Os 10 mortos e os 15 feridos no incêndio na Pousada Garoa, em Porto Alegre, acionaram, novamente, um conhecido mecanismo de reação imediata: buscar culpados. Eles existem e devem ser apontados, sem dúvidas. Porém, antes que as enchentes e o próximo escândalo apaguem o calor desse assunto, nos cabe aprofundar outros aspectos dessa tragédia inaceitável, porque era fácil evitá-la. Bastaria que cada um fizesse a sua parte.
Como princípio teórico e filosófico, acredito que a fiscalização nada mais é do que um mal necessário. No fundo, quando clamamos pela intervenção do poder público em algo que não precisaria dele, estamos confessando a nossa própria incompetência. Mais do que culpa, devemos analisar a dinâmica. Vejo um excesso de peso no tema “fiscalização”, como se ela fosse imprescindível para que cada indivíduo, seja ele o dono da pousada ou um agente público, agisse da forma correta, que é definida, primeiro, por valores morais e éticos e, depois, pelas leis.
A fiscalização é o nosso bode expiatório. O motorista trafegava a 160 km/h e causou um acidente. A obra desmoronou porque foi mal construída. Não havia extintor e pegou fogo. Uma senhora de 90 anos caiu em uma calçada mal conservada e se machucou. O que pedimos? Fiscalização, fiscalização, fiscalização, fiscalização. Quem acredita na capacidade e na responsabilidade do indivíduo, deveria apontar o dedo para outro lado.
Não quero aqui parecer romântico e utópico. A certeza de punição diante do erro grave é parte fundamental do processo educativo. Nós, humanos, precisamos disso. É claro que, pela natureza do serviço prestado e pelo uso de recursos públicos, a prefeitura precisa dar explicações, e muitas. Meu questionamento, porém, é sobre a quantidade de cada ingrediente, e não sobre a receita. Se não nos questionarmos sobre isso, em breve estaremos aplaudindo um Estado cada vez mais invasivo, controlador e onipresente. Não é essa a função desse ente necessário, que nos representa, mas não deve nos oprimir.
Quando pedimos mais e mais fiscalização, estamos avisando que somos incapazes de nos organizar, de nos respeitar e de conviver. Nesse momento, para mim, existe uma pergunta fundamental, baseada nas informações disponíveis: por que o dono da pousada, que deveria conhecer a realidade e os riscos como ninguém, não fez o que deveria ser feito para evitar a tragédia? Alegar a certeza de que a fiscalização era deficiente é a parte menos importante da resposta.