Deixe-me ver se entendi bem: uma ditadura fundamentalista despeja 300 mísseis e drones sobre um país democrático, do tamanho de Sergipe, e, para muitos analistas e militantes ideológicos, isso é apenas “um gesto”, sem a intenção de machucar ninguém ou de iniciar uma escalada de violência. Além do mais, dizem eles, os mísseis não eram de última geração e os representantes dos aiatolás até avisaram antes.
Jamais defendi a guerra e sofro pelos palestinos e pelos israelenses atingidos pelo conflito
Não demora, algum gênio da geopolítica defenderá a necessidade de Israel se desculpar com o Irã por ter sido atacado e, graças à sua capacidade tecnológica e às suas parcerias geopolíticas, ter conseguido se defender. Não me surpreenderia se algum dos radicais que hoje comandam o Itamaraty elogiasse o “carinho” do Irã em Israel.
Vamos aos fatos: um único míssil oco disparado por uma ditadura sanguinária contra qualquer país democrático seria um motivo mais do que justificável para uma reação e para uma condenação internacional. Muitos condenaram. O governo brasileiro, não. Dias depois, diante do espanto planetário com sua posição omissa, tentou emendar, mas de forma genérica e sem muita convicção.
Não importa se as armas foram disparadas de ré ou se eram enferrujadas. O Irã lançou 300 artefatos contra cidades densamente povoadas. Se isso não é um ato de agressão descomunal, talvez os fanáticos precisem jogar uma bomba atômica sobre Tel Aviv para serem, de fato, compreendidos. Aliás, penso que esse é o seu objetivo. Só precisam de um pouco mais de tempo para dar o salto definitivo no seu programa nuclear. O pretexto para a agressão iraniana foi a eliminação de líderes terroristas em um prédio anexo à sua embaixada na Síria. Consta que pelo menos dois deles tiveram participação direta no planejamento dos atentados de 7 de outubro, quando o Hamas assassinou 1,2 mil pessoas em Israel e sequestrou mais de 200, das quais 130 permanecem em cativeiros na Faixa de Gaza.
Tenho recebido pelas redes sociais manifestações de iranianos exilados ou expulsos de seu país. “Somos o Irã, não a República Islâmica” é um lema que começa a ganhar força entre os que já compreenderam que o regime de Teerã não é uma ameaça apenas para Israel, mas sim para o futuro da humanidade. E eles não são poucos.
Jamais defendi a guerra e sofro pelos palestinos e pelos israelenses atingidos pelo conflito. Deveríamos fazer mais por eles. Mas, se o Irã não for devolvido aos iranianos que pedem paz, liberdade e democracia, a conta será muito alta no futuro. Torço para que a conversa civilizada e a diplomacia consigam resolver, antes que seja tarde.