Tudo indica que o Supremo Tribunal Federal irá decidir que a posse de maconha para consumo próprio deixará de ser um crime no Brasil. Não tenho certeza se gosto ou não dessa ideia. Peço desculpas a todos aqueles que esperam convicções absolutas de um colunista. Dessa vez, não as tenho. “Sou pago para dar opiniões”, eu mesmo disse tantas vezes. Como afirmou Mario Quintana, “contradizer-se é chegar sozinho ao outro lado da verdade”. Adoro essa frase. Com a licença do poeta, meu convite hoje é para um passeio pela minha plantação de dúvidas. Essas sim fazem a minha cabeça.
Por um lado, entendo que a liberdade do indivíduo é um bem inegociável. Então, se alguém quer fumar maconha, que o faça e arque com as eventuais consequências, as boas e as ruins. Só que, entre o ideal e a prática, existe uma longa distância. Assim como as ações econômicas ligadas ao meio ambiente, a liberdade precisa ser sustentável. De nada adianta a sensação de exercê-la hoje se os atos em questão comprometem o amanhã. O valor do indivíduo é tão grande que me pergunto se a lei pode autorizar alguém a fazer mal a si mesmo. Até porque, de fato, cada indivíduo depende de outros, na família, no trabalho e em todos os lugares. Alerta de clichê: ninguém é uma ilha.
Há também o argumento de que a legalização das drogas enfraqueceria o tráfico, transferindo para o governo recursos gigantescos que hoje transitam na ilegalidade. Ninguém me convence de que a decisão de considerar o porte de maconha como “não crime” é um passo para a efetiva legalização. De fato, os traficantes, se não tiverem mais a maconha, traficarão outra coisa. Não viaje: descriminalizar a maconha não tem o poder de ressocializar bandidos.
Também penso que drogas tão ou mais perigosas que a maconha são legais, socialmente aceitas e valorizadas. O álcool, por exemplo, é componente fundamental das equações que levam a acidentes de trânsito, violência doméstica e tantas doenças fatais. Vale o mesmo para o tabaco, no que se refere às enfermidades.
Se eu fosse ministro do STF e tivesse que votar, estaria envolto em um enorme conflito de consciência. Porque, no caso, eu teria que decidir, sem enrolar, se o errado é o certo. E, às vezes, é.