Ainda digerindo a descoberta de que seu filho mais velho é uma das vítimas do jogo suicida Baleia Azul, uma moradora de Farroupilha, cuja identidade será preservada, tenta entender onde pode ter falhado. Além do comportamento do menino ser considerado "exemplar", com boas notas e trato carinhoso com a família, dialogar sobre todas as dúvidas e tristezas da adolescência é acordo entre mãe e filho.
Na semana passada, ao ser comunicada pela escola sobre a possibilidade do menino estar envolvido no jogo, a mãe buscou ajuda no Conselho Tutelar e na polícia. Só acreditou na história quando a escutou contada pelo filho. A mulher recebeu o Pioneiro na terça-feira para conversar sobre a experiência e difundir o alerta à comunidade: a mudança dos adolescentes com o jogo é rápida e pode passar despercebida até pelos pais mais atentos.
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– Se eu ajudar uma mãe ou um pai contando meu relato, já fico feliz – define ela.
O menino de 14 anos chegou somente até o quinto dos 50 desafios perversos indicados pelo jogo. No entanto, já anunciava a vontade de tirar a própria vida e apareceu com ferimentos.
O comportamento
Mãe e filho têm uma relação bastante próxima e aberta. Segundo a mãe, o jovem passava o dia envolvido com estudos e tarefas domésticas que ocupavam boa parte do tempo. Por isso, celular e computador eram compartilhados com a mãe, que tinha acesso à senha dos dispositivos e havia inclusive conversado sobre a Baleia Azul nos últimos dias.
– Não foi falta de diálogo. Acredito que seja aquela questão da própria adolescência, da curiosidade e do desafio, além da tendência à depressão. O seriado da Netflix (13 Reasons Why) também influenciou. Ele me ajuda muito em casa, trabalha às vezes com o avô, nunca teve problemas e jamais foi um guri largado – defende a mãe.
O comportamento do menino mudou em menos de três dias, em um dos feriadões de abril. Por estar recluso em função de uma virose, ele acabou ficando mais tempo no quarto e passou a ser raivoso.
– Não é algo que mude o comportamento em uma semana ou duas. São poucos dias – diz a mulher.
O jogo
O menino aceitou um convite de amizade no Facebook de alguém que não conhecia. Logo foi adicionado por este novo "amigo" a uma página privada na rede social, onde recebia as ordens e ameaças. O jogo consiste em 50 tarefas macabras que só são enviadas ao participante após a anterior ter sido cumprida.
Por isso, caso desista, não é possível saber o próximo passo. O jovem seguiu somente até a 5ª tarefa em menos de dois dias. Todo processo precisa ser cumprido em até 49 dias, e o último desafio consiste em tirar a própria vida.
– No primeiro desafio a pessoa já fica depressiva. O curador certamente é uma pessoa adulta, que sabe entrar no psicológico do jovem. Se adultos caem em golpes, imagine os adolescentes – descreve a mãe.
O jovem chegou a postar uma foto de uma baleia azul nas redes sociais, cumprindo uma das provas, além de ferir-se nos braços. À mãe, ele teria dito que o machucado foi causado por um raspão em um muro.
– Ele me dizia que a postagem era brincadeira. Eu penso 'graças a Deus ele não teve coragem'. Que noção uma criança tem se é para cortar profundo ou não? Eles treinam a criança para um desafio – explica ela.
A escola
A descoberta do envolvimento do menino com o jogo partiu dos colegas de aula. A postagem da baleia azul no Facebook e mensagens em tom de despedida no WhattsApp, com comentários de quem iria partir em breve, levou a turma a procurar a direção.
– Mais dois dias, talvez, fosse tempo demais. A escola foi fundamental. Todos os pais, 90% deles, trabalha fora e não acompanham toda a rotina, por isso o papel da escola foi decisivo. Talvez não desse tempo para recuperar – lamenta a mãe.
O menino ficou três dias afastado do convívio escolar, e o retorno transcorreu sem constrangimentos, afirma a diretora. O assunto não é abordado em sala de aula, mas é respondido quando surge no formato de perguntas dos alunos. O ideal é que o jogo não se torne algo curioso e digno de admiração, sugere a diretora.
A ajuda especializada
Além do papel decisivo da escola, o Conselho Tutelar e a Delegacia de Polícia foram redutos de ajuda para a mãe. Ela e o filho foram ouvidos pela polícia ontem, e outros possíveis envolvidos com a ocorrência prestarão depoimento nos próximos dias. Por meio dos conselheiros tutelares, o jovem terá atendimento com psicólogo. Apenas uma avó sabe da ocorrência, já que nem todos podem entender o que de fato aconteceu, diz a mãe.
– É muito difícil estar na adolescência, mas para tudo na vida tem solução. Ao destruírem a vida deles, eles destroem muitas outras vidas. Não é preciso ter vergonha e busquem ajuda – aconselha a mulher.