Herculano, Itália - Eles são retratos impressionantes de morte súbita: grupos abraçados de esqueletos no que já foram armazéns de frente para o mar, imortalizados por toda a eternidade quando o Vesúvio sufocou esta antiga cidade romana em 79 d.C.
- Eles morreram de choque térmico enquanto esperavam para serem salvos por mar - disse o arqueólogo Domenico Camardo recentemente enquanto pesquisava dúzias de grupos de moldes modernos de esqueletos de habitantes muito antigos. Eles levavam consigo joias, moedas e até "20 chaves, por que esperavam voltar para casa", completou Camardo. - Eles não entendiam que tudo aquilo estava prestes a acabar.
Com as primeiras escavações há 30 anos, os armazéns foram recentemente equipados com passarelas para servir de acesso a esses quadros arrepiantes e em breve serão abertos ao público em ocasiões especiais.
Reviver a história para um público moderno "é uma das coisas maravilhosas que podemos fazer", explicou Camardo, arqueólogo que lidera o Projeto de Conservação de Herculano, iniciativa conjunta do Instituto Packard Humanities, de Los Altos, Califórnia; da autoridade local de patrimônio artístico; e da Escola Britânica de Roma. O projeto, uma parceria público-privada, gerencia o sítio há mais de uma década e tornou possível concluir trabalhos como as passarelas que levam aos grupos de esqueletos.
Comparada a sua vizinha vesuviana mais conhecida, Pompeia, onde autoridades locais, limitadas por fundos inadequados e mal administrados do governo, lutam para conservar e proteger o vasto sítio arqueológico ao ar livre - e até mesmo para prevenir os famosos e periódicos desmoronamentos das paredes - Herculano tornou-se um caso exemplar de conservação arqueológica bem sucedida.
Há muitos anos, arqueólogos e conservadores realizam o que eles descrevem como "trabalho invisível" aqui, como instalar uma cobertura de proteção com um bom custo-benefício ou reativar a rede de esgoto subterrânea de Roma, para que os prédios possam escoar a água das chuvas novamente. Ao invés de focar em um conjunto de afrescos, digamos, ou em uma única casa, "temos raciocinado em termos mais amplos", Camardo disse. - Isso demora mais tempo e é bem menos espetacular, já que estamos olhando para esgotos e encanamentos, mas no final é mais eficaz.
Além de tempo, o trabalho também recebeu a generosidade do filantropo norte americano David W. Packard, filho de um dos fundadores da Hewlett-Packard (HP), que superou os investimentos do Estado, investindo discretamente mais de 20 milhões de dólares no projeto nos últimos 12 anos e montando uma equipe de especialistas, praticamente todos italianos, para ajudar os funcionários locais.
Embora evite publicidade e não tenha aceito ser entrevistado para esta matéria, Packard tem estado "muito envolvido pessoalmente" e é constantemente informado sobre as evoluções no projeto, visitando o sítio regularmente, contou Jane Thompson, gerente de projetos do Projeto de Conservação de Herculano. - Não é apenas uma questão de patrocínio.
Packard está na banca que supervisiona o projeto e no ano passado tornou-se cidadão honorário da cidade moderna de Herculano. Atualmente ele está envolvido nas discussões sobre a construção de um novo museu aqui, que exibiria os artefatos do sítio e também serviria como um centro de conservação.
- O pessoal da Packard realmente fez a comunidade local e as autoridades se engajarem e sentirem como se esse projeto fosse deles - disse Daniel Berger, consultor do Ministério da Cultura que tem atuado como elo de ligação no projeto Packard. - Isso fez do monumento uma fonte de orgulho, e de renda.
Maria Paola Guidobaldi, representante do Ministério da Cultura que gerencia o sítio arqueológico, foi mais longe, dizendo que o apoio do Instituto Packard Humanities "nos permitiu salvar o sítio". O governo italiano distribui quatro milhões de dólares por ano para Herculano, segundo ela, mas os fundos do Packard permitiram que os conservadores trabalhassem de maneira mais estruturada e proativa. - Tem sido uma experiência extraordinária que esperamos que continue por que ainda há muito a ser feito - disse ela.
O desmoronamento de uma série de paredes e outros contratempos em Pompeia, incluindo um episodio recente no último verão quando uma viga de apoio desmoronou na chamada Villa dos Mistérios, colocaram seus problemas de preservação sob um foco desagradável. Em 2011, a União Europeia alocou 135 milhões de dólares durante um período de quatro anos para a preservação de Pompeia, mas especialistas garantem que os problemas na região vão muito além da falta de fundos e incluem problemas de gestão e inércia burocrática.
Mas as autoridades de Herculano dizem que o sítio não estava muito melhor quando a equipe de Packard chegou em 2001. (Herculano foi descrita em uma conferência europeia em Roma, em fevereiro de 2002, como o pior caso do mundo de um sítio arqueológico extremamente decadente, sem guerra civil que o justificasse.)
- Era um desastre completo, mas por razões muito complexas e que levaram muito tempo para serem compreendidas - explicou Sarah Court, porta-voz do Projeto de Conservação de Herculano, lembrando que cerca de dois terços da antiga cidade estavam fechados para o público, e a degradação - mosaicos quebrados, tetos caindo, afrescos se desfazendo - estava por todos os lados.
Práticas de gerenciamento mais integradas e uma mudança na abordagem inflexível e hierárquica típica da burocracia italiana ajudaram a colocar Herculano em um caminho mais bem-sucedido. Novas formas de apoio também têm sido cultivadas, e colaborações têm sido realizadas com outros parceiros não governamentais, tanto italianos quanto internacionais, em apoio à autoridade de patrimônio público.
A Unesco está trabalhando nos sítios arqueológicos vesuvianos e estudando como Herculano poderia ser um exemplo para outros Patrimônios da Humanidade, particularmente em países mediterrâneos e árabes. - Packard é a versão saudável de filantropia que nos permite aprender lições que esperamos poder usar além de Herculano - disse Court.
Para os visitantes, a experiência que se tornou possível graças à conservação de Herculano pode ser intensa. - Pompeia é espetacular; Herculano é mais realista - disse Judy Lawrence, da Inglaterra, que visitou os dois sítios no último verão do Hemisfério Norte. - Este lugar faz você chorar.
The New York Times
Ruínas de Herculano são revividas por filantropia e dedicação
Criado a partir de uma parceria público-privada, projeto virou exemplo de conservação arqueológica bem sucedida
GZH faz parte do The Trust Project