A demora para controlar as chamas durante o incêndio de um prédio comercial no centro de Rolante, no Vale do Paranhana, no final de 2000, acabou unindo os moradores para a criação de um corpo de bombeiros. Na época, a guarnição mais próxima ficava a 30 minutos da cidade. Por iniciativa da prefeitura, todos os brigadistas das indústrias locais foram convidados a formarem uma comissão de emergência, que se responsabilizaria (sem receber pagamento) pelo combate inicial dos sinistros até a chegada de uma equipe profissional. Foram cinco os primeiros voluntários. Quase duas décadas depois, o grupo se tornou uma das mais importantes instituições da região: a Sociedade Civil Corpo de Bombeiros Voluntários de Rolante.
Da motobomba, instalada provisoriamente em uma Kombi, até a atual frota de quatro caminhões (de combate a incêndio, salvamento e resgate veicular) e três ambulâncias (de suporte básico de vidas para os atendimentos de urgência e emergência) foram anos acumulando doações da comunidade e realizando parcerias com o poder público e a iniciativa privada.
Integrante da equipe fundadora, o industriário aposentado Carlos Alberto Ribeiro da Silva, 52 anos, atual presidente da instituição, recorda que a pequena equipe contava com uma caçamba de recolhimento de lixo, doada pela prefeitura e remodelada pelos voluntários, e uma sala ao lado do prédio do Executivo municipal. Os treinamentos foram realizados em corporações da região.
— Vem do fundo do coração poder prestar serviço para a nossa comunidade. É muito gratificante — diz Silva, que até hoje, mesmo não atuando mais na linha de frente, visita a entidade diariamente e ajuda, entre outras coisas, a preparar o almoço dos plantonistas.
Também da primeira turma de bombeiros, o educador físico Laudomir Rohr, 41 anos, que na época era brigadista em uma fábrica de calçados, lembra as peripécias enfrentadas nas ocorrências. Enquanto parte da equipe partia rumo às tarefas no único caminhão, o restante seguia de bicicleta.
— No início, não tínhamos ambulância e colocávamos o paciente numa maca em cima do caminhão até o hospital da cidade. Se estivesse frio ou chovendo, cobríamos a pessoa com as nossas próprias capas. Ganhamos um Opala, que virou nossa ambulância. Não era fácil — lembra Rohr.
Apesar de hoje contar com 45 voluntários, que se revezam principalmente nos turnos da noite e aos sábados e domingos, o Corpo de Bombeiros de Rolante obrigou-se a contratar funcionários para as ações durante os dias da semana, quando o número de voluntários se vê reduzido. Rohr foi um deles, há 12 anos, junto com outros 10 ex-voluntários. Ele se tornou motorista-socorrista. Quando não está no plantão de 24 horas nos bombeiros, utiliza as 72 horas de folga para trabalhar como professor de educação física em uma academia de Rolante.
A instituição pode ter o tamanho que a comunidade quiser, desde que todos façam a sua parte. Todos ajudando, certamente, as coisas se tornam muito mais fáceis.
LEANDRO GOTTSCHALK
COMANDANTE DO CORPO DE BOMBEIROS VOLUNTÁRIOS DE ROLANTE
Segundo o comandante da corporação, Leandro Gottschalk, cada voluntário tem a obrigação de atuar seis horas por semana, mas a maioria acaba participando mais horas do que o exigido, por iniciativa própria. É comum, aos domingos, famílias inteiras de voluntários trabalharem na corporação. No caso de um sinistro de grandes proporções, as empresas do município têm um acordo para liberarem quem faz parte da guarnição. Em minutos, a equipe pode ser ampliada, se for preciso.
Única unidade do Vale do Paranhana a contar com uma equipe de mergulhadores, Rolante atende, em média, a 10 ocorrências diárias, que vão da remoção de pacientes em ambulância até o próprio monitoramento da cidade, a partir de 16 câmeras instaladas nas salas de operações e interligadas com as sedes da Brigada Militar e da Polícia Civil. Inicialmente, o videomonitoramento era usado apenas em casos ligados à Defesa Civil, como enxurradas. Com o tempo, porém, o projeto foi ampliado para a área da segurança pública. Até o final deste ano, a partir de uma nova doação de equipamentos, outras quatro câmeras estarão em operação em diferentes pontos do município de 20 mil habitantes.
Entre os veículos utilizados atualmente pelos bombeiros de Rolante – incluindo um caminhão doado pelo governo japonês, que tomou conhecimento da iniciativa e realizou a doação – está aquele que o grupo chama de “troféu”, recebido no final do ano passado. É um dos maiores caminhões de bombeiros do Estado. Para ser construído e montado, teve a participação do Poder Judiciário, das empresas locais, da administração municipal e da Empresa Gaúcha de Rodovias (EGR). O veículo possui um guindaste de 20 toneladas, que chega a 21 metros de altura. Tem ainda garra florestal, para trabalhos emergenciais de podas, reservatório de água e equipamentos para estruturas colapsadas, para realização de qualquer tipo de resgate veicular e, ainda, todo o material de salvamento em altura e combate a incêndio.
Vindas principalmente dos empresários da região, as doações — em dinheiro, móveis, mão de obra e materiais de construção — também estão ajudando a erguer o novo prédio da corporação, orçado em R$ 2 milhões. Os próprios bombeiros, com a ajuda da comunidade, são os responsáveis por tirarem do papel a edificação de dois andares, prevista para ser inaugurada daqui a três meses. Nos fins de semana, mutirões são realizados na área doada pela prefeitura.
A construção, cujo projeto foi presenteado por um engenheiro e uma arquiteta rolantenses, é inspirada nas corporações europeias, e contará, inclusive, com sistema solar fotovoltaico. Conforme o comandante, o prédio foi planejado e executado a partir de três pilares: ser resistente a eventos naturais, ter autonomia de funcionamento e acessibilidade para todos os moradores.
Se, antigamente, o trabalho voluntário dos bombeiros era visto como amador, o comandante do grupo de Rolante faz questão de desfazer essa imagem:
— Graças à união da comunidade, nos tornamos uma instituição profissionalizada, com alto nível de envolvimento e engajamento de todos.
“Próximo passo é tirar carteira para dirigir caminhão”, diz costureira
Durante cinco anos, a costureira Rocheli Rodrigues, 25 anos, acompanhou a rotina dos bombeiros de Rolante nos atendimentos prestados a uma vizinha, que enfrentava um câncer. Aquela dedicação dos profissionais a cada nova ocorrência, revela a jovem, foi a inspiração para ela se inscrever no curso de bombeiro voluntário, no ano passado.
— Acompanhava eles transportando a minha vizinha e ainda salvando pessoas, casas e animais da cidade. Admirava muito aquele trabalho. Eu só pensava em como também podia fazer alguma coisa para ajudar o próximo — afirma.
Integrante da mais recente turma de ex-alunos da guarnição, Rocheli ingressou na equipe há seis meses. Às sextas-feiras, das 13h as 19h, ela troca a máquina de costura pelo uniforme de combate a incêndios. E garante amar o trabalho voluntário, apesar do frio na barriga quando o telefone toca na sala de operações.
— Além de poder ajudar as pessoas, adquiri um conhecimento que vou usar na minha vida. Meu próximo passo é tirar minha carteira para dirigir caminhão, pois quero ser motorista-socorrista nos bombeiros — projeta.