rota turística esbarra na falta de investidores. A ausência de hotéis também é um entrave para receber os visitantes. A única opção de hospedagem fechou as portas neste ano.
Alguns destaques da rota
Moinho Melatti
Datado de 1888, o Moinho Melatti esteve em funcionamento até 2010 e está passando por reformas. Antigamente, a estrutura transformava grãos de cereais em farinha moendo-os com uma roda de pedra movida pela força d’água. O prédio centenário foi escolhido como ponto inicial da rota turística devido à importância para o desenvolvimento da cidade. A turbina, que era acionada pela força do Arroio Vicente Rosa, também conhecido como Melatti, ao lado do prédio, ainda pode ser vista pelos turistas.
Rio Não Sabia
O próprio nome instiga a curiosidade dos visitantes. No local, há um bondinho de madeira, usado como transporte alternativo pelos moradores para atravessar de Fagundes Varela a Guaporé. Ele desemboca no Rio Carreiro, logo depois de onde antes havia uma ponte de madeira com pilares de pedra, que foi levada pela forte chuva em 1941. Ainda é possível ver as pedras, no ponto onde também existia uma balsa, que acabou desativada.
Estátua do Padre Ângelo
Considerado milagreiro, o pároco recebeu uma estátua e tem a devoção e o carinho dos fiéis na cidade. Nas tempestades e furacões, os fagundenses recorrem ao padre e contam histórias da sua fé, que passam de pai para filhos fortalecendo a espiritualidade tão viva na cidade. A capela onde está sepultado o corpo do pároco recebe milhares de pessoas todos os anos, pedindo bênçãos e agradecendo por graças alcançadas. Para valorizar a história do padre e manter viva sua memória, todos os anos, no primeiro final de semana de março, Fagundes Varela promove a Romaria ao Túmulo do Padre. A programação prevê caminhadas e celebração eucarística.
Gruta Nossa Senhora de Lourdes
A gruta, construída em pedra basalto em 1924, está sempre aberta aos visitantes. Localizada nas proximidades da Igreja Matriz, no centro de Fagundes Varela, ao lado de uma capela em madeira, o lugar é frequentado por moradores que buscam boas energias, paz e tranquilidade.
Capela São Pedro
A capela São Pedro, construída em 1912, é um dos patrimônios históricos da cidade. Com 106 anos e repleta de histórias, foi revitalizada no centenário da igreja, em 2012. O serviço foi realizado pelos moradores da localidade, em conjunto com a prefeitura. Distante cerca de seis quilômetros do centro de Fagundes Varela, chama a atenção pelo campanário onde está instalado o sino, logo ao lado da capela. No pequeno templo, o padre Ângelo Mônaco, que ficou no lugarejo de 1923 a 1948, ano em que faleceu, rezava as missas em italiano.
Casa Ghiggi
A construção centenária servia de parada para os tropeiros de 1920 a 1950. Na propriedade conhecida como Casa de Pasto, funcionava uma hospedaria, uma ferraria e uma casa comercial. Depois da década de 1960, a parte comercial foi extinta, e a família ainda morava no local. Recentemente, a casa foi fechada, mas mantém no interior lembranças da colonização italiana, que é marcante no município. A família frequenta a residência apenas aos finais de semana. Em frente, há um açude, e ao lado o espaço onde funcionava a ferraria.
Trilha ecológica
Os alunos criaram uma trilha ecológica após percorrer a mata em um terreno particular para desvendar uma caverna. O local fica a cerca de 30 minutos do centro do município, na capela de São Marcos. Após percorrer 20 minutos de caminhada na trilha, com a vista do Rio Carreiro, os visitantes podem entrar na caverna, onde há vestígios de habitantes primitivos.
Capela Nossa Senhora do Rosário
Construída em 1900 numa área que deveria ser o centro da cidade, a capela está distante cerca de três quilômetros da área central. A comunidade cresceu em torno dela e, até hoje, há famílias que vivem naquela terra e sobrevivem do que produzem ali. Ao lado da capela, há um campanário, que parece uma pequena torre de madeira, onde está localizado o sino. Há também o cemitério, cercado por muros de pedras e com cruzes artesanais em ferro.
Cultura italiana
O roteiro finaliza com as tradicionais “festas de capela”, realizadas aos domingos nas colônias italianas do interior do município.