Então, a Maya parou de comer. Foi depois da febre, provavelmente causada pela covid-19, porque a Jaque e eu nos testamos e deu positivo. Foi bem menos desagradável do que da primeira vez. Estamos todos bem, já passou. Mas, mesmo com a temperatura normalizada, a Maya se recusava a aceitar sua colherinha com os alimentos pré-picados. Ela empurrava, cuspia, rejeitava de todas as formas possíveis.
Foram dias de apreensão, apesar das orientações tranquilizadoras da pediatra. É normal, vai passar. E passou.
Maya tem um ano, dois meses e dois dentes. Seu apetite voltou quando, finalmente, entendemos o que ela queria. Comer sozinha, sentada com a família durante as refeições. Apesar de todos os sinais, insistíamos na fórmula que vinha dando certo. Comida especial, de um jeito especial, em uma hora especial.
O primeiro aviso de que o método não funcionava mais veio quando a Maya pegou uma ameixa inteira que eu acabara de descascar. Passou a devorá-la, segurando-a com suas mãozinhas. Eu só cuidando o caroço. Mesmo assim, resistimos. Colherinha na boca e comida esmagada: forçávamos, achando que estávamos fazendo o certo. E nossa filha nos dizendo: eu quero crescer.
Agora, a Maya come com as suas mãos, do jeito que consegue. É uma festa. Ou o caos, dependendo do jeito que a gente olha. Uma parte cai no babeiro, outra vai para o chão, outra é engolida. Ela coloca o alimento na boca e nos olha, orgulhosa e feliz. Viram? Eu sei, eu consigo.
Esse é um dos baratos de ter filhos. A gente esquece de tudo entre um e outro. Virei pai, de novo, depois de 15 anos. Ainda é difícil – como é difícil – entender algo tão simples e natural. Nossos filhos nos pedem, o tempo todo, para crescer. É arriscado, é perigoso. Queremos protegê-los. A Maya pode se engasgar. O chão fica sujo. É preciso ensiná-la a não jogar a comida longe. Depois de cada refeição, dá um baita trabalho limpar o entorno. Tudo isso quando a colherinha funcionava tão bem. Tudo isso quando havíamos conseguido a sonhada e ilusória estabilidade. De fato, a única constante do universo, como conseguimos percebê-lo, é a inconstância. Tudo muda, o tempo todo. Nossos filhos nos ensinam que, quando finalmente encontramos a resposta, a pergunta muda. E assim vai ser para sempre. Aliás, quem me ensinou essa ideia tão poderosa e bela foi meu pai.