O conteúdo de posts supostamente publicados no Facebook por uma professora da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) foi parar na ouvidoria da instituição. Pelo menos dois alunos consideraram o teor das mensagens violento, com incitação ao ódio e intolerantes. Eles recorreram ao canal oficial da universidade para que, frente à atitude creditada à professora Rejane Jardim, que atua no Instituto de Ciências Humanas, a UFPel tome providências.
Entre as frases que teriam sido escritas pela docente em seu perfil pessoal na rede, estão "...fascistas tem de morrer um a um..." e "To de saco cheio de pacifismo e bom comportamento...morte aos fascistas". Uma das denúncias foi feita em 6 de abril, e a outra, na última quinta-feira (12), segundo a assessoria de imprensa da universidade.
Os alunos também relatam que teriam sido hostilizados em sala de aula em razão de discordâncias em posicionamentos políticos. Os estudantes pediram para não ser identificados porque temem represálias. Um deles está na fase final de um concurso público e acredita que se expor poderia acarretar prejuízos na seleção.
— É uma professora ótima quando se fala em conteúdo, mas quando chega em opiniões políticas, é assustadora. É esse comportamento que se repudia. Não condiz com a conduta de um professor de uma universidade federal — disse um deles.
Nesta sexta-feira (13), o post que teria motivado a polêmica não estava no perfil de Rejane. No entanto, em outra mensagem, publicada pouco depois das 15h de 7 de abril, a professora pede que os amigos não estranhem seu desaparecimento da rede social e diz: "Pode ser que fique sem face...alguém está me importunando. se eu ficar sem face. ficarei sem face. será um favor".
A Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas (Adufpel) informou que está acompanhando o caso para que a professora não tenha direitos violados em razão de manifestações de opiniões em seu perfil pessoal. A presidente da entidade, Fabiane Tejada, ressaltou que o conteúdo do post será analisado, assim como a autoria da mensagem para que se verifique a autenticidade, e adiantou que a entidade já havia identificado perseguição política à professora na internet.
— É uma professora com um histórico de contribuições para a livre expressão e na defesa do diálogo. Não permitiremos que seja moralmente agredida — disse Fabiane.
Em nota, a reitoria da UFPel informou que "toda conduta que, no âmbito da Universidade, porventura viole o pleno exercício das liberdades de expressão e de cátedra ou restrinja o direito ao livre pensar, será apurada de forma serena e responsável pelos órgãos competentes da Universidade Federal de Pelotas, que não se deixarão pautar por pressões políticas de quem quer que seja".
O documento encaminhado pela instituição ressaltou ainda que "a liberdade de expressão é um direito fundamental, garantido pela Constituição Federal, sendo um dos pilares das sociedades democráticas. No âmbito universitário, a liberdade de cátedra é imprescindível para que a Universidade cumpra seu papel social, desde que respeitada a pluralidade de ideias. Portanto, a discussão de temas sensíveis, especialmente àqueles referentes à dinâmica política da nação, é não somente permitida, mas também desejável". A assessoria de comunicação da UFPel explicou que, por enquanto, essa é a manifestação oficial sobre o caso e não confirmou se haverá a abertura de processo administrativo para investigar a conduta da professora.
No Facebook, colegas de Rejane, alunos e amigos têm postado mensagens em solidariedade à docente, que, por meio da assessoria de imprensa da Adufpel, informou que não se manifestaria sobre a questão.
O Ministério Público Federal em Pelotas recebeu notícia sobre "comportamento inadequado de professora da Faculdade de História da Universidade Federal de Pelotas" e informou que, preliminarmente, determinou nesta sexta-feira (13) que fossem enviados ofícios ao Instituto de Ciências Humanas e à Reitoria da UFPel para que "se manifestem sobre o mencionado comportamento". Somente depois disso, o MPF pretende analisar melhor os fatos.
Atitude seria reação à ataques nas redes
Professora do Centro de Letras e Comunicação da UFPel, a analista de discurso Janaina Cardoso Brum não entende a manifestação de Rejane como uma ameaça, mas como uma reação à altura dos ataques que estaria sofrendo.
— O texto da Rejane trabalha com subentendidos. Quem a conhece, sabe que é uma pacifista, mas, veja bem, ela, assim como outros militantes, vem sofrendo ataques de todos os tipos, seja por sua condição de militante e estudiosa do feminismo, seja por suas posições marcadamente de esquerda. É natural que exponha em sua página pessoal sua indignação. Não é do nada que a professora se manifesta, pelo contrário, é depois de muito aguentar xingamentos sem lógica, puramente agressivos, especialmente nas redes sociais.
Janaina também acredita que o episódio sirva para uma reflexão a respeito de comportamentos extremados e a adesão a ideias que se ajustam ao emprego de violência e intolerância:
— O que mais me assusta nessa história toda é que as pessoas tomam para si o adjetivo "fascista", nós sabemos o que é o fascismo, o fascismo é perigoso, o fascismo se pauta inclusive por critérios de raça, tal qual o nazismo. Como responder ao fascismo senão usando seus próprios argumentos? É o fascismo que mata. Eu, como a Rejane, sinto-me acuada frente à reaparição de ideias fascistas e penso que uma estratégia interessante, embora polêmica para confrontar argumentos violentos é usando retoricamente, e apenas retoricamente, a violência.