Quando estimadas 40 toneladas de amor eterno (aproximadamente 700 mil cadeados) foram removidos da Pont des Arts, em Paris, em junho, o amor não chegou ao fim, apesar do dilúvio de lamentos na mídia social.
Os cadeados do amor estão vivos e passam bem em Paris e muitas outras cidades do mundo, onde turistas estão determinados a depositá-los como um ritual para marcar uma viagem romântica. Se isso é uma coisa boa depende da cidade. As autoridades os encaram como um flagelo ou uma atração.
E Paris, onde talvez existam mais cadeados do que nunca, é a primeira opção.
– As pessoas que não estiveram em Paris não conseguem entender como isso é ruim – disse Lisa Anselmo, cofundadora do nolovelocks.com, grupo comunitário cuja meta é educar o público sobre os danos causados pelos cadeados. – Quando viajamos a outras cidades como turistas, deveríamos pensar no impacto que teremos nas pessoas que ali moram.
O abaixo-assinado na internet pedindo que Paris proíba os cadeados na cidade inteira tem mais de 10 mil assinaturas.
Utilizando uma fórmula baseada em quantos cadeados a prefeitura disse ter removido da Pont des Arts, Lisa estima que agora existam 1,5 milhão deles na cidade, presos a 11 pontes e várias atrações turísticas, incluindo a Torre Eiffel.
Os cadeados viraram moda em Roma há quase uma década, por inspiração de um romance famoso, e Paris se tornou o destino de pessoas que buscam uma ponte para pendurar seus cadeados há mais de cinco anos.
A remoção dos cadeados da Pont des Arts, em junho, veio um ano após uma parte da cerca ter caído por causa do peso. Citando preocupações estéticas e estruturais, a prefeitura removeu as grades de cadeados e temporariamente as substituiu por painéis pintados por artistas de rua.
Agora, a prefeitura de Paris está instalando painéis de vidro antirreflexo permanentes na ponte e espera terminar o trabalho até janeiro, afirmou uma autoridade municipal. Uma reforma semelhante acontecerá na outra ponte recheada de cadeados, a Pont de l'Archevêché, arredores da catedral de Notre Dame, no começo do ano que vem.
– Há muitas outras maneiras de expressar seu amor – disse em junho Bruno Julliard, vice-prefeito de Paris encarregado da Cultura. – O recado que queremos passar é que esse hábito tem de parar.
Paris ainda tem de aprovar uma proibição válida para a cidade inteira e, apesar da tentativa de incentivar os turistas a tirar fotos e publicar na mídia social com a hashtag #LoveWithoutLocks (amor sem cadeados), turistas determinados estão prendendo seu amor em qualquer lugar em que acham espaço.
– As pessoas penduram cadeados ao lado de placas com os dizeres "não prenda cadeados" – disse Lisa. – Há cadeados até em latas de lixo.
Desde que os cadeados começaram a aparecer em Paris, eles se espalharam por várias cidades, grandes e pequenas, em todos os cantos do mundo. Tantos foram instalados na Ponte do Brooklyn, em Nova York, que o Departamento de Transportes municipal começou a removê-los no verão de 2013.
Segundo o órgão, os cadeados representam um perigo à infraestrutura e aos carros da ponte, e que 9.363 foram removidos entre primeiro de janeiro de 25 de setembro deste ano.
Já outras cidades recebem a moda de braços abertos. Na pequena cidade escocesa de South Queensferry, foi organizado um evento para arrecadação de fundos pelos 50 anos de aniversário da ponte de Forth Road em prol de uma entidade beneficente local.
A prefeitura vendeu mais de 3 mil cadeados do amor pelo site, segundo Chris Waite, gerente de comunicação da ponte de Forth Road, e arrecadou mais de US$ 15 mil. Contudo, a prefeitura tomou providências para que a ponte aguentasse.
– Nós aprendemos com a experiência parisiense e colocamos painéis especialmente projetados que suportassem o peso dos cadeados – explicou Waite.
George Affleck, vereador da Câmara Municipal de Vancouver, Colúmbia Britânica, Canadá, viu o que era um cadeado do amor durante visita a Paris, em 2012.
– Naquela época, eles ainda não haviam prejudicado a ponte, mas achei muito interessante observar pessoas compartilhando seu amor e o expressando por meio do cadeado – disse ele.
Três anos depois, Affleck é conhecido em Vancouver como o "vereador do amor" por seus esforços de achar um destino permanente na cidade para turistas e moradores instalarem os cadeados do amor.
Os cadeados começaram a surgir espontaneamente em pontes e cercas de Vancouver há alguns anos e terminaram causando temores quanto à infraestrutura e à segurança, principalmente em pontes não construídas para suportar o peso extra, e tiveram de ser removidos.
A iniciativa de Affleck levou a uma pesquisa pública, em agosto, por parte do organismo que cuida dos parques municipais, permitindo que os cidadãos de Vancouver pudessem escolher um destino permanente para os cadeados do amor. Em outubro, a prefeitura aprovou o Parque Rainha Elizabeth como futuro lar de uma instalação de arte na qual os cadeados possam ser presos.
– Não é uma ideia nova, mas vamos acrescentar um toque de Vancouver – disse John Coupar, diretor dos parques municipais.
A ideia de transformar cadeados do amor em arte já aconteceu em outros lugares, tais como Toronto, Moscou e várias cidades europeias.
Será que uma área designada para cadeados do amor ajudará a resolver o problema de Paris?
– Não, essa hora já passou. O problema é grande demais para controlar ou conter – garantiu Lisa. – Não dá para liberar cadeados em um lugar e proibir em outros. Já virou mania.
Embora a atividade irregular de prender cadeados possa provocar problemas, está claro que os turistas curtem, e muito provavelmente darão continuidade a ela onde for permitido.
– As pessoas querem reconhecer momentos em suas vidas, e o amor é uma coisa importante para elas – disse Coupar.