* Por Irineu Guarnier Filho, apresentador do Canal Rural
O apresentador do Canal Rural Irineu Guarnier Filho considera-se um sortudo porque, em vez de encarar a aventura off road rumo ao Litoral Norte, banhava-se na água doce e tranquila da praia de Ipanema durante a infância vivida na década de 1960.
O guri da foto foi um sortudo. Mesmo vivendo longe do mar, podia banhar-se em águas tranquilas e limpas no verão, sem águas-vivas, repuxos ou Nordestão, pertinho de casa. Quem viveu em Porto Alegre até o início dos anos 1960 deve lembrar deste cenário: a "nossa" praia de Ipanema, na Zona Sul, repleta de famílias em suas areias, de pescadores e - acreditem - balneável.
Verdade que se levava mais tempo para ir, por exemplo, do Menino Deus para Ipanema ou à Tristeza nos Simca, Gordini e DKW da época. Mas, comparado com a aventura off road que era alcançar Tramandaí ou Capão da Canoa, via Santo Antônio da Patrulha, o trajeto até Ipanema era um passeio. A praia ficava no quintal de casa dos porto-alegrenses.
No caso de uma prima de minha mãe, a praia era - literalmente - o quintal de sua residência. Um daqueles casarões antigos da orla do Guaíba, com garagem para barcos no porão, que hoje viraram clubes e restaurantes. Tenho vagas lembranças daqueles verões de água doce.
Flashes, em que se misturam bordões de vendedores de Grapette, os olhos muito azuis de uma prima, e as vozes de pessoas queridas que perdi, como a de minha mãe, sempre atenta a qualquer perigo que colocasse em risco o seu menino. E também, como num filme em tecnicolor, a imagem de uma lancha de madeira americana dos anos 1950 singrando a água, com uma sósia de Marilyn Monroe, de maiô tomara-que-caia vermelho, recostada sobre a longa proa.
Mar, de verdade, só vim a conhecer adolescente. Minha família não tinha intimidade com o Litoral. Nosso veraneios eram numa fazenda de minha avó materna, montando cavalo em pelo e nadando em açude. Acho que por isso nunca gostei muito de praia. A combinação de calor, multidões, sal, sol e ondas definitivamente não me atrai. Me sentiria melhor entre ursos polares.
Já faz algum tempo que desisti de ir à praia. Hoje, quando porto-alegrenses levam até 12 horas para chegar a Florianópolis, pela BR-101, e a viagem a alguns balneários do Litoral Norte, pela Estrada do Mar, exaspera até um monge budista, acalento a ideia de que algum dia a orla do Guaíba volte a ser balneável. Talvez eu pudesse viajar no tempo e voltar à praia da minha infância.
Houve uma vez um verão
"A praia ficava no quintal de casa dos porto-alegrenses"
Apresentador do Canal Rural, Irineu Guarnier Filho lembra que só foi conhecer o mar na adolescência
GZH faz parte do The Trust Project
- Mais sobre: