Uma confirmou no mês passado a decisão ancorada desde o final da adolescência. A outra completou oito décadas na função desejada ainda na infância. Em comum, escolheram o mesmo destino para a vida: servir a Deus e ao próximo como franciscanas. Juntas, e ao lado de mais de 300 irmãs de caminhada, Glenda Sabio Garcia, 32 anos, e Anna Íris Eich, 103 anos, celebrarão neste sábado os 150 anos da chegada ao Brasil das seis primeiras missionárias vindas da Alemanha.
Integrantes da Congregação Irmãs Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã, Glenda e Anna Íris demonstram em cada frase a paixão pela trilha escolhida, mesmo enfrentando resistência inicial de familiares e amigos. As histórias das duas lembram as de outras mulheres, como as missionárias pioneiras, que optaram pela vida religiosa consagrada. Conhecidas pela dedicação exclusiva ao trabalho voltado à saúde, à educação e ao social, as franciscanas estão presentes em diferentes partes do Rio Grande do Sul desde a chegada a São Leopoldo, em 1872.
Fundada em 1835, na Holanda, a congregação expandiu-se para a Alemanha. E foi lá que Madre Aloísia Lenders, superiora geral da época, recebeu uma carta do jesuíta e então pároco de São Leopoldo, Padre Guilherme Feldhaus, solicitando o envio de missionárias para a atual região do Vale do Sinos, onde havia centenas de imigrantes alemães. O objetivo era promover a educação das meninas da cidade.
Seis franciscanas foram escolhidas para a missão, mesmo sem falar português: madre Ana Moeller, irmã Teresia Cremer, irmã Maria Lichtenberg, irmã Florência Hemsel, irmã Alvina Ferbers e irmã Ludgera Hellwig. Na época, devido às dificuldades de uma viagem que exigiria atravessar o Atlântico, as jovens missionárias despediram-se das famílias e das comunidades na qual atuavam sabendo que nunca mais retornariam à Europa. Juntas, embarcaram num trem até Marselha, na França, de onde partiram para o Brasil a bordo de um navio a vapor.
As desbravadoras fizeram a primeira parada no Rio de Janeiro, então capital brasileira. Para seguir rumo ao Sul, trocaram de embarcação. No meio da viagem, porém, o leme do navio quebrou, deixando todos à deriva. Sem conseguir navegar, começaram a sentir a falta de água e mantimentos. Restava aos passageiros rogarem a Deus pelas próprias vidas. Conta a história que, diante de tal situação, as irmãs se reuniram para rezar ao lado de uma pequena imagem de São José, trazida por elas. No pedido ao Santo, ajuda para seguirem viagem, e a promessa de que colocariam o nome dele na primeira obra que fundassem no Brasil. Em 19 de março, dia de São José, uma embarcação vinda da Argentina encontrou o navio e o rebocou de volta ao Rio de Janeiro. Decididas a irem para o Sul, as seis franciscanas recomeçaram a viagem e acabaram desembarcando no porto de Rio Grande para, só então, rumarem a Porto Alegre e, na sequência, São Leopoldo.
Em 2 de abril de 1872, elas chegaram ao destino final, sendo acolhidas com uma festa preparada por católicos. Três dias depois, iniciaram as aulas com 23 alunas, sob a sombra de uma laranjeira, às margens do Rio dos Sinos. Mais adiante, conforme prometido, inauguraram o Colégio São José, até hoje tradicional em São Leopoldo.
Em 1874, um convite levou as franciscanas a inaugurarem uma comunidade em Santa Cruz do Sul, que dois anos depois fundou o primeiro noviciado com candidatas brasileiras à vida religiosa. Ao longo dos anos, as irmãs atuaram em Estrela, Porto Alegre, Rio Grande, Pelotas, Bagé, Bom Jesus, Tupandi, Santa Maria, entre outras cidades gaúchas. No final da década de 1970, as irmãs da Província do Sagrado Coração de Jesus de São Leopoldo levaram o trabalho missionário às regiões Nordeste e Norte do Brasil.
Marcadas pela alegria de viver e pela vontade de prestar auxílio àqueles em situação de vulnerabilidade social, as irmãs franciscanas deixaram inúmeras marcas em terras gaúchas ao longo dos anos. Um exemplo é o trabalho na Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre, onde atuaram de 1893 a 1992 nas áreas da enfermagem, cozinha, almoxarifado, farmácia, limpeza, entre outros serviços essenciais para o funcionamento da instituição.
Uma das obras sociais em funcionamento é o Centro Franciscano Pedro Chaves Barcellos, em Alvorada, onde há duas décadas existe uma comunidade religiosa. No local, mais de uma centena de crianças participam gratuitamente de diferentes oficinas no contraturno escolar.
As duas províncias brasileiras da congregação estão instaladas em solo gaúcho. A Sagrado Coração de Jesus tem sede em São Leopoldo e conta com representantes em sete cidades gaúchas e quatro Estados. Já a Imaculado Coração de Maria está localizada em Santa Maria e está presente em nove cidades do Rio Grande do Sul e seis Estados. Ao todo, 283 irmãs atuam no Estado. Outras 61 vivem em outras partes do Brasil.
Saiba mais
A programação festiva ocorrerá neste sábado (2) e será aberta ao público. Confira:
9h - Abertura às margens do Rio dos Sinos - Rua da Praia, 52, São Leopoldo.
- Do local, na sequência, partirá uma caminhada até a Igreja Nossa Senhora da Conceição, na Praça Tiradentes, 68.
- Da Praça, sairá uma carreata até o Colégio São José, onde será celebrada uma Missa Festiva.
11h - Celebração Eucarística, que será transmitida pelo Facebook (@Vocação Madre Madalena) e contará apenas com a presença de inscritos previamente.
De 2 de abril a 2 de maio
Ocorrerá a exposição "150 anos de presença das Irmãs Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã em São Leopoldo".
A mostra será realizada no Museu do Rio dos Sinos, em São Leopoldo, em parceria com a Secretaria de Cultura e Relações Internacionais e Secretaria do Meio Ambiente do Município. Os visitantes vão poder apreciar objetos e fotografias que contam a história das Irmãs Franciscanas na cidade e os trabalhos desenvolvidos.
O Museu do Rio dos Sinos é aberto à comunidade de terça à sexta-feira, das 8h45min às 11h45min, na Rua da Praia, 52, Bairro Rio dos Sinos.
Outras informações podem ser conferidas no site deuscuida.com ou na página Irmãs Franciscanas da Penitência e Caridade Cristã, no Facebook.
As etapas para se tornar uma irmã franciscana
1ª etapa - aspirantado, chamado também de juvenato.
É o primeiro momento onde a jovem conhece e convive com as irmãs, aprofunda sua vivência da fé e suas motivações vocacionais. Tem duração média de dois anos.
2ª etapa - postulado.
Quando a jovem aprofunda o autoconhecimento e as razões de sua escolha pela vida religiosa no seguimento a Jesus Cristo, conhece mais o carisma e a missão da Congregação. A duração é de dois anos.
3ª etapa - noviciado.
São dois anos em que a jovem começa a ser chamada de irmã e experimenta o estilo de vida da congregação, fortalece sua experiência de Deus – é um grande retiro, integra a vida da comunidade e participa da missão. Só depois deste período, a jovem emite os votos temporários como irmã.
4ª etapa
Quando a irmã tem a certeza de que deseja seguir neste caminho e emite os votos definitivos. Esta etapa pode levar alguns anos.