Para o psicólogo clínico e professor Leonardo Silva, pensar no motivo pelo qual as famílias se encontram no Natal e evitar assuntos que possam causar alguma discórdia são bons caminhos para passar as comemorações sem conflitos. Leia a entrevista:
Que recomendações você daria para as famílias que estão divididas e que, neste Natal, vão se encontrar pela primeira vez depois do conflito eleitoral?
A primeira coisa é as famílias pensarem no que as une. Não só o motivo pelo qual estão ali, mas os valores que unem a família, porque isso é comum a todos. Devem se conscientizar que neste momento existe algo maior que as une, independentemente da opinião, da ideologia de cada um e do que aconteceu.
A que tipo de valores você se refere?
Ao amor, aos laços familiares. No Natal, é justamente isso que se está fomentando.
Em muitos casos, a cisão ocorreu porque as pessoas sentiram que não compartilhavam os mesmos valores do que membros da família.
Sim. Mas que valores são esses? Valores ideológicos, não é? O que me une à minha mãe? Sou seu filho, a gente tem família, a gente tem várias pessoas em comum. É nesse sentido que as famílias têm de pensar. Afinal de contas, por que elas estão se encontrando no Natal, se não é para celebrar as questões familiares? Esse seria o primeiro ponto: pensar no motivo pelo qual estamos nos encontrando. Depois, o que pode acontecer, e que eu acho bem interessante, é as pessoas fazerem um contrato de não falarem sobre motivos que possam gerar alguma discórdia. Combinar de deixar a questão política e ideológica de lado e celebrar as coisas que unem. Fazer como se fosse um contrato para não discutir temáticas sensíveis no Natal.
Se tocar no assunto, pode degringolar?
Exatamente. E como o assunto está bem fresco ainda, muito recente, e as famílias não tiveram tempo de elaborar isso, o Natal pode ser um momento bastante perigoso. Muitas famílias estão se encontrando pela primeira vez depois dos conflitos. Será que esse vai ser o momento para discutir isso?
Mas também, se não tocarem no assunto, significa que o Natal não vai ser a ocasião em que vão se reconciliar?
Aí entra a escuta empática, que seria a outra opção. Ou tu optas por não falar sobre o assunto, que é, por exemplo, o que a minha família está fazendo, está fazendo um contrato pelo WhatsApp para não falar nesses assuntos, ou cada um se responsabiliza por fazer uma escuta mais empática, que é entender a realidade do outro, e não ficar lutando para impor a sua ideologia.
Essa escuta empática é fácil de fazer?
Não é nada fácil. Por isso acho melhor as pessoas fazerem um contrato de não conversar sobre isso. Envolve muitas emoções. Porque na verdade as ideologias têm a ver com caráter. Se tu acreditas em tal visão do ser humano e o teu parente não acredita, é uma decepção muito grande, porque é uma falha de caráter. Mexe muito profundamente no ser e isso traz muitas emoções.
Não se encontrar é uma opção?
É uma opção muito clara. Se a família chega à decisão de não se encontrar, ok. É válido. Porque pode ser melhor neste momento não se encontrar. Mas acredito que tem outras soluções.
No Natal, pode-se lembrar de momentos do passado em que as pessoas não estavam divididas. Esse ambiente colabora para começar a curar as feridas?
Sim, mas desde que essa história do que une as famílias esteja presente. As memórias do passado, por exemplo, são uma das coisas que unem a família. As pessoas têm de estar ali para trabalhar o que é comum, e não a diferença. Que é o que acontece na linguagem empática também: achar o que é comum com o outro para ter um mínimo de diálogo. A ideia da empatia é fazer a escolha de acompanhar a realidade do outro de acordo com a perspectiva do outro.