Cheguei a Tlaxcala, pequena capital que também dá nome ao menor Estado do México, no domingo antes do Dia da Independência do país, 16 de setembro. A cidade estava repleta de estandartes e luzes com o vermelho, verde e branco da bandeira nacional. Ao crepúsculo, havia bombinhas comemorativas, e, de manhã, o céu sem nuvens exibia um profundo tom verde azulado.
Comparada ao ar encoberto e marrom que circunda a Cidade do México, apenas duas horas a oeste, a palheta de cores de Tlaxcala é quase caleidoscópica. As construções baixas da era colonial são pintadas em ocre queimado, rosa-salmão e amarelo mostarda, e as cúpulas da catedral alaranjada são cobertas de azulejos talavera em azul-cobalto. E, ao contrário da Cidade do México, onde o trânsito desesperador pode parecer uma jaula, Tlaxcala conta com um centro compacto, uma ótima base para se explorar os campos ao redor, com seu vasto céu.
Esse é o principal atrativo de Tlaxcala, com uma população de cerca de 15 mil habitantes. É uma cidade construída em uma escala modesta, que manteve seu charme histórico - perfeita para um final de semana longe de sua enorme cidade vizinha. É também a capital do estado mais seguro do México, com um baixo índice de criminalidade.
Tlaxcala está localizada em um enorme vale onde o milho e a pimenta são cultivados em um solo rico e vulcânico desde os tempos précolombianos. Os vulcões gêmeos, Popocatepetl e Iztaccihuatl, agigantam- se à distância, com seus picos cobertos de neve e com uma eventual fumaça saindo do topo.
Nessa terra fértil, o povo ancestral de Tlaxcala construiu cidades de pedra e as pintou com desenhos de jaguares e serpentes com penas. Eles guerreavam contra uma poderosa nação rival, seus vizinhos astecas. Quando os espanhóis chegaram, os guerreiros indígenas da região se aliaram aos conquistadores europeus.
Nos séculos seguintes, cerca de mil " haciendas" foram construídas no Estado - grandes propriedades rurais que cultivavam uma mistura de produtos do Velho e do Novo Mundo, criavam animais e produziam " pulque", a seiva pegajosa e fermentada do agave ( conhecido no México como " maguey") e uma bebida viscosa, branca e levemente alcoólica.
Hoje, restam cerca de 200 " haciendas", com amontoados de igrejas, estábulos e escolas encimando seus milharais. Em sua maioria, elsão relíquias decadentes, mas cerca de uma dúzia foi restaurada e está aberta à visitação, seja como hotéis que parecem museus, cheios de antiguidades e artefatos, ou como restaurantes. Na paisagem das planícies do México central, esses complexos decadentes de adobe e pedra oferecem uma visão estranha e cinematográfica da idade de ouro do México.
Na hacienda (1)
Viaje até o vilarejo de Huamantla, a cerca de 45 minutos de Tlaxcala, e você encontrará Soltepec, a mais conhecida das" haciendas" ainda em funcionamento. Ela se agiganta sobre os campos ao redor como um castelo, com torres imponentes de pedra e uma porta alta de madeira. Essa" hacienda" foi reaberta em 1994, com uma piscina, quadras de tênis e um restaurante elegante que serve ricas especialidades locais, como o" mixiote de borrego" (cordeiro marinado, cozido em um papel feito com folhas de" maguey") e os" escamoles"( larvas de formiga, catadas das raízes do" maguey").
Os apartamentos são arejados e, à noite, o labirinto de corredores estreitos e com pé direito alto do Soltepec podem parecer uma versão mais ao sul do hotel do filme O Iluminado. Na tarde da terça- feira em que visitei a Soltepec, seu dono, Javier Zamora Rios, concordou em me levar em um tour na zona rural de Tlaxcala. Preso em uma reunião, ele enviou um representante, Ruben, que me levou a uma igreja católica romana de 500 anos em San Lucas, o bairro mais antigo de Huamantla.
Subimos uma escada estreita de madeira em espiral até o telhado abobadado cor de laranja, no qual encontramos esculturas de bois com chifres onde normalmente haveria ícones religiosos. Olhando para a cidade abaixo, vi crianças brincando na praça e, mais além, o pico mais alto do México, o Orizaba.
Na hacienda (2)
Quando Zamora finalmente chegou, Ruben e eu havíamos nos enfiado em um pequeno restaurante caseiro, o La Casa de los Magueyes, onde nos serviram os últimos cogumelos selvagens da estação, diretamente das encostas do La Maninche, outro vulcão das redondezas.
Os cogumelos foram preparados de maneira simples, temperados com alho, levemente grelhados e salpicados com brotos amargos de" maguey". Mais tarde, nós três seguimos de carro por estradas estreitas, atravessando intermináveis milharais, depois subindo morros baixos. Logo chegamos à Hacienda Tepeyahualco, uma das muitas que pertenceram aos bisavós de Zamora, hoje gerida por três irmãos que a dedicaram à vida do" charro", o vaqueiro mexicano, com pôsteres de touradas, antigos ferretes e rifles enferrujados nas paredes.
Depois, subimos mais os morros até a casa deValentin Montiel Calderon, um" pulquero" de 78 anos. Zamora me disse que seu " pulque" seria mais forte e fresco do que qualquer outro que eu já havia experimentado. Seu filho, Joel, fez um pequeno discurso de boas- vindas ao seu humilde lar, e eu também fiz um - em meu espanhol torto - agradecendo sua hospitalidade.