Deitado na sombra, rabo abanando, língua de fora e orelhas em pé. Ao primeiro sinal de contato, se vira e expõe a barriga branca, de poucos pelos. O dócil e alegre animal é Mateus Grandão, cão de porte avantajado oriundo de uma cruza de raças. Socorrido por moradores de Capão da Canoa, no Litoral Norte, ele passou a viver na Praça Flávio Boianovski, a três quadras do mar.
A situação de hoje, com comida, água, passeios e muito carinho é fruto de uma corrente do bem iniciada pelo síndico do edifício onde o animal foi encontrado, Flávio Alberto Oliveira Fonseca, 55 anos. No último domingo (17), o militar da reserva saía para a pedalada matinal e, ao deixar o prédio, notou o que pensou serem duas pessoas conversando. Avistou o cachorro deitado no chão, debilitado, e um reciclador falando com o animal. Ele havia encontrado o cão em frente à portaria, após arrastar-se pela calçada, e tentava ajudá-lo.
- O cão estava muito debilitado, não reagia. Na hora eu o peguei e o dono da ferragem, o senhor Tonial, me indiciou um veterinário que aplicou um anestésico - relembra.
O primeiro atendimento custou R$ 500, e incluiu vermífugos, remédios para estancar a hemorragia em uma pata quebrada e as medicações para parar a dor. O síndico pagou a conta, mas a comunidade decidiu retribuir o favor. Em uma vaquinha de porta em porta, parte das despesas foi sanada.
- O cão deu sorte de encontrar gente do bem. Agora está na mordomia, todo dia alguém traz comida, tem café, almoço e janta – diverte-se o eletricista Edison Siqueira Rodrigues, 58 anos, morador do Edifício Mateus, referência para um dos apelidos do animal.
Alguns moradores se referem a ele como Grandão, outros chamam de Pernetinha. Ao ter a história relatada na Rádio Gaúcha, na manhã desta sexta-feira (22), o jornalista Antonio Carlos Macedo deu a sugestão:
- Chama de Mateus Grandão - disse o comunicador.
Não havia outra fratura, além da constatada na pata dianteira direita. Parte da “almofada”, debaixo dos dedos, estava machucada, mas não com gravidade, segundo o veterinário José Ivo Santos Totta. Uma tala foi providenciada para evitar que ele fique com sequelas e possa voltar a andar normalmente, em cerca de 30 dias, segundo o especialista repassou aos moradores. Não está claro o que causou a lesão.
A guarita que foi colocada na praça, hoje utilizada por Mateus, pertencia a “Negão”, outro animal comunitário. O bicho morreu no mês passado. Paty Jacques, 46 anos, é uma das pessoas envolvidas na ajuda aos bichos de rua de Capão da Canoa.
- Eu cuido da formiguinha ao cavalo. É um trabalho árduo, as vezes é domingo e eu estou resgatando – afirma a voluntária.
Enquanto corria no gramado, a pequena Maria Luisa de Souza Peter, 6 anos, viu o cachorro manquitolando. Ela se aproximou, e após ver o machucado na pata, começou a chorar.
- Ele tá dodói - disse a menina.
Os voluntários explicaram a ela que o tratamento está evoluindo e que em breve o cão deixará de caminhar em tropeços. A garota, aos poucos, se recompôs e relembrou que tem, em casa, outro animal vítima de maus tratos.
- A gente retirou a Preta da rua. Era só para fazer o tratamento, mas no fim ficou conosco, porque nos apegamos – explicou a mãe de Maria Luisa, a bióloga Cíntia Souza, 36 anos.