O censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) trouxe novos conhecimentos sobre a população do Rio Grande do Sul. Enquanto Araricá, no Vale do Sinos, foi a cidade que mais cresceu em população entre os censos demográficos de 2010 e 2022, Uruguaiana, na Fronteira Oeste, foi uma das que mais encolheu: em 12 anos, o número de habitantes caiu 6,6% – de 125.435 moradores para 117.210.
O êxodo não é exclusivo do município: a Região Sul gaúcha e a Fronteira Oeste como um todo encolheram nos últimos 12 anos. Uruguaiana, aliás, já havia perdido população entre 2000 e 2010 (cerca de mil pessoas a menos entre os dois levantamentos).
Mesmo a criação do campus com cursos da área da saúde da Universidade Federal do Pampa (Unipampa) em Uruguaiana – incluindo Medicina, Farmácia, Enfermagem e Fisioterapia – não foi capaz de segurar a população.
O isolamento geográfico do município e a menor oferta de empregos explicam a saída de habitantes, diz o geógrafo e demógrafo Ricardo Dagnino, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). É necessário percorrer grandes distâncias até chegar a outras cidades grandes da região – cerca de 2h de carro até São Borja ou Alegrete, por exemplo.
— Se, por um lado, Araricá está entre Porto Alegre, Serra e Litoral, a cidade de Uruguaiana está isolada na Fronteira Oeste, que perde população há décadas. É uma região de agricultura de latifúndio, de pecuária e de mecanização que não demanda tanta mão de obra como o Vale do Sinos, onde há fábricas que demandam muitos trabalhadores. Se não tivesse a Unipampa, será que não seria pior [o êxodo]? O lugar oferece faculdade e atrai pessoas. Mas, depois da faculdade, o que a política pública oferece para permanecerem ali? Se não tiver emprego, a pessoa vai atrás em outro lugar — diz o demógrafo.
Presidente da Associação Comercial e Industrial de Uruguaiana, Luís Kesller reconhece que faltam empregos para jovens no município, mas diz que há potencial a ser explorado.
— Esse fenômeno [de perda populacional] é de toda a Metade Sul. O agro é forte aqui e não emprega muito com as novas tecnologias. Faltam incentivos para instalação de indústrias de maior valor agregado. Estamos trabalhando na duplicação da BR-290. Se finalizar, poderia favorecer a geração de empregos. Uruguaiana é uma das cidades com maior cruzamento de estrangeiros, o que poderia ser aproveitado para turismo e também feiras ou eventos culturais. Isso tudo gera emprego. Tem oportunidades, só não estamos ainda conseguindo acertar a mão.
A reportagem tentou entrevistar o prefeito de Uruguaiana, Ronnie Mello (PP), desde a terça-feira (18), mas ele não quis se manifestar. Em entrevista a GZH no início do mês, o prefeito discordou dos resultados do IBGE e afirmou que não houve redução tão grande da população. Ao mesmo tempo, reconheceu o fenômeno de migração em busca de melhores oportunidades de emprego em outras cidades.
— Pessoas saíram da região da fronteira para buscar oportunidades. Temos de fazer o dever de casa e corrigir, oferecer condições de inserção no mercado de trabalho. É o que estamos fazendo — diz Mello.
A redução de habitantes detectada pelo IBGE implicará menor repasse do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Por isso, a prefeitura informou que agentes comunitários estão compilando informações para checar as estatísticas do instituto.
Sobre suspeitas acerca da formulação do Censo, o IBGE emitiu nota na qual afirma que a pesquisa é "transparente" e que seguiu "rigorosamente recomendações, parâmetros e protocolos para censos de população, definidos pela Divisão de Estatística das Nações Unidas e de acordo com os Princípios Fundamentais das Estatísticas Oficiais".
O IBGE também acrescenta que introduziu inovações tecnológicas e que "do alto de sua reputação, está entregando à sociedade um Censo com qualidade e confiabilidade indiscutíveis. Sem dúvida, trata-se do Censo mais tecnológico e com maior monitoramento e análise em tempo real da história dos Censos, realizados há 150 anos no Brasil".