O papa Francisco comparou nesta quarta-feira (10) o aborto a recorrer a um "matador de aluguel", na homilia pronunciada durante sua tradicional audiência na Praça de São Pedro, Vaticano.
— Interromper uma gravidez é como eliminar alguém. É justo eliminar uma vida humana para resolver um problema? — questionou o pontífice aos fiéis reunidos no Vaticano. — É justo contratar um matador de aluguel para resolver um problema? — prosseguiu, saindo do texto que havia preparado, e utilizando a expressão matador de aluguel, segundo a versão oficial da imprensa do Vaticano.
O papa criticou em sua homilia "a perda de valor da vida humana" em consequência das guerras, da exploração do homem e da cultura da exclusão. Ele adicionou a essa lista o fim da vida no ventre materno "em nome da salvaguarda de outros direitos".
— Mas como um ato que suprime a vida inocente pode ser terapêutico, civil ou simplesmente humano? — perguntou o pontífice argentino.
Não é a primeira vez que o papa argentino ataca o aborto, incluindo o terapêutico. Em junho, ele comparou o aborto às práticas utilizadas pelos nazistas: interromper a gravidez é "o mesmo que fizeram os nazistas, mas com luvas brancas", disse ele em pleno debate na Argentina de um projeto de lei sobre a legalização do aborto.
Considerado um dos pontífices mais sensíveis e abertos a questões sociais, como a homossexualidade e o divórcio, temas sobre as quais demonstrou a sua vontade de debater, mantém uma posição firme e fechada sobre o aborto.
— Toda violência e danos contra a vida vêm do medo (...) Uma criança doente, como qualquer pessoa em necessidade e vulnerável, mais do que um problema é um dom de Deus, que pode nos tirar do egoísmo e fazer-nos crescer no amor — explicou.
Falando das razões pelas quais o homem "rejeita vida", o pontífice argumentou que é porque têm ídolos como "dinheiro, poder e sucesso", que considera "parâmetros errados para valorizar a vida".
— Não é progressista resolver problemas eliminando uma vida humana — escreveu Francisco na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, a primeira de seu pontificado, no qual ele alertou que a Igreja não mudará sua posição sobre o aborto.
A forte posição do papa coincide com a celebração no Vaticano do Sínodo dos Bispos de todo o mundo dedicado aos problemas dos jovens.
Segundo a Anistia Internacional (AI), nos últimos 60 anos, mais de 30 países modificaram sua legislação para permitir maior acesso ao aborto e pôr fim aos clandestinos, que matam centenas de mulheres. No entanto, na América Latina, o continente mais católico, o debate sobre a descriminalização ou a legalização segue em aberto.
A questão reverberou entre os milhares de salvadorenhos que chegam a Roma para a canonização do monsenhor Óscar Romero no domingo, já que em El Salvador suas leis estão entre as mais severas da região e punem as mulheres que interrompem a gravidez.
As palavras do papa também geraram a reação imediata do médico ginecologista italiano Silvio Viale, do Partido Radical, entre os promotores há mais de 40 anos da legalização do aborto na Itália.
— Eu sou médico, e não um matador de aluguel — disse ele, lembrando que em 99,9% dos casos em que uma malformação fetal é diagnosticada, um aborto é decidido: — Eu respeito essa decisão e garanto esse direito — acrescentou.